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Poder relacional é a nova moeda do trabalho híbrido

No novo mundo do trabalho, os gestores não podem confiar apenas nas estruturas de poder hierárquicas

Lebene Soga, Yemisi Bolade-Ogunfodun, Nazrul Islam e Joseph Amankwah-Amoah

25 de Junho

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Artigo Poder relacional é a nova moeda do trabalho híbrido

Tradicionalmente, as hierarquias ajudaram a formalizar as estruturas de poder intrínsecas aos diferentes papéis de uma organização. No contexto virtual, a estrutura hierárquica formal com frequência é menos visível do que nos ambientes presenciais. Na falta de marcadores físicos de escalões e hierarquia, tais como localização das mesas e salas, vagas de estacionamento, placas nas mesas, crachás e assim por diante, os gestores precisam se valer de outras referências de poder para continuar a influenciar e gerir funcionários em ambientes mediados pela tecnologia.

Apesar de estudos terem examinado práticas de trabalho virtuais por meio de aplicativos de vídeo como Zoom e Microsoft Teams, menos atenção tem sido dada a plataformas baseadas em texto como Slack, Huddle, Ryver e Flock, entre outras. Análises preditivas indicam que o mercado para essas plataformas de colaboração chegará a US$ 50,7 bilhões em 2025. Em consequência, espera-se que as interações gestor-colaborador nessas plataformas se tornem ainda mais prevalentes.

Realizamos um estudo conceitual para estabelecer a natureza dos relacionamentos em equipe no ambiente virtual. Para embasar empiricamente nossos achados sobre como as relações gestor-colaborador são sustentadas, analisamos entrevistas com 64 gestores, assim como as interações de quase 1,2 mil membros das empresas multinacionais da Fortune 500 na plataforma Google+ for Business.

Descobrimos que as necessidades relacionais desempenham um papel-chave na sustentação dos relacionamentos gestor-colaborador em ambientes virtuais. O termo necessidades relacionais se refere aos drivers de mudança social entre gestores e colaboradores. Esses drivers podem incluir informações, recursos para tarefas específicas, reconhecimento, liderança e muitos outros fatores. Atender a essas necessidades entre gestores e funcionários não depende necessariamente do poder hierárquico. Nossa pesquisa revelou que, para ter sucesso no novo mundo do trabalho, os gestores não podem depender apenas da posição hierárquica como base para exercer a liderança. Eles também devem reconhecer o papel do poder relacional no trabalho híbrido.

Mas, afinal, o que é poder relacional?

O poder relacional deriva da capacidade de um indivíduo exercer influência sobre os outros sem necessariamente ocupar um papel hierárquico formal. Por exemplo, um executivo de vendas júnior com poder relacional poderia influenciar com sucesso colegas seniores em vários departamentos a se voluntariarem para participar do grupo diretivo de uma nova iniciativa, mesmo que isso exigisse tempo e recursos adicionais para os colegas. Da mesma forma, em um ambiente de equipe, um indivíduo que não é o líder pode motivar com sucesso outros integrantes a exceder uma meta de receita. Também é possível usar o poder relacional para estimular ou coibir comportamentos negativos.

O poder relacional difere do poder hierárquico, que se baseia na posição formal que um gestor ocupa e na autoridade implícita a essa posição. Em um contexto virtual, o poder relacional é ainda mais importante para a construção da coesão nas equipes de trabalho. Em nosso estudo, observamos que as condições para o exercício do poder relacional são criadas quando dois fatores se alinham: a fluência tecnológica do indivíduo e sua aptidão social no ambiente tecnológico.

Fluência em tecnologia. Alguns indivíduos não estão necessariamente em uma posição hierarquicamente sênior, mas têm experiência em navegar nas plataformas de mensagens baseadas em texto. Esses indivíduos geralmente estão cientes do que a tecnologia permite ou restringe e podem aproveitar seu próprio conhecimento dos recursos e limitações para introduzir melhorias de produtividade.

Várias plataformas para interações online, como Slack, Google+ e Huddle, têm recursos “ocultos” que podem ser explorados se soubermos aproveitá-los. Por exemplo, poder compartilhar vários arquivos ou conectar aplicativos úteis de terceiros pode exigir um pouco mais de conhecimento tecnológico do que apenas apertar o botão Compartilhar. Da mesma forma, se uma tecnologia recém-implantada não estiver bem integrada ao software legado, um indivíduo experiente pode tomar medidas para contornar os desafios e compartilhar essas informações com colegas, construindo assim poder relacional.

Aptidão social em um ambiente tecnológico. O segundo fator leva em consideração as habilidades sociais do indivíduo dentro de um ambiente tecnológico. Para alguns colaboradores, a comunicação em plataformas de tecnologia vem naturalmente em virtude de sua familiaridade com mensagens online. Eles entendem como criar uma extensão de si mesmos nesse formato e estão cientes de que ser capaz de influenciar os outros com sucesso requer uma comunicação calorosa. Simplificando, eles desenvolveram habilidades para enviar “good vibes” nessas plataformas sem desrespeitar a etiqueta virtual. Os funcionários sem essas habilidades precisam de um esforço extra para alcançar resultados semelhantes.

Muitas vezes, o poder e a influência relacionais agem de maneiras interessantes quando se trata de plataformas de colaboração. À primeira vista, pode-se não pensar muito no uso de emojis ou GIFs em uma plataforma de bate-papo baseada em texto, mas este é um excelente exemplo de influência relacional em ação. Por exemplo, estudos mostram que emojis, GIFs e outros símbolos visuais podem ter funções pragmáticas na comunicação ou na ênfase de uma mensagem. Nesse caso, os indivíduos usam funções de tecnologia para se conectar com as emoções dos outros e afirmar sua personalidade dentro da estrutura social da equipe. Descobrimos que indivíduos que são capazes de exercer poder relacional e promover seus interesses entendem o significado do texto como uma extensão de si mesmos em plataformas tecnológicas. Também descobrimos que esses indivíduos tendem a adquirir capital social na rede e por isso seus colegas os procuram para liderança.

Implicações práticas

Você pode ampliar sua própria efetividade assim como a de seus funcionários em um ambiente virtual ao tomar as medidas a seguir para cultivar a influência para além dos papéis hierárquicos.

  1. Desenvolva seu poder relacional. O campo de atuação mudou à medida que muitas empresas passaram para modelos de trabalho híbridos. Para gestores que trabalham em ambientes virtuais com seus funcionários, é importante reconhecer que a posição hierárquica tradicional vai até certo ponto. Pesquisas que incentivam os gestores a tornar suas equipes menos hierárquicas para serem mais ágeis também se aplicam ao mundo do trabalho híbrido. Empresas e equipes podem considerar a adoção de estruturas organizacionais mais horizontais, que podem ajudar a reduzir a distância gerencial, principalmente em um ambiente virtual. O desenvolvimento do poder relacional no domínio virtual pode muitas vezes envolver a requalificação dos gerentes para ampliar sua influência. Isso pode variar desde o uso de símbolos visuais na comunicação textual até o compartilhamento de informações mais informais com sua equipe em plataformas de tecnologia. Aqui, não se trata apenas de ser informal; a chave é ter sensibilidade contextual e estar ciente dos significados que normalmente são atribuídos a esses símbolos.
  2. Identifique e reconheça o potencial de seus funcionários. Os gestores devem reconhecer os esforços dos funcionários que podem ter um poder relacional importante dentro da organização e atribuir mais responsabilidades a eles. A pesquisa indica como o reconhecimento formal dos funcionários dessa maneira pode ser um forte motivador, aumentando a moral e o desempenho. Também sinaliza para a equipe que a organização está comprometida com o crescimento dos colaboradores, independentemente da função principal de cada um. Além disso, significa que a plataforma tecnológica vai além de ser apenas uma mediadora das interações gestor-funcionário. Ela abre espaço para os gestores perceberem outras dimensões do desempenho do funcionário fora dos KPIs estabelecidos. Como a pesquisa sugere, as práticas relacionais podem se tornar indicadores para identificar o potencial de liderança de colaboradores.
  3. Alinhe os investimentos tecnológicos com os objetivos da empresa. Os gestores devem pensar cuidadosamente sobre as limitações das plataformas de tecnologia quando se trata de construir uma comunidade online coesa. É importante pesquisar e selecionar tecnologias que se alinhem com a intenção estratégica da organização para desenvolver relacionamentos eficazes entre gestor e funcionário. Isso garantirá que as tecnologias não sejam implantadas como adições prontas para uso, mas sejam escolhidas intencionalmente pelos recursos que oferecem, o que também pode garantir uma vantagem competitiva. Lembre-se de que só porque um concorrente está usando uma determinada plataforma não significa que você é obrigado a adotá-la. Pesquisas sugerem que uma abordagem de “acompanhar os Joneses” nem sempre funciona.

Nossa pesquisa mostrou que para ter sucesso em ambientes de trabalho cada vez mais virtuais, empresas e gestores devem mudar seu pensamento quando se trata de como o poder é distribuído dentro da organização e as ferramentas utilizadas para construir e conferir poder relacional.

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Autoria

Lebene Soga, Yemisi Bolade-Ogunfodun, Nazrul Islam e Joseph Amankwah-Amoah

Lebene Soga é professor de empreendedorismo e liderança na Henley Business School no Reino Unido. Yemisi Bolade-Ogunfodun é professora de comportamento organizacional na Henley Business School. Nazrul Islam é professor associado de inovação e empreendedorismo na University of Exeter Business School no Reino Unido. Joseph Amankwah-Amoah é professor titular de negócios internacionais na Kent Business School no Reino Unido.

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