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Gestão de pessoas

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Quatro gerações trabalhando juntas...

... e uma quinta a caminho. Para gerenciar bem esse convívio, é importante separar o estereótipo coletivo das diferenças individuais e tropicalizar o entendimento

Colunista Augusto Dias Carneiro

Augusto Dias Carneiro

03 de Fevereiro

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Artigo Quatro gerações trabalhando juntas...

Muito se escreve sobre millennials, geração X, geração Z etc. Mas até que ponto são estereótipos? E será que não deveríamos ter uma classificação que melhor reflita a realidade brasileira?

Primeiro vamos ver como que demógrafos e mídia – e, por extensão, a opinião pública – classificam as diferentes gerações. Adotei o critério normalmente aceito (copiei da The Economist) quanto ao ano de nascimento:

  • Geração pós-Z 2013 em diante
  • Geração Z 1997-2012
  • Millennials 1981-1996
  • Geração X 1965-1980
  • Geração do pós-guerra (baby-boomers) 1945-1964 (E até 1945 era a maioria silenciosa)

O livro Conflito de Gerações: Desafios e Estratégias para Gerenciar Quatro Gerações no Ambiente de Trabalho, de Valerie Grubb, descreve cada geração em detalhe. Eis uma lista mínima dos itens em que as gerações diferem, em alguns casos drasticamente:

  • Relação entre trabalho e lazer, inclusive progresso e reconhecimento profissional, e onde/quando é válido trabalhar.
  • Feedback, inclusive frequência de feedback.
  • Como lidar com maternidade e paternidade.
  • Visão sobre LBGTQIA+, diversidade e inclusão.
  • Trabalho em equipe, em particular hna equipes multigeracionais.
  • Fluência com TI.

Estereótipos incomodam muitos de nós, até porque toda geração herda algumas características da precedente. E – vamos combinar – algumas diferenças não pareciam tão estranhas assim quando tínhamos aquela idade! Recentemente um executivo que é meu coachee me relatou um atrito com um subordinado (millennial, idade 27), e eu pensei como eu me comportava igualzinho no trabalho quando eu tinha 27 anos...

Nas empresas, eufemismos proliferam: “Fulano não está atualizado” e “preciso de alguém com mais energia” querem, ambos, dizer que Fulano está “velho demais”. Assim como “esta posição exige muita experiência” quer dizer que o candidato é “jovem demais”. (Poderíamos alongar a lista dos eufemismo, com “Essa posição exige muita energia” pode significar “não quero candidatas mulheres” etc.)

O livro da Valerie Grubb parece ser bem popular no Brasil, e focaliza como liderar as quatro gerações trabalhando juntas no momento na maioria das empresas. Se for ler, peço que você releve a qualidade da tradução e o inevitável gringocentrismo. O mantra dela é “converse com cada subordinado individualmente” – obviamente, uma estratégia eficaz contra estereótipos. Mas difícil de operacionalizar para aqueles entre nós que têm mais de 50 subordinados.

Peculiaridades tropicais

No Brasil, as classificações acima têm alguma ressonância. Mas outras características são absolutamente peculiares para nós. Então, eu gostaria de ver alguém no Brasil escrevendo uma versão nossa de como se dividem estas gerações. Correndo novamente o risco de estereotipar, eis algumas sugestões para quem for encarar tal empreitada:

Geração pós-Z (nascidos a partir de 2013) Ainda não estão no mercado de trabalho, mas daqui a pouco estarão. Como os Zs que os precedem, haverá um grande contingente feminino. Alguns terão formação acadêmica impecável, fluência em línguas e tecnologia da informação (TI), mas a maioria se ressentirá de extremos hiatos acadêmicos, o que, associado à evasão de millenials (ver abaixo), resultará em aumento de desigualdade e crises de empregabilidade na segunda metade desta década – exatamente quando o Brasil terá problemas gigantescos a resolver. Essa geração se preocupa enormemente com temas ambientais, até porque sabe que logo logo estará incumbida de resolvê-los.

Geração Z (1997-2012) Eles começaram a ir para a escola depois de janeiro de 2003 (quando Paulo Renato Souza saiu do Ministério da Educação) e muitos, principalmente os menos favorecidos, se ressentem de substanciais carências de formação acadêmica. Pensando na maioria dos casos, é a primeira geração onde ambos os pais trabalham. E o percentual de mulheres com nível superior completo é o maior de todas as gerações até agora. Já cresceram com tecnologia, e têm dificuldade em imaginar um mundo sem ela. Mostram uma versão exacerbada da preocupação com qualidade de vida que observamos nos millennials. Mas alguns têm dificuldade em equilibrar vida pessoal e profissional. Sofrem de depressão, um tema mal resolvido neste nosso momento. Como os millennials, vários querem ir embora do Brasil. Apreciam trabalhar em equipe, mas podem competir com colegas da mesma geração. Apreciam feedback, mas são extremamente críticos com feedback mal dado. A maioria das pessoas não é muito articulada em conhecimentos sobre o Brasil pré-1990, mas se expressa com veemência quando indagada sobre problemas brasileiros atuais. Quase todos cultivam a saúde e não se interessam por drogas. Nem por política – em boa parte porque falta um político que se conecte com eles.

Geração millennial (81-96): Inauguraram o crescimento rápido do contingente feminino no mercado de trabalho. Como seus colegas lá fora, praticam o que pregam (“walk the talk”) e lidam muito bem com internet e trabalho remoto, apreciam feedback profundo e frequente, e preferem trabalhar em equipe. Também foram bastante afetados pela juniorização das funções (vide geração X, abaixo). Entre nós, esse contingente é o primeiro a mostrar substancial componente feminino com superior completo. Perseguem ativamente um equilíbrio entre vida pessoal e vida profissional, e recusam promoções quando sentem que isto ameaçará este equilíbrio. Os casais conciliam bem filhos e trabalho – melhor que as gerações anteriores –, mas muitos reclamam da falta de colaboração de chefes que pertencem a gerações anteriores. Buscam realização pessoal/profissional por seus próprios meios, sem esperar isso da empresa. Uma quantidade substancial está muito desencantada com o Brasil, e quer emigrar para outros países. Alguns se dedicam ativamente a concretizar esse desejo e – just in case – quem era elegível tirou passaporte português ou italiano. Outros já foram embora...

Geração X (65-80): Contingente bem menor que os pós-Guerra (a pílula anticoncepcional chegou aqui em 1964), viram a interiorização do desenvolvimento brasileiro, e o crescimento vertiginoso do agronegócio. Essa geração chegou ao nosso mercado de trabalho junto com a juniorização, fenômeno (a partir de 95) quando as empresas, objetivando reduzir custos, substituíam as pessoas por outras com menos experiência. Isso, por sua vez, gerou descrições de cargo onde havia grande descompasso entre (muita) responsabilidade e (pouca) autoridade. Pelo que observo como coach deles, isso se traduz em fonte recorrente de burnout, coisa que piorou durante a pandemia. Muitos são filhos de pais jovens que optaram por ter filhos mais tarde, e hoje na pandemia cuidam simultaneamente de crianças e de idosos. Muito ciosos de suas conquistas pessoais e profissionais, podem lidar mal com mudanças na empresa que parecem ameaçar isso. E alguns precisam de treinamento específico para lidar com as outras três gerações com quem trabalham. Como os millennials, muitos querem emigrar para outros países, mas não correm atrás disso tão bem quanto os millennials.

Geração pós-guerra (45-64): Cresceram nos anos Kubitschek (1956-1960, mantra: O País do Futuro). Crianças/adolescentes foram pra rua ver os tanques passar em 64. Adquiriram consciência ecológica com o livro da Rachel Carson Primavera Silenciosa que chegou aqui em 1965. São a primeira geração a adolescer com a pílula anticoncepcional. Cursaram faculdade sob o AI-5 (68) e a partir de 84 viveram o auge da aids. Mas continuaram otimistas e tiveram filhos cedo. Muitos dos seus anos mais produtivos ocorreram quando o dinheiro no Brasil não armazenava valor (1980-1994). Hoje não querem (e alguns não podem) se aposentar, porque, com os avanços da medicina, muitos são saudáveis e produtivos em níveis inimagináveis para a geração que os precedeu. Muitos têm bom nível acadêmico e fluência com línguas, mas poucos lidam bem com TI. Gostam de reclamar, em particular – e com justiça – de sofrer preconceito no mercado de trabalho.

Detalhe: o nome “baby-boomers” significa pouco para nós. Afinal, nosso percentual de crescimento populacional 45-64 não foi nada próximo do que se viu nos EUA e na Europa. Devíamos dar outro nome a esta geração – talvez algo que inclua país, futuro e xabu?

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Colunista Augusto Dias Carneiro

Augusto Dias Carneiro

Coach, headhunter, autor, mediador e board member, Augusto Dias Carneiro é sócio da Zaitech Consultoria. Autor de Guia de Sobrevivência na Selva Empresarial.

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