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Qual é o propósito do propósito corporativo?

Ele realmente influencia o desempenho da empresa? Confira o que as dizem as métricas

Paul Ferreira
29 de julho de 2024
Qual é o propósito do propósito corporativo?
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O que queremos dizer com propósito? O que está impulsionando a (re) emergência do propósito? Como o propósito permite o sucesso organizacional?

Enquanto o mundo corporativo, incluindo CEOs, executivos, consultores e a imprensa, articulam há muito tempo o papel do propósito corporativo (que será chamado de PC neste texto) em suas organizações, não há uma definição universalmente estabelecida na literatura acadêmica ou profissional deste conceito.

Um conjunto de definições concentra-se em relacionar o PC com um objetivo social para a empresa. Por exemplo, Bartlett e Ghoshal definem propósito como “a afirmação moral de uma empresa às suas responsabilidades amplamente definidas, não um plano amoral para explorar oportunidades comerciais.” O Purposeful Company Report – escrito por um consórcio de acadêmicos que estuda propósitos nos negócios – define o propósito de uma empresa como “sua razão de ser.” Outros – inclusive eu – adotam uma visão mais ampla do propósito, como um conjunto de crenças sobre o significado do trabalho para uma empresa além da maximização do lucro ou de quaisquer medidas quantitativas de desempenho financeiro. Por exemplo, a empresa brasileira de cosméticos Natura, uma das empresas mais bem-sucedidas em termos de desempenho do preço das ações na última década, declarou explicitamente um objetivo além da maximização do lucro desde a sua fundação.

O propósito pode parecer um conceito elegantemente recente, mas na verdade tem uma longa história. O PC no sentido moderno é utilizado desde pelo menos 1947, quando Forrest E. Mars definiu o propósito da empresa de alimentos Mars como “a fabricação e distribuição de produtos alimentícios de maneira a promover uma mutualidade de serviços e benefícios entre consumidores, distribuidores, concorrentes, fornecedores, órgãos governamentais, funcionários e acionistas.” Nas décadas de 1970 e 1980, o conceito de PC caiu em desuso, na medida em que o credo da responsabilidade (exclusiva) das organizações em maximizar o valor do acionista se generalizou. Desde então, o conceito voltou gradualmente às conversas de negócios. Em particular, entre 1994 e 2016, o discurso público sobre propósito organizacional aumentou cinco vezes, agora tendendo a uma taxa exponencial que supera a taxa do discurso público sobre sustentabilidade. 

A reemergência do conceito marca talvez o impacto de novas forças e o desejo de desenvolver uma resposta mais ágil, porém abrangente, às demandas que os negócios enfrentam atualmente. As últimas cartas anuais do Larry Fink aos CEOs apontam isso admiravelmente. Os conceitos de sustentabilidade, impacto social corporativo, valor agregado, valor compartilhado e o “triple bottom line” resultado triplo elaboraram essa visão dos negócios, dando às empresas a responsabilidade de criar valor com e para as muitas partes interessadas em que seus negócios tocam – e o ambiente físico em que operam. 

Outro motivo possa ser a prática de certas empresas em confundir propósito com função. O Theodore Levitt, observou que várias empresas ferroviárias faliram por pensar que estavam no ramo ferroviário e competiam entre si. Na realidade, eles estavam no negócio de transporte e seus concorrentes reais eram formas alternativas de transporte, como companhias aéreas, empresas de transporte rodoviário e assim por diante. Como o propósito nos diz para que serve o negócio, por que ele existe e que valor se destina a criar, é, portanto, estratégico para enfrentar um ritmo acelerado de mudanças à medida que a digitalização, os negócios disruptivos e as rápidas mudanças nas expectativas dos consumidores reformulam seu mundo. 

Por fim, as demandas de uma nova geração de funcionários por significado em seu trabalho, os níveis decrescentes de confiança nas empresas e mudanças nas preferências do cliente, provavelmente contribuíram para o ressurgimento do PC. Pesquisas revelam que quando a qualidade e o preço são iguais, o fator mais importante que influencia a escolha da marca é o propósito. Em todo o mundo, a importância do propósito como gatilho de compra aumentou 26%. 

E agora a pergunta que não quer calar: o PC influencia o desempenho da empresa?

No mundo corporativo, grande parte da discussão sobre o propósito sugere que as empresas orientadas a propósitos ganham mais dinheiro, têm funcionários mais engajados e clientes mais leais e são ainda melhores em inovação e mudança transformacional. Contudo, poucas métricas foram desenvolvidas para medir a presença e o impacto do propósito e, portanto, um pequeno número de estudos acadêmicos tentou determinar o impacto do propósito nos resultados organizacionais. 

Em um estudo recente, os autores criaram uma medida de propósito a partir das respostas de funcionários a uma pesquisa da consultoria Great Place to Work. Eles então associaram essa medida a dois resultados comuns de desempenho da empresa, o retorno sobre ativos e o Tobin’s Q. Notavelmente, essa análise produz um resultado nulo. Eles não encontraram relação entre a força das crenças dos funcionários no propósito – agregadas ao nível da empresa ou por nível de emprego – e as medidas de desempenho da empresa. 

Curiosamente, em análises posteriores, os autores evidenciaram que, embora o propósito por si só não esteja associado ao desempenho, quando associado a outras variáveis, ele está associado ao desempenho. Em particular, eles descobriram que organizações de alta clareza de propósito exibem desempenho financeiro mais alto no futuro, principalmente quando essas crenças são mantidas por aqueles que estão no escalão médio da hierarquia.

Em resumo, minha opinião é que esses resultados preliminares deixam muitas perguntas sem resposta e abrem oportunidades significativas para pesquisas futuras e experimentações reais sobre o papel do propósito corporativo nas organizações.

Bartlett, Christopher A., and Sumantra Ghoshal. “Changing the role of top management: Beyond strategy to purpose.” Harvard Business Review 72, no. 6 (1994): 79-88.

The Purposeful Company Interim Report, May 2016.

http://www.managementexchange.com/story/innovation-in-well-being

2019 – https://www.blackrock.com/americas-offshore/2019-larry-fink-ceo-letter; 2020 – https://www.blackrock.com/corporate/investor-relations/blackrock-client-letter

T. Levitt, Marketing Myopia, 1960

The 2012 goodpurpose® study, Edelman annual global research, 2012

https://pubsonline.informs.org/doi/10.1287/orsc.2018.1230

Paul Ferreira
É professor em tempo integral de estratégica e liderança na Fundação Getúlio Vargas (FGV EAESP, Brasil), diretor do mestrado executivo em administração (MPA) da FGV EAESP e vice-diretor do Núcleo de Estudos em Organizações e Pessoas (NEOP). Desde 2020, Paul é colunista do MIT Sloan Management Review Brasil. Além disso, ele é pesquisador visitante permanente na Universität St. Gallen (Suíça).

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