A Moove, divisão de lubrificantes da Cosan, fez um design sprint de uma semana, um dos modelos possíveis para inovar; aqui são relacionados cinco modelos, com um alerta: cuidado para o remédio não virar veneno
Fazer algo inovador não é fácil. A taxa de fracasso de novos medicamentos é superior a 95%. Existem mais de 200 imunizantes em processo de desenvolvimento contra a Covid-19. Uma pequena parcela destes projetos terá sucesso.
No ambiente de negócios não é diferente. Entre 70% a 90% dos projetos de inovação corporativa fracassam. Executivos de grandes empresas têm consciência de que inovar é prioridade, mas apenas 6% estão satisfeitos com os impactos gerados por seus esforços de inovação.
Compreender as causas desse baixo desempenho e identificar os remédios mais adequados para cada patologia é fundamental, não só para pesquisadores de vacinas como também para líderes de inovação. Tendo vivenciado essa realidade diversas vezes como consultor, pesquisador e intraempreendedor consolidei o que entendo ser o mecanismo causal da baixa taxa de sucesso da inovação: um conjunto de escolhas incoerentes entre estratégia, modelo e cultura de inovação.
A empresa não estabelece uma estratégia de inovação alinhada com a estratégia de negócios. Ao não ter uma estratégia de inovação clara, a empresa escolhe o modelo de inovação inadequado para sua ambição. Depois de selecionar o modelo de inovação não aloca os recursos compatíveis para uma execução eficaz.
Quando a empresa não sabe qual a estratégia de inovação nenhum modelo funciona. Quem escolhe o modelo antes da estratégia atua como o médico que recomenda o medicamento antes do diagnóstico.
Para definir o melhor modelo, a empresa precisa de uma estratégia de inovação que defina prioridades. Entender os modelos de inovação disponíveis permite identificar quais os mais adequados para cada estratégia.
Modelos de inovação são formas estruturadas de transformar novas ideias em resultados. Mecanismos organizados para gerar, testar e executar um pipeline de projetos de inovação. Os modelos evoluíram.
Os heads de inovação das empresas possuem diversas novas formas de inovar e alguns velhos remédios com novas embalagens. Podemos diferenciar os modelos em função de:a) horizonte de crescimento, core (H1), adjacências (H2) e transformacional (H3); b) tipo de inovação, incremental ou disruptiva ou;c) agentes envolvidos, inovação fechada ou aberta.
Selecionei cinco modelos de inovação adotados por empresas brasileiras para detalhar o funcionamento, contexto de aplicação e pré-requisitos de cada um deles. Não é uma lista exaustiva nem pretende ranquear frequência ou efetividade de adoção. No entanto, apresenta a variedade de modelos necessária para cumprir distintas estratégias de inovação.
O modelo remonta as caixas de sugestões, turbinadas por tecnologias de colaboração. Adequado para inovações incrementais quando as pessoas que enfrentam os problemas tem condições de resolvê-los.
O envolvimento dos intra-empreendedores ocorre de maneira part-time ao longo de um processo de 3 a 6 meses em formato de campanha ou contínuo. Os programas de ideias precisam da definição clara de papéis entre aqueles que submetem as ideias e os que irão executá-las.
O maior desafio desse modelo está na execução dos projetos e não na ideação. É fundamental pensar em mecanismos de incentivos adequados a cultura da empresa. O laboratório Aché, reconhecido como inovador, tem um programa de sucesso desse tipo denominado de Academia de Inovação. Além de um portifolio de projetos para H1, os programas de ideias impactam positivamente na cultura de inovação. Por outro lado, não são os veículos mais efetivos para criação de novos negócios.
O modelo popularizado pelo Google Ventures trata da formação de um time que se dedica em caráter imersivo por uma semana para resolver determinado problema ou criar uma solução para uma oportunidade. É um modelo com flexibilidade que pode ser utilizado para problemas de H1 assim como oportunidades de H2 e H3.
O ponto de partida do Sprint é um tema relevante para a empresa e seus clientes. A semana é organizada em função do processo de inovação, do entendimento do problema até a validação. O modelo resolve um dos maiores desafios do intra-empreendedorismo que é a falta de tempo dedicado das pessoas.
A Moove, empresa de lubrificantes da Cosan, reuniu um time interno de 8 pessoas com 7 experts e makers convidados e dedicou 1.000 horas de trabalho em uma semana para criar uma solução que será levada a mercado. Incrível o que um grupo de pessoas com propósito, dedicação exclusiva e senso de urgência pode fazer. O segredo do modelo é a formação do time.
O modelo inclui formatos de aceleração, contratação e parceria entre empresas estabelecidas e startups. Normalmente estruturado em batches por meio de desafios com duração de 6 a 8 meses. Esse tipo de modelo tem uma fase de inscrições seguida de uma etapa de filtro e outra de desenho de projeto piloto a ser executado. Ao término dos pilotos são selecionados os projetos para rollout.
É um modelo efetivo para as empresas terem acesso a novas soluções e para startups que queiram melhorar produtos, ganhar clientes e ter acesso a ativos das corporates. A conexão com startups requer preparação interna daqueles que irão trabalhar com a startup e das áreas de back office que formalizarão a relação.
A SLC Agrícola, líder na produção de grãos e fibras, opera o programa AgroX que contrata e faz parceria com Agtechs com resultados consistentes. A interação com startups também impacta positivamente na cultura dos profissionais da empresa. É uma alternativa eficaz para inovações de incrementais de H1 e disruptivas de H2.
O modelo é uma releitura dos antigos centros de P&D com foco em desenvolver novos modelos de negócio e soluções digitais. Consiste numa estrutura física com profissionais full-time alocados que faz a identificação de oportunidades, prototipação e execução em larga escala de projetos de novas adjacências (H2) e novos negócios (H3).
O LuizaLabs da Magalu que apoia a transformação digital e ampliação de portfólio da empresa é uma referência no tema no Brasil. O Labs podem integrar diversos parceiros externos para potencializar a inovação e demandam maior montante de recursos do que programas de ideias e sprints. Esse modelo ganhou tração estimulado pela noção de que é necessário separar a inovação disruptiva do core business. O desafio do Labs é ter clareza do seu mandato para estar, distante o suficiente para explorar oportunidades além do dia a dia das unidades de negócios e perto o bastante para ter acesso aos recursos da empresa. Não são raros os Labs que ficaram órfãos de atenção gerencial e recursos ao perder alinhamento com a estratégia.
O CVC é um modelo com aplicação crescente no Brasil. Envolve o investimento de capital de risco com objetivos estratégicos e financeiros de empresas estabelecidas em startups. O CVC representa, no mundo, 25% dos aportes de venture capital. É um modelo adequado para explorar inovações disruptivas de H2 e H3 ao permitir opções ofensivas de acesso a novos produtos e mercados ou movimentos defensivos contra disrupção.
O Hospital Albert Einstein investe em startups para ampliar suas áreas de atuação. A estruturação de um CVC é um compromisso de longo prazo. Fundos de capital de risco tradicionais tem entre 5 e 7 anos de maturação.
Esse modelo exige a definição clara de uma tese de investimentos e a estruturação de um time que conheça o ecossistema, saiba fazer deals e tenha profundo relacionamento com a alta gestão para garantir o acesso aos ativos da empresa para potencializar a startup. É um dos modelos mais sofisticados nessa jornada.
A inovação corporativa é um meio para atingir objetivos de negócios. Cada modelo de inovação funciona melhor para determinadas estratégias. A escolha de um modelo de inovação é como a prescrição de um medicamento; funciona para circunstâncias específicas e não se aplica a outras.
Não há uma única forma de fazer inovação, assim como não existe apenas um remédio para todas patologias. O Magazine Luiza tem um Lab de inovação, faz desafios de inovação aberta além de investir e adquirir startups. Entender as alternativas disponíveis e contextos de aplicação aumenta as chances de sucesso.
A melhor forma de ampliar a taxa de sucesso da inovação é compatibilizar a escolha dos modelos mais adequados com a estratégia de inovação desenhada e lembrar de Paracelso, médico e físico do século 16: “a diferença entre o remédio e o veneno é a dose”.”