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Luz no fim do túnel: o desenvolvimento de vacinas contra a Covid-19

Nunca se falou tanto de vacina. Não é para menos: 64 vacinas contra a Covid-19 estão em estudos clínicos e 173, em ensaios pré-clínicos. Este texto permite conhecer mais sobre esse trabalho de pesquisa e desenvolvimento

Gustavo Meirelles
29 de julho de 2024
Luz no fim do túnel: o desenvolvimento de vacinas contra a Covid-19
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Em dezembro de 2019, na cidade de Wuhan, China, foram descritos alguns casos de infecção pulmonar por um novo coronavírus (SARS-CoV-2). Denominada de Covid-19, a doença causada por ele logo se disseminou por outras cidades chinesas, pela Ásia e, posteriormente, por todos os continentes, levando a OMS (Organização Mundial da Saúde) a classificá-la como pandemia em 11 de março de 2020. No momento em que este artigo é escrito, há mais de 96 milhões de casos de Covid por todo o mundo, sendo 8,5 milhões no Brasil, além de 2 milhões de óbitos, sendo 210.000 no Brasil.

Vacinas para prevenir a contaminação pelo Sars-CoV-2 têm sido exaustivamente pesquisadas e constituem a maior esperança para a contenção da pandemia. Atualmente, de acordo com dados da OMS, 64 vacinas estão em estudos clínicos e 173, em ensaios pré-clínicos. Neste texto, vamos conhecer mais sobre as etapas e os tipos de vacinas que podem ser desenvolvidas contra agentes infecciosos.

Etapas para desenvolvimento de vacinas

Na expectativa de termos uma vacina contra a Covid-19 disponível no menor tempo possível, ouvimos falar muito de termos como “ensaios clínicos” e “fases I, II e III dos estudos”. Para profissionais da área da saúde envolvidos em pesquisa, esses termos já estão no cotidiano. Mas imagino que o público geral não esteja tão familiarizado com os mesmos. O que seriam, então, os estágios para desenvolvimento de uma vacina?

De modo geral, o desenvolvimento de uma imunização, assim como o de medicamentos, passa por uma avaliação pré-clínica e três etapas clínicas, denominadas de fases I, II e III. Essas etapas costumam levar anos para serem completas e acontecem de forma sequencial. Por conta da pandemia, o desenvolvimento de vacinas foi acelerado, com algumas dessas etapas ocorrendo em paralelo e em tempo recorde, sempre buscando respeitar critérios rígidos de segurança.

A avaliação pré-clínica é a primeira a ser realizada e busca calcular, primeiramente, a segurança da vacina. Após sua administração em animais, avalia-se também a sua resposta imune e eventuais efeitos colaterais decorrentes; se o resultado é positivo para geração de resposta imune e negativo para efeitos colaterais significativos, passa-se então para a fase I do ensaio clínico, na qual a vacina é testada em voluntários humanos sadios (geralmente algumas dezenas), com o objetivo novamente de testar sua segurança, além de avaliar a dose ideal a ser empregada.

Os voluntários são avaliados diariamente com medição da temperatura corporal e análises detalhadas de eventuais reações adversas tanto no local da injeção quanto sistêmicas. Nessa fase, comitês independentes de monitoramento são acionados para avaliar qualquer efeito colateral e também para aprovar eventuais aumentos da dose vacinal. No caso de efeitos colaterais graves, o estudo é interrompido e uma análise detalhada é realizada. Caso isso não ocorra, passa-se então à próxima etapa do ensaio.

Na fase II, centenas de voluntários são recrutados. O objetivo primário dessa fase é expandir o perfil de segurança e da resposta imune, novamente com análises detalhadas de comitês independentes.

A última fase é a III, na qual busca-se avaliar se as vacinas são capazes de realmente prevenir a contaminação. Nessa etapa, os voluntários são divididos em dois grupos, de forma cega e randomizada; ou seja, os participantes do estudo não sabem se receberão doses do imunizante ou do placebo. Eles são avaliados frequentemente quanto a efeitos colaterais e, quando desenvolvem sinais ou sintomas da doença, são submetidos a testes laboratoriais para confirmar a infecção. A eficácia da vacina é mensurada e apresentada em porcentagem, correspondendo ao percentual de voluntários que recebeu placebo e foi infectado em comparação com aqueles que foram vacinados e foram infectados também. Ou seja, quando se diz que uma vacina tem eficácia de 95%, estamos dizendo que apenas 5% dos indivíduos vacinados apresentaram a infecção, em comparação com um grupo que recebeu placebo onde todos a desenvolveram.

Tipos de vacina em desenvolvimento para Covid-19

As vacinas contra o novo coronavírus têm sido desenvolvidas usando diferentes plataformas:

– Algumas promovem o crescimento do SARS-CoV-2 em meios de cultura e o inativam quimicamente depois. O vírus inativado é então injetado em seres humanos para estimular uma resposta imune em caso de infecção posterior.- Outras utilizam o vírus vivo, mas em uma forma atenuada, seja modificando-o geneticamente ou promovendo o seu crescimento em condições adversas, nas quais sua capacidade de causar doença (sua virulência) é perdida, mas sua capacidade de gerar resposta imune é mantida.- Existem vacinas que empregam proteínas virais recombinantes, isto é, que não necessitam replicação do vírus vivo, deixando mais fácil a produção.- Há também as que utilizam vetores, isto é, aplicam outro agente viral (por exemplo, um adenovírus ou o da influenza), que é geneticamente modificado para expressar a proteína viral, o alvo desejado da resposta imune. Alguns desses vírus são modificados para não se replicarem no corpo humano, mas também geram uma resposta imune mais fraca. Outros mantêm a capacidade de se replicar, inclusive para expressar a proteína da espícula do coronavírus, gerando maior reações antigênica.- Por fim, mas não menos importante, a pandemia de Covid-19 trouxe um grande avanço: o desenvolvimento de vacinas à base de RNA, abordagem diferente e completamente inovadora. Uma vez que o imunizante é administrado, o RNA é traduzido para a proteína-alvo com o objetivo de gerar uma resposta imune. O RNA mensageiro fica no citoplasma, não entra no núcleo celular e não tem qualquer interação com o DNA do indivíduo imunizado. Este vídeo apresenta, de forma curta e didática, o mecanismo de ação das vacinas à base de RNA.

Na nossa próxima coluna, conheceremos ainda mais das imunizações em produção contra a Covid. Enquanto isso, continuem usando máscaras adequadamente, mantendo o distanciamento social, realizando higienização das mãos e evitando aglomerações. Embora as vacinas tenham nos presenteado com uma luz no fim do túnel, é preciso recordar que ainda estamos no túnel.

Para saber mais:https://www.uptodate.com/contents/coronavirus-disease-2019-covid-19-vaccines-to-prevent-sars-cov-2-infection#H2219006264

https://emedicine.medscape.com/article/2500139-overview#a1

Agradecimentos aos amigos Augusto César de Macedo, médico radiologista do grupo Fleury, e Marcos Nascimento, médico pneumologista e gerente médico da Boehringer-Ingelheim do Brasil.

Gustavo Meirelles
É fundador, investidor e conselheiro de startups, principalmente na área da saúde. Médico radiologista, com especialização, doutorado e pós-doutorado no Brasil e no exterior. Tem experiência como executivo de grandes empresas de saúde, com MBA em gestão empresarial. Mais informações em: www.gustavomeirelles.com.

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