Em oportunidades reais de negócios, como manter os registros digitais em sincronia com suas contrapartes off-line?
“As arquiteturas blockchain têm o potencial de fazer coisas incríveis: fornecer uma trilha de auditoria digital imutável de transações e possibilitar verificação da integridade dos dados de maneira barata. Além disso, as arquiteturas ajudam empresas e indivíduos a chegarem num consenso, em escala global, sobre o verdadeiro estado de coisas dentro de determinado mercado, sem depender dos altos custos da intermediação.
No entanto, para avaliar modelos de negócios, é importante saber quais limitações e quais situações podem ser abrangidas pela tecnologia blockchain, e é sobre esse tema que trata este artigo.
Já há soluções blockchain ajudando várias indústrias, como o setor de marketing e a publicidade. A tecnologia representa confiança e possibilita rastrear quais identificadores digitais estão associados à visualização de um anúncio. E se quisermos garantir a propriedade sobre os registros digitais, como dados de navegação e NFTs, o blockchain pode funcionar perfeitamente.
Para ilustrar melhor, quem busca a garantia de que o pagamento de um anúncio seja realizado de acordo com o número de cliques e visualizações efetivas de determinado conteúdo, existe a AdBank, uma plataforma para a transparência de pagamento entre anunciantes e editores.
Se a questão é reduzir intermediários na cadeia de publicidade, a fim de otimizar custos, existe a Adshares, solução que permite a negociação direta entre editores e anunciantes.
Ainda, como exemplos de soluções para reduzir fraude na publicidade, há a XCHNG, blockchain aberta e unificada que usa contratos inteligentes para diminuir fraudes, e o aplicativo descentralizado AdChain Registry Dapp”, da Metax, que decifra quais sites baseados em anúncios são legítimos.
De fato, blockchain pode auxiliar a corrigir equívocos no gerenciamento de dados, e solucionar problemas ocasionados pela falta de transparência, dentre outros. Entretanto, ainda assim, há casos inviáveis no uso de soluções blockchain.
Imagine a hipótese onde o anúncio de grandes marcas pode não aparecer ao lado outras publicações. Isso realmente acontece. Por isso, o jornal britânico “Times” publicou um relatório mostrando que anúncios de grandes marcas estavam aparecendo ao lado de vídeos racista numa gigantesca plataforma de vídeos.
O anunciante pode pensar que está pagando para exibir um anúncio para um homem de quarenta e tantos anos no mercado de automóveis esportivos, mas o anúncio pode ser exibido para um pai de família que, apesar de sonhar com a compra de modelos esportivos, pretende comprar outro veículo mais espaçoso para crianças. Ou ainda, o anúncio poderia estar sendo visualizado por um bot.
Logo, a máquina da confiança não consegue verificar a integridade humana ou as intenções de um comprador. Verificar quem está realmente por trás do identificador digital requer verificação off-line.
Do mesmo modo, como identificar recém-nascidos no berçário de um hospital e as consequências de uma troca de bebês? Esta é uma questão muito séria.Nesse quadro, armazenar registros que contenham a localização atual de um bebê, de modo que torne esses pontos de dados imutáveis e verificáveis em tempo real, parece uma grande utilidade da tecnologia blockchain.Existe, contudo, um grande obstáculo com o uso do blockchain para resolver esse problema de monitoramento de bebês. Os registros digitais podem ser imutáveis e verificáveis, mas como alguém sabe qual registro digital está ligado a qual recém-nascido?
Para vincular uma entrada no blockchain a um bebê na vida real, precisamos dar ao bebê um identificador físico, seja por meio de uma etiqueta física, seja um pequeno chip ou registro de genoma digital que ligue o bebê ao seu registro digital. E é aí que tecnologia blockchain encontra um grande obstáculo, e pode não funcionar.
Na interface entre o mundo off-line e sua representação digital, a tecnologia depende criticamente de agentes confiáveis para efetivamente superar o “último obstáculo” entre um registro digital e um indivíduo, empresa, dispositivo ou evento físico.
Em nosso último exemplo, vimos que a tecnologia blockchain teria que confiar nos seres humanos para implementar correta e honestamente a correspondência entre um bebê e seu registro digital. No entanto, e se os seres humanos errarem ou manipularem os dados antes de inseri-los no blockchain, em um sistema onde se acredita que os registros inseridos têm integridade? Isso pode ter sérias consequências negativas.
Por outro lado, se a ligação entre um recém-nascido e seu prontuário for estabelecida com integridade e sucesso, e o problema do último obstáculo for solucionado, então um blockchain pode ser usado não apenas para garantir a integridade dos dados, mas também para dar aos indivíduos controle sobre como seus dados médicos são usados.
Nas identidades digitais descentralizadas (DDID), como a desenvolvida pela Microsoft no blockchain bitcoin, também o obstáculo crítico é o onboard – a interface entre o mundo físico e sua representação digital.
De que maneira averiguar a real identidade de uma pessoa antes de inserir sua representação digital no Blockchain? Como identificar identidades fraudulentas, antes de fazer o registro no blockchain?
Uma vez feito o onboard da identidade, precisamos saber se a identidade daquela pessoa, já registrada digitalmente no blockchain, ainda representa a mesma pessoa, ou se alguma coisa mudou em sua vida.
Nesse contexto, numa cadeia de suprimentos, também é preciso identificar se o “preço em dólar” das matérias-primas utilizadas na fabricação de determinada mercadoria permanece estável ao longo de todo o processo de produção, ou se sofreu grande elevação, ou diminuição de preço.
Como para tudo há solução, vejamos como superar o último obstáculo à tecnologia blockchain.
Para entender como desbloquear esse último obstáculo à tecnologia blockchain, é preciso entender o que são oráculos e ter uma noção de contratos inteligentes.
Os contratos inteligentes são códigos de software que incorporam regras de governança e lógica de negócios dentro de um Blockchain. Imagine uma “caixa criptografada” que desbloqueia um valor ou um direito de acesso se, e quando, determinadas condições pré-estabelecidas são cumpridas.
Um oráculo, por sua vez, é um agente que localiza e verifica ocorrências do mundo off-line e envia essas informações a um blockchain para ser usado por contratos inteligentes.
Pois bem, como blockchains não conseguem acessar dados fora de sua rede, os oráculos são a ponte para resolver o obstáculo da interface entre os dois mundos, físico e digital.
Utilizando uma definição mais técnica, um oráculo é um feed de dados – fornecido por um serviço de terceiros – projetado para uso em contratos inteligentes na blockchain.
Basicamente, eles fornecem dados externos e acionam a execução de contratos inteligentes quando condições pré-definidas se encontram. Tais condições podem ser qualquer dado como temperatura do clima, uma operação de pagamento concluída, flutuações de preço numa bolsa de valores, dentre outros.
Existem diferentes tipos de oráculos com base no tipo de uso, como oráculos de software, oráculos de hardware, oráculos de consenso e oráculos de entrada e saída.
Utilizando o exemplo da identificação dos recém-nascidos no berçário de um hospital, para obtermos informações diretamente do mundo físico, podemos usar um oráculo de hardware como sensores de movimento e câmeras para monitorar as enfermeiras, e enviar dados para um contrato inteligente num blockchain.
Ademais, no caso das mercadorias na cadeia de suprimentos, podemos usar oráculos de entrada – outbound oracles – para abastecer uma ordem de compra automática, se o dólar americano atingir determinado preço.
Ainda, para verificar a integridade humana ou as intenções de um comprador no setor de marketing e publicidade, podemos usar uma combinação de oráculos com inteligência artificial, por exemplo.
O mundo off-line não é estático, e mudanças estão acontecendo a todo o tempo. Daí, ao analisarmos um modelo de negócios blockchain, é fundamental avaliarmos possíveis agentes de confiança para garantir que as informações do mundo físico sejam coletadas sempre que estiverem disponíveis.
A chave mestra aqui é refletir sobre como efetivar a interface entre os mundos off-line e on-line, o último obstáculo à tecnologia blockchain, e descobrir como resolver e preencher essa lacuna.
Quanto menor a distância entre esses dois mundos, melhor um evento no mundo off-line será relatado no blockchain e, assim, mais preciso e robusto seu ecossistema será.
Estude a fundo todos os tipos de oráculos possíveis, as inúmeras combinações entre blockchain e outras tecnologias de núcleo, como Inteligencia artificial e internet das coisas.
Uma solução blockchain vai muito além da remoção ou redução de intermediários. O bom uso da tecnologia da confiança sempre começa com o cuidado de extrair dados corretos, confiáveis e íntegros do mundo real, sem os quais será impossível solucionar qualquer problema. Afinal, como se diz no jargão popular da ciência da computação, garbage in, garbage out!
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