Há décadas as empresas têm tido uma única meta: crescimento financeiro, e quanto mais rápido, melhor. Agora, é diferente
Investidores e consumidores começam a avaliar as operações também com outras métricas de crescimento, como a ambiental, a social e a de governança.
É fácil presumir que isso é uma crítica à visão centrada no lucro, mas não é – trata-se de um alerta positivo para redefinir o crescimento de um modo novo que melhore a nossa vida.
Se o crescimento financeiro não é mais o único objetivo de uma empresa, quais são os outros?
E como alcançá-los sem perder de vista o fato de que no fim das contas o lucro continua a ser essencial para a longevidade de uma organização?
Se conseguirmos resolver essa questão, a redefinição de crescimento oferece uma oportunidade transformadora enorme para imaginarmos novas maneiras de criar e celebrar valor.
O que está acontecendo?
Investidores, clientes e funcionários vêm encorajando as empresas a reconsiderar sua visão de mundo e analisar a posição que ocupam.
Inquietas por conta das mudanças de valores sociais, da mudança climática, do esgotamento dos recursos naturais e da instabilidade econômica e política, as pessoas começam a questionar crenças antigas, incluindo a noção de que o crescimento a qualquer custo é aceitável.
No centro da tendência de As muitas faces do crescimento está o “poder do povo”. As pessoas estão exigindo mudanças numa época em que a desigualdade entre a população com maior renda e todo o resto do mundo é a maior que já existiu desde os anos 1930.
Os 40% mais abastados têm hoje, em média, dez vezes mais riqueza que os outros 60% – seis vezes mais que em 1980. A boa notícia é que este assunto tem sido cada vez mais discutido globalmente.
Em setembro de 2019, o Financial Times apresentou a campanha Nova Agenda. “A saúde do capitalismo com liberdade empresarial, a longo prazo, vai depender da entrega de lucros com propósito”, afirmou o jornal; “as empresas entenderão que essa combinação serve tanto a seus próprios interesses como aos de seus clientes e colaboradores”.
Um mês depois, BlackRock confirmou sua parceria global com a Ellen MacArthur Foundation para lançar seu primeiro fundo de economia circular – um forte sinal da maior empresa de asset management do mundo para outras empresas e investidores.
Os alertas estão vindo tanto de dentro quando de fora das empresas – investidores, colaboradores e clientes estão se fazendo ouvir.
Funcionários começaram a exigir que seus empregadores foquem mais o propósito e a ética, caso contrário vão fazer greve ou pedir demissão.
Equipes da Amazon, por exemplo, entraram em greve recentemente para mostrar seu descontentamento com o fracasso da empresa na forma de lidar com as alterações no clima.
A ativista ambiental sueca Greta Thunberg está inspirando estudantes a lutar pelo seu futuro. Junto com outros 15 jovens, ela fez na Organização das Nações Unidas um protesto ousado, pedindo que mudanças climáticas sejam classificadas como uma ameaça aos direitos das crianças.
Os clientes, por sua vez, começam a demandar um conjunto diferente de valores das organizações com as quais escolhem se engajar.
Segundo uma pesquisa recente, mais de 70% dos adultos sentem que empresas de capital aberto deveriam ter uma missão, além de focar os shareholders e os clientes.
A mesma pesquisa descobriu que 64% dos americanos acreditam que a razão principal para uma empresa existir deveria ser “tornar o mundo melhor”, além de ganhar dinheiro para os investidores.
Uma proporção significativa de jovens tem dado as costas para o capitalismo – numa pesquisa de Harvard em 2016, 56% dos jovens de 18 a 29 anos nos Estados Unidos disseram que não apoiam o capitalismo.
Este é um sinal interessante vindo dos mercados públicos. Eles têm se tornando mais céticos em relação a startups de tecnologia muito ambiciosas, que pintam cenários de crescimento que nem sempre resultam em negócios de sucesso.
O Uber se tornou uma empresa de capital aberto em maio de 2019, mas, em setembro, suas ações estavam 30% abaixo do valor no IPO, e sua rival, Lyft, tinha caído mais de 40% em apenas seis meses.
Na mesma semana em que a empresa Peloton, de bikes ergométricas ligadas à internet, teve queda de 10% no seu primeiro dia de trading, o Airbnb decidiu que só se arriscaria a abrir seu capital em 2020.
O maior exemplo disso, porém, veio com o colapso do IPO da WeWork em setembro. Seu valor de US$47 bilhões já tinha sido bastante questionado – e até descartado como “insano” pelo professor de marketing na NYU Stern School of Business, Scott Galloway – quando o IPO foi oficialmente retirado depois que o valor da empresa caiu mais de US$30 bilhões em questão de dias.
Nesse meio tempo, um número crescente de empresas vem tomando decisões de negócio importantes que indicam uma visão mais equilibrada sobre o que deveria significar crescimento e que criam um alicerce para ganhos futuros.
O jornal sueco Dagens ETC baniu propagandas de empresas que utilizam combustível fóssil, e a Walmart parou de vender munição para armas de padrão militar – duas medidas que vão afetar suas finanças, mas vão também alterar de modo crucial a percepção que o público e os funcionários têm dessas empresas.
Enquanto isso, a Nova Zelândia revelou seu primeiro “orçamento voltado para o bem-estar” em maio de 2019: uma nova meta econômica para transformar o país num ótimo lugar não só para ganhar dinheiro como para viver.
O que vem a seguir?
Estamos vendo organizações irem além da ética e até do envolvimento político para perguntar: como você inclui outras medidas motivadoras de crescimento na sua mentalidade operacional e ainda mantém a empresa dinâmica e bem-sucedida? Claro que capitalismo sem crescimento infinito é um imenso desafio mental, mas não é impossível.
Imagine que valorizamos colaboradores que aperfeiçoam suas habilidades e aumentam a perspectiva de progredir na carreira.
Como colaborador, a proposta de valor de uma empresa seria que você crescesse como pessoa de várias formas (e isso seria mensurado).
Qual seria a atratividade disso para os recrutas? Imagine que as empresas também foram avaliadas por criar laços fortes com a comunidade na qual operam. Ou que a prosperidade de uma empresa não fosse mais medida por si só, mas como parte de um ecossistema natural ou do cliente.
Novas definições de crescimento levarão, naturalmente, a um novo jeito de pensar sobre significado e métricas. Isso pode incluir métricas de avaliação de crescimento pessoal como nível de aprendizado, felicidade, longevidade comunitária ou boa saúde.
A gigante Sodexo, por exemplo, está contabilizando, seu progresso na redução de desperdício de alimentos na hora de calcular seu sucesso.
Estamos antecipando o momento quando o custo de um produto ou serviço será redefinido para incorporar fatores de sustentabilidade (muitas vezes chamados de externalidades), bem como o custo financeiro para gerá-lo.
De acordo com a professora Mariana Mazzucato, fundadora e diretora do Institute for Innovation and Public Purpose na University College London, no futuro as instituições financeiras talvez parem de avaliar empréstimos seguindo categorias como empresa ou país.
Em vez disso, podem passar a avaliar quais atividades dos solicitantes ajudam a cumprir missões específicas, como remover plástico do oceano. Deveríamos “escolher menos vencedores e escolher os que têm mais disposição”, diz Mazzucato.
Boa parte do crescimento virá pela tecnologia. Enquanto negócios dependentes de insumos materiais serão limitados na sua capacidade de mudar rapidamente, empresas 100% digitais terão maior agilidade nessa hora .
Por exemplo, elas terão mais facilidade para trocar a energia comum pela renovável e reduzir o consumo de energia e as suas pegadas de carbono.
Enquanto os recursos se esgotam no mundo físico, no mundo digital eles são ilimitados – contanto que tenhamos energia renovável para utilizá-los.
Empresas precisarão melhorar as habilidades de suas equipes em todos os níveis.
A Accenture publicou um relatório avaliando a prontidão dos CEOs para atingir as metas de sustentabilidade global da ONU, e nele foram identificados os requerimentos essenciais para liderança, incluindo a capacidade de ser pioneiro no processo de lucrar por meio de um propósito – olhar além dos lucros de curto prazo para poder alinhar outras metas de crescimento com a estratégia central do negócio, com as operações e os investimentos em inovação e tecnologia a longo prazo.
Um número crescente de empresas demonstra estar pronto para mudar. Quatro de cada 10 CEOs da Fortune 500 concordam que resolver problemas sociais deveria fazer parte da estratégia central da empresa.
Pense
Como você definirá novos tipos de valor para entregar enquanto gera o lucro necessário para prosperar? E como a experiência do cliente e a experiência do colaborador trabalharão juntas para gerar valor nos pontos de criação e entrega?
Diga
Pergunte a seus colaboradores que tipo de crescimento eles esperam ver na organização. Incentive o debate.
Faça
Comece a inserir novas métricas (além do crescimento financeiro) para direcionar comportamentos. O que você mede, conta. Colabore com quem tiver disposição para fazer mudanças acontecerem em nível industrial, pois é mais fácil comprometer-se com mudanças efetivas quando há mais pessoas envolvidas. Como você irá recompensar os valores diferenciados? Como você motiva as pessoas?