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As possibilidades e os desafios do uso de blockchain no setor da saúde

Garante confiabilidade e segurança, principalmente em conjunção com contratos automatizados, mas ainda tem alguns pontos de atenção que precisam ser resolvidos, como a experiência do usuário e o custo de transações

Gustavo Meirelles
12 de julho de 2024
As possibilidades e os desafios do uso de blockchain no setor da saúde
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Quando se fala em blockchain, poucas pessoas no setor de saúde sabem exatamente a que nos referimos. Entre os que conhecem a tecnologia, a maioria a relaciona a criptomoedas, especialmente a mais famosa – a bitcoin. Embora seja verdade que a tecnologia por trás da bitcoin seja blockchain, é também verdade que existem diversas outras aplicações não relacionadas a criptomoedas. Neste artigo, vamos falar um pouco mais sobre suas possibilidades no setor da saúde.

Para começar, vamos buscar entender, de modo simples, o que é blockchain, sem detalhes técnicos e em poucas linhas. De um modo bastante simples, o blockchain é uma corrente de blocos descentralizada, em que cada um dos blocos carrega uma informação diferente. Para que uma nova informação, ou seja, um novo bloco, seja adicionada a essa corrente, é necessário que esta seja validada por consenso da maioria dos participantes, isto é, computadores da cadeia.

O fato do blockchain ser descentralizado faz com que as informações não estejam todas em um mesmo servidor ou banco de dados, tornando a tecnologia mais segura e mais difícil de ser adulterada em comparação a um servidor centralizado, no qual bastaria adulterar um único local para acessar e modificar todas as informações. Ou seja, diferente de servidores ou bancos de dados convencionais, o blockchain utiliza uma rede descentralizada (ou distribuída) sem um servidor central, em que todos os participantes (computadores) da rede têm a mesma informação; para que novas informações sejam adicionadas, estas devem validadas por consenso da maioria da rede.

Entendida essa questão, vamos falar de outra característica do blockchain: os contratos inteligentes, que nada mais são que transações ou validações automáticas, realizadas de acordo com regras pré-definidas, então inclusas e validadas na cadeia de blocos distribuída. Daremos um exemplo a respeito um pouco mais à frente no texto.

Agora que entendemos em linhas gerais o que é blockchain, vamos às suas possibilidades no setor da saúde.

Blockchain na área da saúde

Atualmente, hospitais, laboratórios e consultórios médicos usam diferentes sistemas de prontuários eletrônicos. Os próprios pacientes já começam a usar carteiras digitais de saúde, quase todas centralizadas. Os sistemas atuais possuem segurança para acesso e compartilhamento dos dados, mas sendo modelos centralizados estão mais suscetíveis a adulteração e invasões, situações que têm se tornado cada vez mais frequentes no setor de saúde. O advento da lei geral de proteção de dados (LGPD) também exigiu maior segurança das informações de saúde, com responsabilização para indivíduos e empresas em eventuais falhas de segurança.

Sistemas em blockchain permitem soluções de prontuários médicos e carteiras digitais de saúde com nível muito mais elevado de segurança para acesso e compartilhamento dos dados médicos, garantindo registros de todas as operações de modo muito mais seguro e mais complexos de serem adulterados, pelo fato de serem totalmente descentralizados. Para hackear um dado médico armazenado em uma blockchain, não bastaria acessar um servidor central, pois as informações estão distribuídas de forma descentralizada na corrente. Eventuais manipulações erradas geram a invalidação das informações indevidas pelo restante da rede, garantindo segurança para a cadeia como um todo.

Um ganho colateral do uso de blockchain em prontuários médicos eletrônicos e carteiras digitais de saúde está relacionado à própria consciência de um sistema mais seguro, gerando mais confiança para compartilhamento dos dados, contribuindo para mais fluidez e eficiência do ecossistema de saúde e evitando exames e procedimentos desnecessários que poderiam ser solicitados por desconhecimento parcial ou total do histórico de saúde dos pacientes. Existem no mercado algumas empresas com soluções de saúde baseadas em blockchain, como por exemplo Patientory, Medibloc e Medicalchain. Vale a pena acompanhá-las, assim como outras nesse setor.

Comentamos sobre contratos inteligentes no início do texto. A lógica desta solução pode ser utilizada para automatizar a relação entre operadoras de saúde e prestadores de serviços, como hospitais e laboratórios. Como exemplo, pensem que um paciente com acesso a um plano de saúde queira utilizar um determinado hospital. Se a elegibilidade de uso estiver caracterizada em um contrato inteligente, esse processo pode ser totalmente automatizado, reduzindo custos de verificação humana da situação, evitando fraudes e gerando rapidez e agilidade na prestação do serviço. Tudo isso de forma segura, com baixíssimos riscos de adulteração do contrato, pela característica descentralizada do blockchain.

Essa automatização segura também pode ser bastante útil na cadeia de suprimentos da saúde. A indústria farmacêutica, por exemplo, precisa de altos níveis de monitoramento dos seus produtos e insumos, da produção ao consumidor final. Controles baseados em blockchain podem permitir esse acompanhamento e ter gatilhos automatizados de ponta a ponta, com rastreabilidade, otimizando custos e evitando desperdícios. Blockpharma e Chronicled são exemplos de empresas desenvolvendo soluções em cadeia de suprimentos baseadas em blockchain, que podem ajudar bastante a indústria farmacêutica.

Como em qualquer solução, há pontos de atenção que precisam ser resolvidos para a massificação de aplicações baseadas em blockchain. A experiência do usuário é um exemplo. Atualmente, a forma como as transações são feitas pode não ser muito amigável ou prática para a maior parte da população. Esse é um tema que pode e deve ser melhorado com a simplificação da interface de usuário, assim como com a contínua familiarização das pessoas com o tema. Quando os bancos começaram a pedir tokens para validar transações, muitos usuários estranharam ou reclamaram; hoje em dia, tal solução não só já está totalmente integrada à experiência do usuário como sua ausência pode gerar desconfiança no momento da transação.

Outro ponto de atenção a ser endereçado é o custo de transações feitas em blockchain, que pode inviabilizar determinadas operações. Tal questão pode ser resolvida com uso de tokens de segunda camada, que reduzem acentuadamente o custo transacional, com custos muito baixos frente aos benefícios gerados.

Em resumo, se você tiver que guardar os conceitos deste artigo em poucas palavras, lembre-se que blockchain permite um banco de dados descentralizado, garantindo confiabilidade e segurança, principalmente em conjunção com contratos automatizados. Por fim, há outras aplicações de blockchain em saúde que ainda não foram mapeadas ou mesmo pensadas. Como toda tecnologia recente, a amplitude de suas aplicações ainda não foi totalmente compreendida. Cabe aos primeiros empreendedores interessados em transformar positivamente o setor desenvolver e implementar novas soluções que permitam uma saúde de maior qualidade e menor custo para todos.

Artigo escrito em parceria com Giancarlo Domingues, médico radiologista, gestor médico de B2B e médico conselheiro para sistemas na DASA e cofundador da GrifoLabs – Health Innovation.

Gustavo Meirelles
É fundador, investidor e conselheiro de startups, principalmente na área da saúde. Médico radiologista, com especialização, doutorado e pós-doutorado no Brasil e no exterior. Tem experiência como executivo de grandes empresas de saúde, com MBA em gestão empresarial. Mais informações em: www.gustavomeirelles.com.

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