
Primeiro foram as startups. Então vieram os projetos de hardware e software. Agora as startups voltam a ser o foco de um dos principais centros de inovação do País, que as transforma em ativos estratégicos para o horizonte 3 de inovação
Se esta história que vou contar agora fosse um documentário, nossa cena de abertura teria como plano de fundo o início dos anos 2000, em meio ao fervor das inovações tecnológicas e experimentações ainda tímidas com os primeiros computadores e celulares. Lá atrás, além do trabalho do CESAR com tecnologia da informação, também se fortalecia a nossa missão de transformar problemas reais em soluções concretas, criando empresas a partir da inovação aplicada ao mercado.
No começo, nossa abordagem era clássica: criar startups a partir de desafios identificados em grandes organizações. A lógica era simples: se uma empresa tem um problema, provavelmente outras também têm. Se criarmos uma solução replicável, podemos transformá-la em um negócio independente, capaz de atender diversos clientes.
Foi assim que surgiram algumas iniciativas que prosperaram além do que imaginamos, como a Tempest, focada em cibersegurança, e a Neurotech, que atua com inteligência artificial e dados para avaliação de riscos no setor financeiro. Mas também outras que ficaram pelo caminho. O Meantime, por exemplo, nosso projeto de gamificação com a Motorola, tinha muito potencial, mas estava à frente do tempo – nosso mercado não era maduro o suficiente e tinha poucos investidores dispostos a oferecer um aporte capaz de fazer com que a solução resistisse mais tempo. Na época, o Brasil ainda não tinha uma estrutura consolidada de venture capital como no Vale do Silício.
Até que, em meio a esses horizontes incertos, aconteceu a chegada da Lei de Informática e, com ela, a estratégia do CESAR tomou outro rumo. Passamos a desenvolver o que hoje chamamos de soluções robustas com software e hardware e as iniciativas de startups ficaram em segundo plano por um bom tempo. Até que aconteceu um outro momento de inflexão na nossa história.
Startups são essenciais para movimentar a economia e desafiar empresas maduras, e nós como um hub de inovação precisamos contribuir significativamente para o ecossistema. Embora o empreendedorismo sempre tenha sido parte do DNA do CESAR, nossa abordagem precisava de mais estrutura e direção. Estávamos experimentando, testando caminhos, mas sem uma estratégia consolidada.
Foi nesse processo que entendemos: não bastava apenas acelerar startups, precisávamos construir um modelo mais sólido, que combinasse nossa expertise em tecnologia com um olhar estratégico para investimento e crescimento sustentável. Foi então que nos perguntamos: e se, em vez de apenas acelerar startups, nós nos tornássemos parte da construção delas?
Com o tech venture building, a lógica não foi mais a de apoiar startups do modo tradicional; passamos a criar negócios junto com os empreendedores, trocando tecnologia por participação
A partir dessa provocação, o conceito de “tech venture building” ganhou força. A lógica mudou. Em vez de apenas apoiar startups de maneira tradicional, como antes, começamos a criar negócios junto aos empreendedores, trocando tecnologia por participação. Além disso, já éramos aptos a captar recursos de fomento (como Embrapii) para financiar o desenvolvimento da tecnologia, garantindo que no momento do exit, o CESAR também capturasse o valor gerado. O match estava feito.
Os primeiros experimentos deram certo. Ajustamos o processo, eliminamos distrações e consolidamos um time dedicado ao modelo de Ventures. Começamos a promover ações de impulsionamento de startups, como eventos, workshops e mentorias. E, enquanto apoiávamos o ecossistema, também estávamos avaliando e selecionando startups de base tecnológica compatíveis com o nosso novo modelo de venture building.
O resultado? Nossas ações de impulsionamento já alcançaram mais de 1200 negócios e hoje temos um portfólio crescente de mais de 50 startups. Deste montante, 10 estão ativas e as demais já fizemos exits, com diversos casos de sucesso – assim como write-offs (retirada do portfólio após o período de cinco anos sem “rampar”). Além disso, lançamos o Dates, uma plataforma que utiliza IA para conexão entre negócios, investidores e empresas, com mais de 1500 startups cadastradas. Com nosso sistema de match ágil e preciso, ajudamos a conectar empreendimentos promissores com as melhores oportunidades de negócios.
O principal erro foi a falta de foco estratégico. No início, tentamos executar o modelo de aceleração clássica ao mesmo tempo que estávamos estruturando outros negócios do CESAR. Também não definimos, de forma clara, como iríamos atuar e contribuir para as startups, se seria por aceleração, investimento, consultoria, entre tantas outras abordagens.
Com o passar dos anos e um estudo mais aprofundado no cenário de ventures, suas necessidades, lacunas e objetivos, ficou evidente que precisávamos direcionar nossos esforços. Entendemos que não dava para ser tudo ao mesmo tempo—ou éramos uma aceleradora, ou nos tornávamos Venture Builders. Escolhemos a segunda opção. Foi um divisor de águas.
Outro aprendizado foi entender que venture building exige paciência. O ciclo de retorno é diferente do de uma consultoria ou serviço tradicional. O valor real aparece no longo prazo, conforme as startups crescem e chegam ao exit. Mas os primeiros sinais já mostram que a aposta foi acertada: no último ano, o CESAR Ventures gerou cerca de 3% da receita do CESAR, porém foi responsável por 19% do superávit da organização.
Um dos nossos maiores resultados se deu com o exit da Tallos, startup que impulsionamos, que ao ser comprada pela TOTVS, gerou um múltiplo de capital investido (MOIC) de 93x para o CESAR.
Se projetarmos o CESAR Ventures cinco anos à frente, a visão é clara: um portfólio robusto de startups, exits acontecendo regularmente, e um modelo cada vez mais refinado de criação de negócios de base tecnológica.
Nosso papel não é apenas melhorar processos existentes, mas criar empresas que desafiem o status quo
Porém o mais importante é o impacto que queremos gerar. Nosso papel não é apenas melhorar processos existentes, mas criar empresas que desafiem o status quo. Queremos atuar dentro do que McKinsey define como horizontes de inovação: navegar no chamado horizonte 3, aquele espaço onde surgem negócios que realmente causam ruptura. Mas, ao mesmo tempo, equilibramos isso com projetos de horizonte 2, que promovem inovação incremental e garantem um crescimento sustentável. É esse equilíbrio que torna um centro de inovação como o CESAR relevante no longo prazo.
Startups são o motor da inovação. Se uma economia sem novas empresas está fadada à estagnação, um ecossistema de inovação sem venture building perde a chance de gerar mudanças profundas. E é exatamente esse espaço que queremos ocupar. A jornada é incerta, mas os resultados compensam. E nós estamos apenas começando.