A análise dos dados do cliente online pode revelar que outros atributos são mais importantes do que a rapidez na entrega
A covid-19 mudou nossa forma de fazer compras. Logo após o início da pandemia, os varejistas relataram uma rápida migração das lojas físicas para as online. O e-commerce representou 18% das vendas no varejo em todo o mundo em 2020, ante cerca de 9% em 2018. No setor de alimentação, em maio de 2020, 41% das compras online de alimentos nos EUA foram feitas por usuários novos desses serviços. E a expectativa é que a mudança permaneça, na maioria dos subsetores de varejo.
Adaptar-se a essa mudança não é pouca coisa, e fazê-lo com lucro é ainda mais difícil. Em resposta à mudança no comportamento de compra do consumidor desde o início da pandemia, muitos executivos de varejo com quem trabalhamos estão repensando suas estratégias omnicanal. Nossas conversas com o diretor de e-commerce de um importante varejista de alimentos na Europa mostraram como é difícil mudar as operações para dar suporte ao comprador online. Alterar o local do estoque e decidir se deveria possuir ou terceirizar serviços de entrega eram algumas das preocupações desse diretor, visando a redução do tempo entre a colocação de um pedido online e seu recebimento pelo cliente. Mas tudo exigia investimentos.
Pedimos a esse diretor que questionasse sua crença de que a velocidade era o fator de entrega online mais importante. Não seria plausível que alguns clientes priorizassem a possibilidade de escolher o dia de entrega em vez da velocidade, e que outros pudessem estar dispostos a renunciar à rapidez em troca de uma janela de tempo mais precisa?
Para ter sucesso, esse diretor precisava saber mais sobre as preferências de seus clientes. Nossa pesquisa com varejistas que oferecem entregas domiciliares assistidas (em que o cliente está presente para receber suas mercadorias) sugere que focar apenas a velocidade pode fazer com que uma empresa ignore oportunidades de adquirir e reter clientes que preferem outros atributos de entrega.Na verdade, descobrimos que os clientes apresentam diferenças em sua disposição de pagar pela velocidade de entrega, precisão da entrega e escolha do dia de entrega. Assim, os varejistas que podem cumprir não apenas a promessa do produto, mas também os atributos de entrega mais importantes para os clientes, têm uma vantagem competitiva.
Os varejistas de hoje têm uma quantidade enorme de dados que podem gerar insights importantes sobre as preferências do cliente. Para avaliar como os clientes online avaliam esses atributos, analisamos as preferências deles em centenas de milhares de instâncias de compras online de uma rede de supermercados. Para cada instância, sabíamos o que o cliente pediu. Mais importante, sabíamos os intervalos de tempo de entrega em domicílio disponíveis que eram mostrados ao cliente e o intervalo de tempo selecionado pelo cliente.
Ao analisar as escolhas dos clientes, descobrimos que eles estão, em média, dispostos a esperar 10,8 horas a mais por uma entrega se o prazo for um horário uma hora mais cedo. E esperarão mais 7,5 horas se a entrega puder ser recebida em um dia preferido da semana. Os dados também mostraram que os clientes preferem receber pedidos na quinta ou sexta-feira, e não nos fins de semana.
A fidelidade do cliente e o tamanho da cesta também são fatores nas preferências de entrega dos clientes.Diferentes níveis de lealdade ao varejista significam diferentes preferências. Por exemplo, clientes recorrentes estão dispostos a pagar mais pelos mesmos atributos de entrega em comparação com outros compradores. Além disso, aqueles que fazem compras maiores estão dispostos a pagar o dobro da taxa de entrega para melhorar a precisão da janela de entrega em uma hora.
Essas descobertas provavelmente são aplicáveis a outros varejistas que oferecem serviço de entrega, como vendedores de móveis, de produtos domésticos e de outros bens duráveis. Assim, a abordagem que desenvolvemos para entender as preferências dos clientes é relevante para qualquer varejista que esteja repensando suas redes de distribuição.
Executar uma estratégia dedicada apenas à velocidade pode ser caro, principalmente para varejistas de alimentos, cujas margens são notoriamente pequenas. Os varejistas que competem em velocidade tendem a redesenhar suas redes para aproximar o estoque dos clientes. Isso envolve o uso de lojas como centros de atendimento ou a aquisição de espaço de armazenamento adicional mais próximo dos consumidores. Alguns investem em sistemas de separação automática para produzir os pedidos, enquanto outros expandem suas frotas para encurtar rotas e diminuir prazos de transporte. Por trás de cada uma dessas abordagens está a crença de que a velocidade de entrega gera valor.
Esses movimentos podem permitir que o varejista melhore sua precisão de entrega indiretamente e ofereça aos clientes mais opções. Mas existe uma opção menos custosa que vale considerar: analisar os dados operacionais sobre os padrões de entrega. Por exemplo, os varejistas podem melhorar seus recursos de roteamento, capturando e utilizando dados sobre os padrões de tráfego típicos ou rastreando os tempos de serviço nos pontos de entrega do cliente. Com base nessas análises, os varejistas podem oferecer janelas de tempo de entrega mais precisas.Os varejistas que usam fornecedores de logística terceirizados também podem revisar contratos e usar dados operacionais para negociar serviços de entrega que atendam melhor às necessidades dos clientes. Esses esforços são menos custosos do que os investimentos em estoque.
O compromisso com uma entrega rápida parecia particularmente importante durante os primeiros lockdowns de covid-19, quando os consumidores estavam em pânico. No entanto, muitos varejistas não conseguiram oferecer sequer um prazo de entrega de uma semana, muito menos a opção no mesmo dia. Essa experiência recente – com desafios acompanhados atentamente pela imprensa – resultou em ainda mais varejistas se concentrando na velocidade como atributo crucial. Advertimos os varejistas, no entanto, que esse foco na velocidade pode ser muito míope depois que a pandemia terminar, pois muitos consumidores estarão mais sintonizados com as compensações entre velocidade e disponibilidade para receber a entrega.
Temos quatro recomendações para o encarregado da estratégia omnicanal dos varejistas que realizam entregas:
1. Invista em infraestrutura de dados e análise. Isso inclui ferramentas que coletam e gerenciam dados sobre o comportamento do cliente. Também é essencial rastrear as compras em canais online e offline, o que, por sua vez, geralmente requer mudanças no gerenciamento de dados para dar às equipes acesso aos dados dos dois canais.2. Colete e analise dados de seleção de intervalo de tempo do cliente. Os varejistas que estão começando esse esforço podem se concentrar em análises descritivas básicas que destacam quais atributos os clientes preferem, em média, dadas as opções escolhidas pelos clientes no momento do checkout. Equipes mais avançadas podem implantar modelos de escolha discretos, como fizemos, para entender a disposição a pagar mais em segmentos de clientes e entre tipos de pedidos.3. Entenda quais atributos de entrega impulsionam a lealdade e trazem recorrência. Isso exige do varejista capacidade de análise preditiva. As questões de interesse incluem se diferentes segmentos de clientes preferem um atributo em vez de outro.4. Trabalhe entre as equipes para implementar novas estratégias de entrega. Para capitalizar sobre sua nova compreensão das preferências do cliente, as equipes de operações e marketing devem colaborar de perto. A equipe de operações pode projetar a estratégia de atendimento que melhor atenda às necessidades dos clientes. O marketing pode promover o serviço aprimorado e comunicar como ele difere das opções de entrega dos concorrentes.
Os varejistas precisam apoiar essa nova abordagem baseada em dados para tomada de decisões contratando as pessoas certas, o que inclui profissionais operacionais e de marketing que são analíticos e desenvolvem sistemas estratégicos.
As empresas fundadas como varejistas online, em nossa experiência, consideram isso mais fácil de executar do que os varejistas tradicionais, mas a mudança é possível. Varejistas bem-sucedidos tendem a ter um campeão analítico disposto a desenvolver a capacidade interna de construir a infraestrutura de coleta de dados e atrair outros talentos.Concentrar-se em atender às preferências de entrega pode ser o principal diferencial em um mercado muito competitivo. Com base em nossa pesquisa, encorajamos os varejistas a repensar suas operações para otimizar não apenas a velocidade, mas também a combinação mais adequada de velocidade, precisão e flexibilidade.
Pedro Amorim é professor assistente de engenharia industrial na Universidade do Porto e cofundador da LTPlabs. Nicole DeHoratius é professora adjunta de gestão de operações na Booth School of Business da University of Chicago.”