Somos bombardeados todo dia com enormes quantidades de dados e informações, nem todos verdadeiros. Isso tem sido a causa de muitos comportamentos destrutivos, que vão da inação à depressão. E esta situação não parece que vai melhorar!
Imagine um daqueles arquivos de aço de antigamente, com quatro gavetas. Cada gaveta tem uma etiqueta intitulada, de cima para baixo, “mistérios”, “fatos”, “números” e “dados”.
– “Mistérios” poderia se chamar “só Deus sabe”. Esta é a gaveta mais perto do céu. Houve uma época em que esta gaveta ficava lotada com temas do tipo “por que existem estrelas?” e “primeiros indícios de v”ida, mas nos últimos séculos boa parte de seu conteúdo desceu para a gaveta logo abaixo.- “Fatos” contém tudo que pode ser provado cientificamente e/ou provém de fonte fidedigna.- “Números” contém tudo que pode ser contado ou medido, desde o século 18: censos, estatísticas etc. Inclui coisas com finalidades além das intenções originais das de quem os agregou, como transações anonimizadas com cartões de crédito.- “Dados”, que são números com contexto, incluem conhecimento que no geral é penoso para nós humanos acessar diretamente. Melhor pedir para um computador, idealmente para uma inteligência artificial (IA). Esta gaveta estava quase vazia até meados do século passado, mas hoje está tão lotada que é difícil de abrir.
Esta classificação foi “roubartilhada” do artigo publicado no The New Yorker, “The data delusion”, de Jill Lepore, professora de história em Harvard e também staff writer (não sei como se escreve este título em português mas asseguro que soaria bem menos chique) da revista The New Yorker, cuja leitura recomendo, por transcender de muito o escopo desta minha coluna.
Hoje eu quero focalizar a quarta gaveta: dados. Nas empresas, usamos dados para três finalidades diferentes:
1. Queremos gerar evidências para instruir uma decisão que ainda não tomamos.2. Queremos convencer alguém (normalmente “alguéns”) a apoiar nossa solução.3. Queremos mudar a direção estratégica da empresa, o que necessariamente inclui uma cirurgia cultural nela.
Saber selecionar a informação relevante no meio desta verdadeira pororoca que encaramos todos os dias pode ser uma tarefa bem complexa. E delegar partes dela a colegas e subordinados pode também ser difícil, porque, muitas vezes, a) ainda não definimos o tema dentro de nossa própria cabeça o suficiente para verbalizá-lo para terceiros, e b) a própria análise dos dados muitas vezes aperfeiçoa nosso ponto de vista.
Conversando com executivos que fazem isso muito bem, descobri que eles próprios às vezes têm dificuldade em expressar por quais caminhos mentais isso se dá. A resposta mais frequente foi uma referência a algum chefe que tiveram no início de suas carreiras, que gostava muito de desenvolver seus subordinados.
Se você é recém-chegado ao tema, recomendo o clássico A arte de fazer acontecer, de David Allen e Brandon Hall. Não se deixe enganar por – à primeira vista – não parecer que lida com dados! Pelo contrário: explica direitinho onde e quando os dados entram no processo.
Para os mais avançados, minha referência favorita é How to take smart notes, por Söhnke Ahrens, com tradução para o português prometida para muito breve (conforme ele mesmo informa no site dele). Embora lide com outro tópico – como preparar-se para escrever um artigo técnico – é uma referência espetacular para todo mundo que precisa lastrear suas decisões em dados.
O mais comum é termos algumas horas/dias para fazer o acima, mas existem situações em que um executivo precisa tomar decisões difíceis em poucos segundos. Aí os dados vão para o banco de trás e entra em cena o livro Rápido e devagar, de Danny Kahnemann, que já mencionei aqui.
E se você, como muitos outros executivos, se pergunta quase todos os dias: “Se todo mundo parece tão ocupado, por que a gente tem tanta dificuldade em finalizar as coisas?”. Encerro com este artigo delicioso da McKinsey.”