Nos últimos anos, o relatório ESG (sigla em inglês para meio ambiente, social e governança) tem sido uma ferramenta crucial para avaliar o desempenho sustentável das organizações. E, à medida que a consciência global sobre a mudança climática, as desigualdades sociais e as questões de governança corporativa cresce, as empresas são pressionadas a divulgar suas práticas de ESG de forma transparente.
Apesar da crescente ênfase no relatório ESG, sua eficácia e aplicação estratégica muitas vezes falham. O maior benefício desse documento é a integração dos aspectos relacionados à sustentabilidade à tomada de decisão para melhorar a gestão de riscos e contribuir para a criação de valor em longo prazo.
No entanto, a realidade é que muitas empresas enfrentam dificuldades com normas inconsistentes, questões críticas relacionadas à qualidade dos dados e até o risco de greenwashing (quando se exageram ou deturpam os esforços ESG).
Este artigo, escrito em co-autoria com Liliana Domingues, CEO da AMARNA Vida – empresa especializada no tema –, discute a lacuna entre os insights dos indicadores do relatório ESG e seu alinhamento com as estratégias das organizações.
Perceção das empresas sobre regulamentos e normas ESG
Muitas empresas enfrentam desafios na coleta de dados, na integração de ESG nas estratégias de negócios e na garantia de conformidade em suas operações. Uma pesquisa da PwC revela que 94% dos investidores acreditam que os relatórios de sustentabilidade atuais frequentemente carecem de evidências sólidas. Isso indica uma lacuna entre conformidade e desempenho real em sustentabilidade, destacando a necessidade de relatórios mais consistentes e transparentes.
Enquanto as empresas estão cada vez mais focadas em sustentabilidade para atender às regulamentações e às expectativas dos stakeholders, elas ainda enfrentam dificuldades com a precisão dos dados, a elaboração de relatórios abrangentes e a integração de ESG em suas estratégias principais.
Organizações que integram práticas sustentáveis em sua estratégia estão melhor posicionadas para enfrentar desafios e aproveitar oportunidades de mercado em longo prazo. No entanto, há uma lacuna significativa entre os compromissos ESG e a estratégia corporativa.
Embora muitas empresas façam relatórios sobre dados ESG, apenas cerca de 45% consideram essencial melhorar a gestão desses dados para alinhar os objetivos de sustentabilidade com os de negócios.
Estudos mostram que, embora os investimentos em sustentabilidade estejam crescendo, muitas organizações enfrentam dificuldades devido a silos internos, falta de recursos e prioridades conflitantes. Além disso, frequentemente tratam iniciativas ESG como simples conformidade em vez de usá-las como motores de inovação e crescimento.
Desafios na integração de relatórios ESG na estratégia
Embora a integração de relatórios ESG à estratégia de negócios seja essencial para o crescimento sustentável e o sucesso em longo prazo, CEOs ainda enfrentam diversos desafios:
Alinhamento estratégico: pesquisa da McKinsey revelou que apenas 13% dos executivos se sentem bem-sucedidos na integração de objetivos ESG com a estratégia de negócios.
Dados e mensuração: coletar e medir dados de ESG com precisão é desafiador; métricas inconsistentes dificultam o acompanhamento e o benchmarking eficazes.
Expectativas dos stakeholders: empresas enfrentam pressão para fornecer informações detalhadas de ESG e navegar por diferentes regulamentações regionais.
Engajamento organizacional: a integração eficaz de ESG requer envolvimento em todos os níveis organizacionais; uma gestão de risco abrangente e inovação são necessárias para aproveitar as oportunidades de ESG.
Transparência e responsabilidade: construir confiança por meio de relatórios ESG transparentes é crucial; governança robusta e validação externa são importantes para a responsabilidade.
Cultura de sustentabilidade: o comprometimento da alta liderança e o alinhamento com a governança corporativa são vitais para fomentar uma cultura de sustentabilidade.
Melhores práticas para fazer essa integração
Adotar melhores práticas ajuda a empresa a superar obstáculos na integração e traz benefícios significativos. Algumas das práticas recomendadas são:
Escolher regulamentações relevantes: usar normas amplamente aceitas e que se ajustem ao setor da empresa e às exigências regulatórias.
Investir em gestão de dados: implementar sistemas robustos para coletar e analisar dados ESG com precisão e eficiência.
Desenvolver competências internas: criar programas de treinamento e equipes dedicadas para fortalecer a capacidade interna em relatórios ESG e sustentabilidade.
Melhorar a transparência: publicar relatórios ESG claros e envolventes para comunicar o progresso e os desafios de forma transparente..
Implementar verificação: auditorias e certificações de terceiros para garantir a precisão dos dados ESG e fortalecer a credibilidade.
Foco na melhoria contínua: Atualizar constantemente as práticas ESG com base em feedback, mudanças regulatórias e inovações.
Seguir essas práticas ajuda a integrar relatórios ESG nas estratégias empresariais, melhora a transparência, constrói confiança e promove a criação de valor sustentável a longo prazo.
Os relatórios ESG não tratam apenas de conformidade; trata-se de liderança e de promover mudanças significativas. Incorporamos métricas de sustentabilidade em nossa compensação executiva para alinhar os incentivos com os objetivos de longo prazo de ESG.
Anne Richards, CEO da Fidelity International
No entanto, o obstáculo crítico para incorporar a sustentabilidade na cultura corporativa e nas estruturas de governança para alcançar um alinhamento estratégico em longo prazo é o forte compromisso das lideranças com os princípios ESG.
Apenas líderes comprometidos e conscientes podem conduzir a organização para a integração da sustentabilidade nas estruturas de governança corporativa e nos sistemas de gestão de desempenho.
Dez passos para aproximar dados ESG da estratégia
Quais são, portanto, os passos orientadores para minimizar a lacuna entre os dados dos relatórios ESG e a estratégia corporativa?
Estabelecer visão e compromisso claros
Definir metas ESG claras, ambiciosas e alcançáveis, alinhadas com a missão e valores da empresa.
Comunicar claramente o compromisso com ESG a todos os stakeholders, incluindo colaboradores, investidores, clientes e fornecedores.
Definir metas ESG mensuráveis e KPIs
Estabelecer metas ESG e KPIs específicos, mensuráveis, alcançáveis, relevantes e com prazos definidos (SMART).
Monitorar e acompanhar regularmente o progresso em relação às metas ESG usando sistemas robustos de coleta e relatórios de dados.
Integrar ESG na estratégia empresarial
Assegurar que as metas ESG estão integradas na estratégia empresarial, influenciando processos de tomada de decisão e planejamento estratégico.
Envolver o conselho de administração em discussões e decisões relacionadas a ESG para garantir apoio e supervisão ao mais alto nível.
Desenvolver estruturas de governança robustas
Estabelecer um comitê ou equipe de ESG responsável por supervisionar essas iniciativas e garantir o alinhamento com a estratégia corporativa.
Designar funções e responsabilidades específicas para as iniciativas ESG em toda a organização, desde a liderança executiva até as equipes operacionais.
Implementar programas e procedimentos abrangentes
Criar programas e procedimentos abrangentes alinhados aos sistemas de informação operacionais para apoiar uma tomada de decisão baseada em dados, que aborde áreas-chave de ESG integradas às principais áreas funcionais e operações diárias, relacionadas a processos de compra, gestão da cadeia de fornecimento e avaliação de riscos.
Melhorar relatórios e transparência
Investir em sistemas e tecnologias para melhorar a precisão, a confiabilidade e a consistência dos dados ESG.
Envolver stakeholders
Envolver regularmente os stakeholders para entender as suas expectativas ESG e incorporar o seu feedback nas estratégias ESG.
Fornecer atualizações transparentes e regulares sobre desempenho ESG, desafios e conquistas por meio de relatórios de sustentabilidade, websites e outros canais de comunicação.
Fomentar uma cultura de colaboração e inovação
Inspirar e envolver os colaboradores em todos os níveis sobre a importância de ESG e o seu papel para alcançar essas metas.
Incorporar o desempenho ESG na compensação executiva e nas avaliações de desempenho dos funcionários para alinhar incentivos com as metas ESG.
Aproveitar tecnologia e inovação
Utilizar análises avançadas e inteligência artificial para obter insights sobre o desempenho ESG e identificar áreas para melhoria.
Incentivar a inovação em produtos, serviços e processos que apoiem os objetivos ESG.
Colaborar e fazer parcerias
Colaborar com pares do setor, ONGs e organismos governamentais para abordar desafios ESG comuns e desenvolver melhores práticas.
Envolver-se com comunidades locais para entender as suas necessidades e contribuir para o seu desenvolvimento com iniciativas ESG.
Em resumo, o verdadeiro valor dos relatórios de ESG é tornar a sustentabilidade uma parte central da estratégia de negócios. Isso não só reduz as lacunas nos relatórios de ESG mas também ajuda as empresas a ter sucesso e a contribuir para uma economia global mais sustentável.
Luís Rasquilha
CEO da Inova TrendsInnovation Ecosystem e professor da Fundação Dom Cabral (FDC), Hospital Albert Einstein e Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz da Universidade de São Paulo (Esalq-USP).
