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SXSW2025 12 min de leitura

Entre o bem, o mal e a ilusão do saber empacotado

Destrinchando comportamentos sintomáticos em relação ao SXSW 2025 – com linguagem pop, mas em profundidade

Paulo Emediato
Entre o bem, o mal e a ilusão do saber empacotado
Este conteúdo pertence à editoria Estratégia e inovação Ver mais conteúdos
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Antes de qualquer coisa, existe um desafio brutal ao enfrentar a maratona do SXSW, sobretudo se você tiver a pretensão de produzir algum conteúdo a respeito da experiência e dos aprendizados por lá: timing. Praticamente tudo já foi dito, comentado, esmiuçado e criticado quase instantaneamente. Por isso, nem tenho a pretensão de escrever review factual. É surreal a velocidade da produção de conteúdo sobre o festival e talvez aqui venha uma primeira crítica: Será que dá tempo de processar o que é vivido, aprendido, experimentado instantaneamente para publicar antes do tema se esgotar?

Gostei muito do que foi escrito pela Ju Wallauer:

    “Nesse mundo atual, cheio de cursos e palestras, muita gente ainda tem a expectativa de uma transferência passiva de conteúdo e de saber. Mas a sabedoria, como sabemos, não vem empacotada, e sim da nossa própria atitude de ir atrás, estudar, fuçar, usar, refletir.”

Peraí, gente! Tempo é fundamental para elaborar e aprofundar um volume tão grande de informações, e nessa corrida precipitada de “cobertura” do evento, já me sinto ultrapassado e olha que cheguei em casa há menos de uma semana.

Palestras são apenas uma degustação, uma faísca. Gostou? Leia o livro, entenda a pesquisa. Mas espera, se fizer isso, não vai dar tempo, porque a pauta já mudou e a informação ficou velha. E assim ficamos ainda mais ansioso e exaustos.

Nessa dinâmica, cheguei a ver casos de pessoas produzindo conteúdo sobre palestras que nem assistiram. No pior exemplo da lógica: posto, logo existo – e sabemos que essa abordagem não costuma se sustentar em longo prazo.

Só isso já diz muito sobre nossa maneira de consumir informações, aprender e formar opiniões. E é a partir daqui que falarei sobre a semana em Austin.

O “MAIOR DO MUNDO” – MAS SÓ NO BRASIL

O South by Southwest já foi mais relevante nos Estados Unidos, mas nunca teve a vocação mainstream. Ele nasceu com um espírito independente, misturando cultura, tecnologia e música de um jeito único no centro da capital texana.

Fatos muito relevantes da história cultural e tecnológica recente passaram por ali, mas o evento nunca foi o mais importante dos Estados Unidos, muito menos do mundo.

Hoje em dia, seria impossível fazer “o maior evento de inovação do mundo” sem a presença chinesa

Hoje em dia, seria impossível fazer “o maior evento de inovação do mundo” sem a presença chinesa, extremamente relevante na produção tecnológica e intelectual. No entanto, todos os veículos e chamadas brasileiras insistem em reforçar: SXSW, o maior evento de inovação e tecnologia do mundo. Foi mal, gente, não é. É ótimo,mas não é o maior, nem o mais relevante. Precisamos parar com essa mania. Assino quase 300 newsletters sobre negócios, inovação e criatividade de inúmeros lugares do mundo. Uma boa parte contempla os principais veículos americanos. A maior parte deles nem menciona o festival. Até vi notas tímidas aqui e ali, na maioria das vezes referentes a algum lançamento de série de TV, cinema ou atração musical. Mas não, o pensamento de negócios americano e global não é influenciado pelo que acontece no SXSW como acontece no Brasil.

Praticamente todos os veículos brasileiros fizeram algum tipo de cobertura e alguns fizeram um trabalho brilhante, mas a onipresença do tema é muito mais efeito de uma câmara de eco ao nosso redor do que de relevância global verdadeira. Falo isso já há algum tempo e a cada edição que passa, as evidências ficam mais fortes.

Nada disso destrói o valor do que é visto por lá, muito menos para quem está lá, mas é um fato.

ENTRE O PENSAMENTO CRÍTICO E A IDOLATRIA

Sou fã da experiência no South by Southwest. Acompanho o festival pelo interesse musical, desde muito antes de entrar no mundo dos negócios. Com todas as críticas, a experiência por lá continua incrível — a mistura de criatividade, negócios, tecnologia, música e cinema segue única, mesmo que já não seja “a mesma coisa”. Nunca será. 

Adoro descobrir e encontrar pessoas, trocar ideias e reencontrar conhecidos. Talvez esse seja um dos principais ativos do evento. Isso posto, me preocupa a relação passional de parte do público com o SXSW. Por melhor ou pior que seja, é apenas mais um evento. Me assusta o quanto as pessoas levam críticas ao festival para o lado pessoal e se sentem ofendidas individualmente. De repente, no Brasil, avaliar criticamente o SXSW é uma ofensa tão grave quanto xingar a mãe do coleguinha. É importante lembrar que não estamos aqui para arbitrar a qualidade da experiência de ninguém e que existe um conflito de interesses em parte significativa dos participantes, sobretudo os que possuem algum tipo de modelo de negócios atrelado ao acontecimento.

Muita gente desenha produtos, serviços e jornadas que precisam se vender ou fazem da ocasião um famoso “pesque e pague” de leads e conversão comercial. Outros patrocinam ações ou precisam justificar o investimento feito por suas corporações. Há também as pessoas que estão se aprofundando em muitos dos temas pela primeira vez e sabemos que a descoberta sempre proporciona outro tipo de impacto. O sistema imunológico responde mesmo, é natural, mas desconfio dos elogios rasgados e desproporcionais.

Curiosamente, foi raríssimo encontrar alguém que tenha amado incondicionalmente a edição de 2025, sem nenhuma agenda particular diretamente atrelada a essa opinião. Pelo contrário: ouvi muitas críticas de amigos que sentiram falta de conteúdo impactante, mas que publicamente postavam o contrário. Afinal, mesmo quando é ruim, é bom.

Convenhamos, se o pensamento crítico é a chave para a inovação e um elemento fundamental da criatividade, como podemos assumir uma postura de idolatria tão convertida? Rola uma espécie de ingenuidade tecnológica ao analisar as ideias apresentadas ao longo das centenas de palestras. Mas lembrem-se: estamos enrascados politicamente justamente por acreditar, nas últimas duas décadas, que redes sociais, gig economy e outras tendências tecnocráticas nos prometiam um mundo melhor. Fico com a sensação de Déjà-FU (quando a gente sabe que vai se ferrar de novo). E lembremos: pensamento de manada e a ausência da reflexão crítica são os maiores inibidores de inovação que existem.

NETWORKING OU NECKWORKING?

Essa sensação de leilão 24 horas, onde estamos todos vendendo e comprando algo, também é geradora de estresse. O networking se transformou em “neckworking”, onde as pessoas parecem estar num rodízio humano, precisando extrair o melhor de cada oportunidade. Não me leve a mal, entendo perfeitamente as motivações e acredito muito na intencionalidade dos contatos. Mas existe um limite que no SXSW é frequentemente extrapolado. Independente disso, ótimas conexões e negócios nascem ali.

Nunca voltei do SXSW sem ter pelo menos 2 ou 3 contatos novos muito relevantes na minha vida ou carreira. E geralmente eles vêm dos momentos em que desligamos o “modo profissional” e somos guiados pela serendipidade, no lugar de situações forçadas.

DESVIANDO O OLHAR

A realidade política norte-americana, as tensões geopolíticas globais e o grau de incerteza que vivemos nos proporcionaram uma programação quase escapista.

É como se, ao invés de nos aprofundarmos nos principais problemas que o mundo vive, que nos dividem e amedrontam, o festival tivesse optado por desviar o foco para temas ou abordagens mais amenas, menos diretas. Muitas delas, optando por tratar os sintomas, já que chegar até as causas dá infinitamente mais trabalho.

Isso ficou evidente já na abertura, com a referência feita pelo próprio líder do SXSW ao “elefante na sala”. Haja psicodélicos e social health para nos salvar da enrascada em que estamos, não é mesmo?

PLEASE UNSUBSCRIBE

Vejo muito valor em palestras menores, em salinhas paralelas, sem fila, com insights que ficam comigo por anos. Em 2025, não foi diferente.

A melhor apresentação a que assisti foi “Please Unsubscribe, Thanks.”, de Julio Vincent Gambuto:

    A cultura do “sim” nos transformou em zumbis da produtividade, presos num loop infinito de otimização e validação.

   A cultura do “sim” nos transformou em zumbis da produtividade, presos num loop infinito de otimização e validação

O futuro promissor da tecnologia virou exaustão crônica—sempre clicando, sempre correndo, sempre sem tempo para sentir. E se o maior ato de resistência for simplesmente parar?

Dizer “não, obrigado” à pressão de estar sempre disponível, ao ritmo insano da inovação, à falsa sensação de controle. Talvez a verdadeira revolução agora seja outra: desacelerar. De alguma forma, é quase uma metáfora sobre a sensação de sobrecarga do próprio evento.

TENSIONANDO O DEBATE

Outro aspecto que me encantou em alguns painéis foi a tensão na interação menos programada. Quando Malcolm Gladwell e Brené Brown desafiam suas respectivas perspectivas, a conversa fica muito mais interessante. Quando Esther Perel e Amy Webb trocam farpas, também. Não sei vocês, mas não creio que precisamos de mais uma palestra que deveria ser um press-release – ou seria um press-release em forma de palestra?

Tenho a sensação de que a curadoria do festival tem mais medo de errar do que vontade de arriscar. Os nomes de peso se repetem. Palestrantes de estimação ocupam o palco e abrem pouco espaço para o novo. Falta apetite para formatos e abordagens. Mas compreendo perfeitamente os desafios de sustentabilidade econômica de um evento dessa magnitude.

TUDO ISSO PARA DIZER QUE…

Este artigo passa longe de um review sobre o South by Southwest. Talvez fale um pouco mais sobre o comportamento das pesssoas e sobre a falta de coragem e inovação de um evento icônico, preso entre preservar o legado e arriscar o novo. Dilema da inovação, como diria o professor Clayton Christensen, certo? Precisamos de mais debates ambíguos. De vivências e opiniões que podem estar certas e erradas ao mesmo tempo, de mais flexibilidade e menos certeza. Você não precisa ir ao SXSW para ter acesso ao conteúdo e isso democratiza parte dos aprenndizados, mas ainda não consegue suprir o valor da experiência. Duvido muito que 2025 fique marcada como uma das melhores edições, tampouco acredito que não haja espaço para renovação, pelo contrário, é justamente aqui que surgem as melhores oportunidades.

Volto com a bagagem cheia de conteúdo que ainda nem consegui processar e com o saldo positivo, só não sei se repetiria a dose em 2026, a não ser por um compromisso corporativo patrocinado – o que passa longe de dizer que não gostei ou que não vale a pena.

O SXSW me lembra o filme Adaptação (2002) – nasceu como uma força disruptiva, um refúgio para o underground, onde inovação, cultura e tecnologia colidiam de forma autêntica. Mas, ao longo dos anos, sua busca por relevância o levou a abraçar cada vez mais o mainstream, atraindo gigantes corporativos e estrelas de Hollywood, tornando-se um palco onde a rebeldia agora precisa seguir roteiro. Assim como Kaufman no filme, o festival enfrenta o dilema entre preservar sua essência ou se render às regras do grande espetáculo. A pergunta que fica: até que ponto a adaptação é evolução e quando se torna traição?

INDICAÇÕES DE LEITURAS ADICIONAIS DO COLUNISTA
O que o SxSW ainda tem a oferecer?
SXSW já deu?
Um bom post de LinkedIn
Outro bom post de LinkedIn
Cobertura 1
Cobertura 2
Cobertura 3

Paulo Emediato
Paulo Emediato trabalha com inovação em diversos contextos e organizações desde 2011. Atualmente é o CMO da Oxygea, um fundo de corporate venture capital e venture building, no qual lidera relacionamentos com o ecossistema focados em sustentabilidade e transformação digital na indústria. Como managing partner da DesignThinkers Group no Brasil, liderou projetos em mais de 100 clientes. Foi empreendedor no setor de educação e atua como professor de inovação e negócios na Miami Ad School e PUC Minas.

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