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Não deixe de incluir a IA no planejamento anual 2024

Reflexões e insights para apoiar as discussões acerca da inteligência artificial e como desenhar o seu plano estratégico com a tecnologia. O primeiro passo é ter a consciência da relevância da IA como um avanço tecnológico de igual ou maior magnitude que a internet

Rodrigo Helcer
12 de julho de 2024
Não deixe de incluir a IA no planejamento anual 2024
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Já está na hora de planejar 2024 e, em meio aos temas e questionamentos que surgem nos boards, o tema “inteligência artificial” (IA) é unânime. Com o assunto já escalado, começam as dúvidas: quão familiarizados estamos como companhia com o novo toolset de IA generativa? Conhecemos os casos de sucesso e principais experimentos já existentes em nosso setor? Podemos nos inspirar em casos de uso de outros segmentos? Quais alavancas de geração de valor poderíamos implementar em nosso negócio? Temos capacidade (interna ou via parceiros externos) para extrair valor desses novos recursos tecnológicos?

Pensando em contribuir com esse momento importante de planos e priorizações, quero compartilhar algumas dicas e reflexões com base na minha experiência como empreendedor na área de IA desde 2014. Para começar, vale dividir o estado atual de inteligência artificial das promessas ainda experimentais. IA não é novidade. A novidade é IA generativa.

A IA impactará nosso contexto pessoal e profissional como a eletricidade fez no passado – são muitas frentes e casos de uso possíveis. A IA para fins de negócio (ainda) não é uma superinteligência com poderes de decisões estratégicas com total autonomia – está sendo treinada por nós e pelas empresas em máquinas poderosas, com supervisão humana. O que a IA generativa trouxe foi um importante “wake-up call”, principalmente pela capacidade criativa desta nova geração de IA e pelo fato de democratizar a tecnologia para não técnicos, de buscar e sintetizar conhecimento e de automatizar algumas tarefas até então exclusivas de trabalhadores do conhecimento, como consultores, advogados, analistas e data scientists.

A “antiga IA”, se assim podemos chamar, já tem um bom track record de sucesso pelos últimos cinco anos: sistemas de recomendação para e-commerce, modelos sofisticados de forecasting de demanda, automações em agro e fábricas, modelos de avaliação de crédito e melhores ofertas para o cliente, entre tantos outros exemplos que eu poderia trazer aqui. A depender do caso de uso, pode ser que você já esteja atrasado, mas que isso não seja motivo de ansiedade e sim de entusiasmo em direção às melhorias que as novas tecnologias oferecem.

Sobre a “nova IA”, a inteligência artificial generativa, já falamos bastante nos artigos anteriores aqui na coluna, por isso, vou focar agora em sugestões do que você pode ter em mente sobre IA ao começar a planejar o próximo ano.

Por que falar de IA em seu planejamento de 2024?

O motivo está nos ganhos de eficiência e redução de custos que já são conhecidos e comprovados. Em carta recente, o empresário e CEO do banco J.P. Morgan, Jamie Dimon, disse aos seus acionistas: “a importância da implementação de novas tecnologias não pode ser exagerada. Já temos mais de 300 casos de uso de IA em produção atualmente para risco, prospecção, marketing, experiência do cliente e prevenção de fraudes e a IA é executada em nossos sistemas de processamento de pagamentos e movimentação de dinheiro em todo o mundo. A IA já agregou valor significativo à nossa empresa. Nos últimos anos, por exemplo, ela ajudou a diminuir significativamente o risco no nosso negócio, reduzindo fraudes. Além disso, melhorou a otimização comercial e a construção de carteiras, ao fornecer estratégias de execução, automatizando previsões e análises, e melhorando a inteligência do cliente”.

Outro bom exemplo de execução da IA foi visto por um recente estudo elaborado pelos pesquisadores Fabrizio Dell’Acqua et al*, 2023. A pesquisa indicou que o uso da IA resultou em 12,2% mais tarefas realizadas em média e 25,1% de forma mais rápida, mas também houve a melhoria na qualidade com uma média superior a 40%.

Mas onde mirar na adoção da IA?

Mesmo com toda a otimização que ela provoca, a IA dificilmente substitui funções completas. Substitui tarefas, o que sugere um formato de trabalho híbrido entre o homem e a IA. Centauro, como alguns dizem, ou “human in the loop”.

A lista de tarefas que podem passar a ser feitas com IA é extensa. Vou listar brevemente alguns exemplos:

1. Pode-se buscar e sintetizar informação (para pesquisas, respostas a FAQ, feedback de clientes e colaboradores).2. Geração de conteúdos (contratos, anúncios, comunicados, atendimentos e propostas).3. Revisão de conteúdos (testar códigos e apontar inconsistências em documentos e contratos).4. Identificar objetos e pessoas para automação de processos e data analytics (diversas aplicações no setor agro – combinação de drones, sensores, satélites, câmeras e IA; aplicações em smart cities – análise do trânsito, em segurança e surveillance (identificação de criminosos e fraudes); sport analytics (ampliando a experiência do espectador e o conhecimento de dados dos técnicos); no varejo – com a melhoria de processos identificando ruptura de gôndolas, permitindo auto-check out e analisando desvios de processos que possam levar a fraudes.5. Projetar resultados com base em modelos cada vez mais robustos e sofisticados, que combinam uma série vasta de data points para prever ou recomendar ações de compra e venda, desde qual produto impulsionar com a mídia para alcançar um maior resultado até qual localização escolher para o novo ponto de venda. É possível, por exemplo, mapear qual filme selecionar para a programação do cinema com maior potencial de sucesso de bilheteria, qual produto financeiro indicar para upsell/cross sell, qual cliente dar mais atenção com probabilidade de churn e impactos financeiros de relações públicas.

Como melhorar a aplicação da IA?

Aqui, tenho três principais orientações:

1) Conhecer minimamente o toolbox de IA disponível, experimentos em curso e casos de sucesso no seu setor de atuação, além de saber quais recursos essa tecnologia traz. O que é um large language model (LLM) e quais os principais recursos e casos de sucesso na minha arena competitiva? O mesmo vale para a visão computacional, áudio, robótica e modelos preditivos. Revistas, cursos, palestras e experts tem produzido muito conteúdo nessa direção.

2) Você e seu time precisam estar sempre atualizados sobre as novidades – é um assunto dinâmico que tem apresentado inovações a cada semana – por conta própria, ou investindo em time próprio ou de parceiros para cortar caminho para você nessa atualização. Por exemplo, advisors, consultores e pesquisadores acadêmicos podem ajudar. Nossa querida MIT Sloan Management Review Brasil idem.

3) Perseguir o que gera valor e encontrar no toolset de IA uma nova solução para problemas antes não resolvidos. Costumo brincar com novos engenheiros da minha equipe que ninguém compra Red Bull por causa da taurina. Ela é o principal ingrediente, mas o motivo da compra é o efeito da substância, concorda? Em nos deixar mais despertos e menos cansados. O mesmo ocorre com a Neosaldina: você compra pela dipirona e cafeína ou por que alivia a dor de cabeça? É fundamental conhecer minimamente o novo toolset de IA à nossa disposição (as taurinas e dipironas do seu setor), mas planejar com base no potencial de geração de valor para o seu negócio. Um estudo da Accenture reforça esse ponto. Entrevistaram 970 executivos mundo afora e o levantamento indicou que 73% dos negócios não estão endereçando o problema real dos seus consumidores. Na contramão, estão procurando soluções sem primeiro questionar o que precisa ser solucionado.

O consagrado Andreessen Horowitz (ou A16Z), empresa de venture capital do Vale do Silício, também divulgou uma pesquisa analisando os 50 aplicativos de IA com maior tráfego para seu site. Entre as descobertas: 80% desses apps não existiam 12 meses antes e apesar de 15% ter levantado até 15 milhões de dólares de investimento, outros 48% cresceram ‘bootstrapped’, com capital próprio, sem investimento externo. Nas palavras traduzidas do A16Z: “isso sugere que é possível lançar um grande produto de IA rapidamente e com relativamente pouco capital”. Nas oito empresas que empreendi, aprendi que o conceito MVP (mínimo produto viável, na tradução) tem seu valor real, principalmente em AI software development.

E, sobre o envolvimento dos times nas soluções de IA, sugiro envolver as áreas de maior impacto dos novos recursos de IA generativa, como customers care, marketing, vendas e inteligência de mercado.

O impacto da aplicação de IA

Temos alguns pontos importantes a mensurar no posicionamento das iniciativas, como data access e data quality. O valor de IA na grande maioria dos casos vem com aplicação sobre uma boa base de dados. Sua base tem qualidade e está preparada para o formato adequado de ingestão pela IA? Você tem acesso aos dados que precisa ou é necessário investir em uma frente de captura de dados (1st, 2nd, 3rd party data)? Se a resposta for “não” para uma dessas perguntas, sugiro incluir o tema “estratégia de dados” ao lado, ou logo antes, do tópico “IA” em seu plano para 2024.

Se você for parte de um player incumbente é bom considerar IA nas alternativas de “make, buy or ally”, ou seja, “construir, comprar ou terceirizar”, o mercado de startups. Seja por meio de um corporate venture capital, por aproximação a VCs ou através do seu time de marketing, se você estiver no board de uma empresa incumbente a preocupação em mapear as tech startups relevantes do mercado deve ser redobrada.

Como medir sucesso?

Mais que responder de forma ampla a todas formas de mensuração, deixarei uma única dica do que já vi passar despercebido em muitas empresas. Se você fosse listar métricas para avaliar o desempenho de um projeto de AI, quais listaria? Eu sugiro uma: adoção e uso. Seja para medir o sucesso de um time de produto ou mesmo para avaliar uma empresa no mercado de ações, esse é um dos KPIs. Para o papo com engenheiros de software e gestores de produto: existe produto bom sem adoção? Existe código bem feito sem uso? Antes de avaliar a receita (que muitas vezes demora para vir, até propositalmente em alguns casos, como no surgimento das redes sociais e mobile apps), vem a análise de adoção.

De outra perspectiva, adoção também é métrica chave para analisarmos IA no mercado de empresas privadas e listadas na bolsa. E aqui resgato o que o venture capitalist Vinod Khosla já compartilhou antes: “em tecnologia, as ações sobem e descem em movimentos inflacionários e deflacionários. Mas, se você olhar os dados de adoção, a análise pode ser diferente”. Pegue o burst da bolha em 1998. Valuations derreteram, mas, se olharmos os dados de tráfego da internet ao longo dos anos, só subiram, a ponto de não conseguirmos dizer quando foi o boom. Hoje, sabemos que todas as empresas floresceram depois da bolha, algumas entre as maiores do mundo. Esse aprendizado sobre adoção não foi em um momento só no tempo, Khosla relembrou que nos anos 1800 aconteceu algo similar com ferrovias. Empresas que conseguiram licenças tiveram uma explosão em valuation e depois a bolha estourou, mas a quantidade de construção de ferrovias só cresceu.

O insight que ele traz disso combina com o que também proponho aqui neste artigo: se o movimento seguir adicionando valor e ganhando tração de usuários, o fundamento é forte o suficiente para investir. No mundo de IA, seguramente adoption e usage é um deles. Inclusive é essa, entre outras métricas, que diferenciam soluções que genuinamente constroem valor na ponta das criadas para atender o teatro corporativo e o interesse individual em promoções de cargo.

Acredito que a IA é um avanço tecnológico de igual ou maior magnitude que a internet. Ter consciência da relevância desse movimento é o primeiro passo. E da nova caixa de ferramentas disponíveis, das boas práticas e dos casos nascendo em sua arena competitiva. O mesmo vale para a prontidão em termos de dados (acesso e qualidade).

Com esse contexto e bagagem, uma fase de investigação e descobertas seria o segundo passo, com o direcionamento em potencializar a geração de valor do negócio. Esse exercício traria uma lista de apostas para serem executadas em ciclos curtos de prototipagem, testes e feedbacks. Algo mais difícil para grandes corporações, mas extremamente necessário para sua sobrevivência em alavancas decorrentes de tech e software.

A expressão em latim et al é a abreviação de et alii (“e outros”, masculino plural), et aliae (“e outras”, feminino plural) e et alia (neutro plural), usada para mencionar obras com muitos autores. Comumente usa-se apenas o nome do primeiro autor.

Rodrigo Helcer
Rodrigo Helcer é cofundador da STILINGUE by Blip, empresa brasileira que desde 2014 empreende na frente de inteligência artificial aplicada ao monitoramento de redes sociais. Comprada em 2022 pela Blip, Rodrigo segue como acionista e advisor na empresa. Formado em Administração pela FEA-USP, o executivo atua no conselho consultivo e liderança de comitês de inteligência artificial. https://www.linkedin.com/in/rodrigohelcer/.

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