Gerir riscos é benéfico, porque é uma forma eficaz de reduzir, transferir ou evitar impactos indesejados. Gerir bem os riscos também significa evitar surpresas, ou pelo menos conviver o mínimo possível com elas
“Os riscos passam a ser conhecidos e avaliados, portanto é possível direcionar esforços para mitigá-los de forma assertiva. Dispor da capacidade de assumir riscos também é essencial, pois caso se tornem realidade sua criticidade já teria sido estimada, sua exposição estaria sendo monitorada e os planos de resposta estariam prontos para execução. As organizações que gerem riscos adequadamente dispõem da vantagem competitiva de obter resultados mais sustentáveis a médio e longo prazo.
A gestão de riscos, no entanto, representa um custo financeiro e operacional, pois envolve colaboradores, tecnologias e maior governança. E pode também impactar métricas de performance empresarial. O montante do investimento nessa gestão, portanto, é diretamente proporcional ao apetite que uma organização tem por riscos.Em linhas gerais, quanto maior for a tolerância de exposição aos riscos, menor poderá ser o investimento necessário para administrá-los. O contrário também é verdade. Apetite elevado por risco, contudo, não significa descontrole. Sua gestão demanda mecanismos de monitoramento para que uma eventual exposição acima do limite seja avaliada de forma precisa e tempestiva, pois uma resposta que garanta a reversão da trajetória poderá ser necessária.
O primeiro passo para saber o que precisa ser feito em momentos de crise é simular antecipadamente cenários com diferentes níveis de adversidade, visando identificar e avaliar os principais riscos que podem introduzir o caos na sua realidade.
O segundo é tomar ações concretas para criar a resiliência operacional e financeira necessária para mitigá-los a níveis adequados ou, no mínimo, para sobreviver aos seus impactos.
A pandemia Covid-19 trouxe um cenário de estresse para a sociedade como um todo, no qual foi possível ver os planos de ação com clareza. Nas organizações, as políticas, os procedimentos e as tecnologias de gestão de continuidade de negócios estão cumprindo sua função, tendo preparado empregadores e colaboradores para seguirem trabalhando mesmo em cenário adverso.
Empresas disciplinadas que realizam simulações periódicas de estresse financeiro, como situações de súbita restrição de crédito, forte variação na taxa de juros ou câmbio, ou impactos em fluxo de caixa por queda abrupta da demanda ou inadimplência, por exemplo, também se mostraram mais preparadas para lidar com o cenário atual.
Muitos governos ativaram planos de contingência previamente definidos para pandemias, preparando o sistema de saúde para o aumento no número de casos ao construir hospitais de campanha, como observamos em São Paulo (para não ir muito longe), disponibilizando estoques de suprimentos e implementando políticas públicas para diminuir o risco de contágio.
As pessoas, quando possível, estão utilizando recursos poupados para se sustentar. Alguns fundos de investimento se prepararam para a crise seguindo os ensinamentos do professor Nassim Taleb e adotaram estratégias antifrágeis que entregaram retornos financeiros incríveis em 2020.
A pandemia trouxe novamente a premência do gerenciamento de riscos. Impactos improváveis têm baixa probabilidade de ocorrência, porém nunca deixam de ser possíveis. Voltando a Taleb, quantos cisnes negros acontecem em uma década?
A pandemia do novo coronavírus apresentou fatos que evidenciam como é extremamente difícil coordenar com sucesso ações de prevenção, detecção e remediação entre pessoas, organizações e governos.
A coletividade pode ser vista como a soma de esforços individuais, pois ainda que exista uma coordenação centralizada efetiva, a transposição das diretrizes em ações concretas individuais pode falhar. E a probabilidade de que os outros falhem na prevenção, detecção e remediação de riscos precisa ser considerada na avaliação de risco, pois se houver uma relação entre as partes, o impacto incorrido ou causado por uma poderá afetar as outras.
Não vivemos num ecossistema de apenas um beneficiado, mas sim num contexto de relacionamento mútuo e interdependência. No final do dia, investir na resiliência da organização significa proteger o valor dos acionistas, garantir atendimento aos clientes, manter a confiança dos credores e continuar trabalhando para manter empregos.
O economista e prêmio Nobel Ronald Coase desenvolveu os aspectos econômicos do conceito de “tragédia dos comuns” em seu livro O problema do custo social (1960). O conceito busca explicar por que indivíduos realizam conscientemente ações danosas ao coletivo apesar de saberem que também serão eventualmente prejudicados por elas, ainda que não de forma imediata.
Podemos citar como exemplo os danos ao meio ambiente e a corrupção no setor público, quando, por exemplo, uma ação individual pode trazer redução de custos no primeiro caso e resultar em ganhos pessoais ou financeiros no segundo, ambos em detrimento do coletivo. Assim, ações inadequadas são realizadas no cotidiano, conscientemente, pois o prejuízo ao coletivo é relativamente intangível para o indivíduo, ou pelo menos baixo frente ao ganho imediato.
A tragédia dos comuns torna-se evidente quando a soma dos efeitos negativos das ações individuais atinge uma magnitude coletiva, de tal forma que o prejuízo se torna tangível para os indivíduos. Poluição, desmatamento ilegal, vazamentos de petróleo no mar, recorrentes escândalos de corrupção e ineficiência em políticas públicas específicas são sintomas reais desse mecanismo.
Assim, a preparação da resiliência operacional e da capacidade financeira para suportar períodos de estresse envolve também simular que a gestão da crise, quando feita por outros, pode trazer impactos exógenos antes inesperados.
Se o caos não é uma opção, não se deve ficar à mercê da política pública implementada, nem manter como premissa que os parceiros ou contrapartes comerciais honrarão seus compromissos, que seguramente haverá crédito disponível caso seja necessário ou que os colaboradores-chave continuarão disponíveis. Tais exemplos podem ser vistos como muito improváveis; contudo, se o caos realmente não é uma opção, eles precisam ser considerados.
A arte do gerenciamento de riscos e da continuidade de negócios é justamente evitar surpresas, mas, caso riscos se materializem, significa também estar preparado para lidar com eles da melhor forma possível. Vento a favor é bom, mas é preciso ajustar as velas de acordo com as mudanças e até mesmo saber a hora de rizá-las, visando preservar a embarcação, para depois içá-las novamente com sucesso.
A única forma de não correr riscos é não se expor a eles, o que normalmente inibe possibilidades de ação. O problema não é correr riscos, mas sim gerenciá-los de modo falho. A gestão de riscos implica custos adicionais e pode restringir o leque de opções ou a agilidade na tomada de decisões; ela é, porém, primordial para garantir a sustentabilidade do negócio.
Se o caos não é uma opção, uma fração da rentabilidade precisa ser sacrificada no curto prazo para reduzir a volatilidade de resultados no futuro. Um prejuízo pode ser revertido, já os cenários críticos podem ser irreversíveis. Para o caos deixar de ser uma opção, ações concretas precisam ser implementadas e sustentadas ao longo do tempo.
Para isso, é necessário incorporar a cultura de gestão de riscos a partir da administração, bem como contratar pessoas capacitadas e, principalmente, realizar investimentos em tecnologias que garantam seu alcance, eficiência e eficácia, entregando bons resultados.
Estar preparado para grandes crises pode significar não só a sobrevivência, mas também a capacidade de aproveitar oportunidades únicas. Afinal, a sua organização está preparada ou não?
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