Descrevo neste artigo a história fictícia e futurista de Adriana e Marcos para mostrar como as tecnologias digitais incessantes estão transformando a experiência dos pacientes em hospitais, clínicas e no acompanhamento das rotinas de saúde
“Diabética desde a infância, Adriana tinha passado por diversas formas de controle da glicemia ao longo da vida. Das incômodas picadas nas pontas dos dedos aos diferentes cateteres subcutâneos, nada se comparava em praticidade, conforto e bem-estar ao que vinha experimentando nos últimos anos. O relógio que ganhara no seu aniversário de 90 anos de Jorge, seu primogênito, não só dosava continuamente a glicemia, sem qualquer picada, como enviava os dados em tempo real para o seu celular e os telefones de Marcos, seu esposo, e dos seus médicos.
Diferente do passado, em que convivia com episódios frequentes de hiper ou hipoglicemia, inclusive com necessidade de internações hospitalares, Adriana praticamente não se lembrava mais de situações de descontrole da glicose. Seu relógio monitorava a glicemia, hemoglobina glicada, frequência cardíaca, pressão arterial, oxigenação sanguínea e ritmo cardíaco, alertando médicos e familiares de qualquer sinal de perigo. Além disso, a integração com sua balança inteligente e os desafios criados pelo aplicativo do celular tinham estimulado que ela retomasse suas caminhadas pelo bairro, perdesse alguns quilos e reduzisse sua taxa de hemoglobina glicada.
Antes avessos às tecnologias, Adriana e Marcos eram agora entusiastas de soluções digitais. Tinham vendido seus carros e só se locomoviam por meio de aplicativos de veículos aéreos, muito práticos e rápidos para o deslocamento em uma metrópole como São Paulo. Um robô auxiliava na limpeza doméstica, e outro, conectado com a geladeira e despensa, fazia os pedidos de supermercado de forma online e preparava a comida para o casal. Até pouco tempo atrás, apenas os atendimentos de saúde persistiam, diríamos, “analógicos”; Adriana e Marcos faziam questão de irem pessoalmente a hospitais e laboratórios para suas consultas e exames complementares.
Já há alguns anos, contudo, seus médicos e plano de saúde vinham incentivando os atendimentos digitais e o monitoramento por dispositivos vestíveis. Para o transplante renal de Marcos, realizado no ano anterior, o casal tinha feito grande parte do atendimento de forma digital. A única necessidade de visita ao hospital fora para o procedimento cirúrgico, realizado com a ajuda de realidade virtual e cirurgiões robôs, acompanhado por telemedicina pelos filhos que moravam no exterior.
Assim como em outras áreas, como no comércio, transporte e mercado financeiro, tudo indica que os pacientes serão progressivamente atendidos por recursos digitais. O sistema de saúde, cada vez mais complexo, necessitará de soluções inovadoras que melhorem a experiência dos pacientes, reduzam custo, sejam práticas e acessíveis e gerem valor para todos os envolvidos na cadeia de atendimento.
Os progressos da telemedicina, aliados aos dispositivos vestíveis que permitem monitoramento remoto dos pacientes por relógios, bandas elásticas e peças de vestuário, já possibilitam coleta e acompanhamento de diversos parâmetros clínicos, como frequência cardíaca, respiração, oxigenação sanguínea, ritmo cardíaco, pressão arterial, taxa de estresse, contagem de passos e consumo de calorias.
Algumas empresas têm desenvolvido sistemas ainda mais robustos, indo além dos parâmetros básicos. A Tytocare, por exemplo, permite avaliação remota dos pacientes por meio de um dispositivo chamado TytoHome, que pode ser utilizado pelo próprio paciente durante uma consulta de telemedicina, contendo um estetoscópio, um otoscópio, um abaixador de língua, um termômetro e uma câmera, que possibilitam que o médico assistente tenha acesso a um breve exame físico mesmo estando à distância.
Outras empresas, como a AliveCor, investiram em um sistema de eletrocardiograma com apenas um eletrodo, muito mais prático de ser utilizado pelos pacientes e com ótimos resultados para detecção de arritmias em comparação com o sistema tradicional de 12 eletrodos.
Por fim, sistemas de monitoramento remoto acoplados a soluções de inteligência artificial já permitem avaliação da retina em pacientes diabéticos de forma simples e precisa, podendo ser empregados por médicos não especialistas para detecção de retinopatia em pacientes diabéticos. Embora essa avaliação ainda não substitua exames oftalmológicos tradicionais em pacientes de risco, o fato de cerca de metade dos pacientes com diabetes nos Estados Unidos não realizarem anualmente qualquer avaliação oftalmológica torna o uso desses sistemas ainda mais impactante.
Voltando para a história do nosso casal de pacientes, talvez vocês se assustem ao saber que Adriana está, neste momento, na sala de espera do consultório do seu endocrinologista. Descompensação da doença? Alguma falha nos sistemas de monitoramento remoto? Estaria ela, já com quase 100 anos de idade, com dificuldade de usar tanta tecnologia? Nada disso. Chegara o momento do seu acompanhamento anual de rotina e Adriana sabe muito bem que há algo que a tecnologia não deverá substituir: o humanismo.
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