Novas tecnologias para armazenar energia limpa e renovável têm potencial de diminuir custos e aumentar benefícios ambientais
Há tempos a humanidade alimenta o sonho de estocar energia em quantidade suficiente para atender, de modo contínuo e permanente, às demandas diárias de grandes populações. Recentemente, essa busca foi associada à necessidade de substituir a energia baseada em combustíveis fósseis por aquela limpa e renovável, especialmente eólica e solar. Com isso, abre-se espaço para novas tecnologias, que permitam armazenar a energia gerada em ciclos com menor demanda para manter o abastecimento quando o consumo aumenta. Em uma economia em desenvolvimento como a do Brasil, esse movimento pode significar mais competitividade.
O relatório The Future of Energy Storage, elaborado pela MIT Energy Initiative, recomenda aos governos que concentrem esforços de pesquisa e desenvolvimento (P&D) em novas soluções de armazenamento para que elas possam estar disponíveis até 2050 – ou, se possível, antes ainda. O estudo explorou o papel que o armazenamento de energia pode desempenhar no combate às mudanças climáticas e na adoção global de redes de energia limpa. Uma de suas conclusões aponta que “o armazenamento pode reduzir o custo da eletricidade para as economias dos países em desenvolvimento, proporcionando benefícios ambientais locais e globais. Custos de armazenamento mais baixos aumentam a economia de custos de eletricidade e os benefícios ambientais”.
Guardar energia no período de maior geração para usá-la em momentos de escassez é um tema central quando se busca ampliar a participação da energia eólica ou solar na matriz energética. Afinal, não venta sempre, nem faz sol o tempo todo. Para solucionar essa intermitência, algumas modalidades de armazenamento surgem como tendência, movimentando novos segmentos do mercado de energia, como o ar congelado, a água comprimida e o hidrogênio. Dentre todas as possibilidades, as baterias são a alternativa com maior potencial de expansão, principalmente as de íon-lítio, que se mostram mais potentes e duradouras: o lítio garante maior armazenamento e mais capacidade de distribuição energética.
Um projeto de armazenamento em larga escala do país está sendo desenvolvido pela ISA CTEEP, empresa privada de transmissão de energia, e será instalado na subestação Registro (SP), uma das responsáveis pelo abastecimento do litoral sul paulista. A iniciativa prevê a instalação de baterias de lítio em uma área de 4 mil m², com potência instalada de 30 MW, garantindo, assim, o atendimento da demanda da região onde opera, que é de 400MW, beneficiando cerca de dois milhões de pessoas. A tecnologia atuará nos momentos de pico de consumo, como um reforço à rede elétrica, assegurando energia adicional por até duas horas.
Outro sistema de baterias de íon-lítio, mas de menor escala (com capacidade instalada de 161 kW, expansível para 1 MW), foi implantado em 2019 para manter a estabilidade da geração de energia da Usina Hidrelétrica de Bariri (SP), da AES Tietê. Conectado ao Sistema Interligado Nacional (SIN), permite aliviar as redes de transmissão ou de distribuição em caso de sobrecarga.
A ex-presidente Dilma Rousseff causou polêmica ao usar a expressão “estocar vento” em entrevista coletiva na Organização das Nações Unidas (ONU), em 2015. E a ideia está prestes a se tornar realidade no Rio Grande do Norte, onde o governo estadual fechou parceria com a EV Brasil para implantar um projeto de armazenamento verde gravitacional de energia.
O programa prevê a instalação de blocos de concreto de 35 toneladas cada em parques eólicos do estado. A tecnologia obedece a uma lógica ioiô, ou seja, o equipamento armazena energia potencial gravitacional ao ser elevado em torres de até 120 metros de altura. O movimento contrário de baixar os blocos por meio de cabos de aço acoplados a um gerador produz energia cinética. Em relação às baterias íon-lítio, o sistema teria a vantagem da longevidade, operando por mais de 40 anos.
Fora do país, há outras opções em fase de testes. Uma delas é a que usa sais fundidos em altas temperaturas, técnica apropriada para ser usada em torres de geração de energia solar. Neste caso, o sal é derretido a mais de 200 graus Fahrenheit (cerca de 93 graus Celsius). No momento de usar a energia, o processo é revertido por meio de resfriamento do material. As pesquisas para tornar essa alternativa viável vêm sendo realizadas pela Malta, startup criada no laboratório X da fábrica experimental da Alphabet (empresa-mãe do Google), em Cambridge, nos Estados Unidos.
Já a canadense Hydrostor utiliza ar comprimido para estocar energia produzida em parques eólicos e solares – um compressor é usado para compactar o ar, que, depois, é guardado no subsolo. Uma planta desse tipo encontra-se em funcionamento em Ontário, no Canadá, e projetos semelhantes estão sendo desenvolvidos pela Hydrostor nos Estados Unidos, Chile e Austrália.
Todos esses exemplos, entretanto, ainda representam modelos restritos a cidades ou comunidades, como salienta Carlos de Mathias Martins, colunista da MIT Sloan Management Review Brasil e fundador da Ecoinvest, holding de investimentos que tem como foco projetos de energia renovável. “Essas tecnologias melhoram a cada ano, mas a humanidade ainda está algumas décadas distante de achar uma solução de larga escala que tenha viabilidade econômica”, diz.
Seja como for, as baterias de íon-lítio constituem o case de maior sucesso de estocagem de energia até agora. Isso se deve à utilização dos dispositivos em produtos de consumo como carros elétricos, celulares e laptops, que impulsionam outras aplicações. “A viabilidade comercial é a chave para acelerar não apenas o desenvolvimento tecnológico, mas também a regulação dos novos segmentos de mercado, que ainda é bastante incipiente”, afirma Danilo Lima, diretor de inteligência de mercado e marketing da 2W Energia. “