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Felicidade, o superpoder das pessoas com bom desempenho

Um amplo estudo descobriu que o nível de felicidade dos indivíduos se reflete diretamente no desempenho no trabalho

Paul B. Lester, Ed Diener e Martin Seligman
30 de julho de 2024
Felicidade, o superpoder das pessoas com bom desempenho
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O custo que a pandemia impôs ao trabalho fez com que a satisfação em realizá-lo e o bem-estar emocional dos funcionários ocupassem um espaço muito maior na agenda dos líderes empresariais. Estes precisaram se esforçar para promover a felicidade da força de trabalho como nunca antes.

Embora muitos de nós – se não a maioria – sejamos motivados pelo cuidado genuíno com as pessoas que fazem funcionar nossas organizações , também sabemos intuitivamente que a felicidade dos funcionários deve aumentar o desempenho do trabalho. Ainda assim, duas perguntas incômodas permanecem. O que vem primeiro: ter sucesso (e depois ser feliz) ou ser feliz (e depois ter sucesso)? E em que medida a felicidade original de cada pessoa importa?

Os resultados de uma pesquisa que fizemos recentemente, publicados no Journal of Happiness Studies, nos aproximaram de responder a essas duas perguntas. Acompanhamos quase 1 milhão de soldados do exército dos Estados Unidos (EUA) por quase cinco anos. Primeiro pedimos que avaliassem seu bem-estar – sua felicidade, se preferir – e também seu otimismo, e depois rastreamos quais soldados mais tarde foram reconhecidos por seu bom desempenho no trabalho.

Coletamos nossos dados nas guerras no Iraque e no Afeganistão, então as apostas eram altas: os reconhecimentos se deviam a resultados exemplares e a ações heroicas. Receber uma condecoração no exército, seja por desempenho exemplar no trabalho, seja por heroísmo, é algo relativamente raro. Dos quase 1 milhão de soldados de nossa amostra, apenas 12% receberam qualquer tipo de reconhecimento durante os cinco anos do estudo. (Leia mais sobre a pesquisa no final deste texto.)

Embora esperássemos que o bem-estar e o otimismo influenciassem o desempenho, ficamos surpresos com a diferença que esses sentimentos faziam. Os soldados inicialmente mais felizes (localizados no quartil superior dos resultados) receberam quatro vezes mais reconhecimentos do que aqueles que começaram se declarando mais infelizes (quartil inferior) – o que significa uma enorme diferença de desempenho entre os dois grupos. Essa lacuna se manteve quando consideramos a patente (oficiais versus soldados que se alistaram), gênero, raça, educação e outras características demográficas. De fato, a felicidade – e, em menor grau, o otimismo – eram os melhores indicadores de desempenho digno de reconhecimento do que qualquer fator demográfico que examinamos.

E no mundo dos negócios?

Você pode desconsiderar esses resultados se acreditar que dados militares de forma alguma se aplicam ao mundo dos negócios, mas estaria errado em fazê-lo. Afinal, o Departamento de Defesa dos EUA é o maior empregador do mundo, superando o Walmart em quase 1 milhão de funcionários. Ele tem quase US$ 3 trilhões em ativos totais (em comparação com os US$ 236 bilhões do Walmart) e mais de US$ 290 bilhões em bens (em comparação com os US$ 44 bilhões do Walmart). O Exército dos EUA não é apenas um “grande negócio”; é, de fato, o maior dos negócios por ordem de magnitude, então o que aprendemos com os militares pode ser aplicado ao mundo dos negócios. Existem mais de 190 categorias de trabalho distintas no Exército – de escriturário a piloto, de cozinheiro a comandante – e a maioria foi incluída em nossos dados.

Em suma, não só a felicidade e o otimismo impactam o desempenho dos funcionários, como também podem prever em que medida os funcionários apresentarão bons resultados. Nossa pesquisa com os militares, juntamente com outras pesquisas de ciência comportamental feitas nos últimos 40 anos, destaca a vantagem competitiva que a felicidade dos funcionários oferece às empresas. Há algumas coisas sobre a felicidade dos funcionários que todo líder empresarial deve saber e ser capaz de aplicar. E, à medida que emergimos de uma pandemia global que atingiu intensamente o moral das pessoas, todos nós faríamos bem em fazer um balanço de como influenciar a felicidade e o otimismo de todos no local de trabalho.

Isso levanta aquela questão: o que realmente é felicidade? A literatura científica comportamental muitas vezes se refere à felicidade como bem-estar subjetivo, porque o significado da felicidade varia em diferentes contextos. Como na maioria dos conceitos que emergem da psicologia, as definições variam, mas quando se trata de felicidade, elas geralmente se fundem em torno de três áreas: a própria avaliação de uma pessoa de sua satisfação com a vida; quanta emoção positiva (como prazer, entusiasmo, inspiração ou orgulho) ela experimenta; e quão pouca emoção negativa (como hostilidade, irritabilidade, medo ou nervosismo) experimenta. Combinamos esses três fatores para produzir nossa medida de felicidade.

O que sabemos sobre felicidade?

Desde o advento da psicologia positiva em 2000, houve uma enorme quantidade de pesquisas no campo, com o bem-estar mencionado em mais de 170 mil artigos acadêmicos. Parte desse trabalho detectou que há verdade na percepção de que algumas pessoas parecem mais felizes, e os pesquisadores têm olhado atentamente para o que herdamos (fatores com os quais nascemos) e como nosso ambiente molda nossa felicidade. Se pensarmos na felicidade geral como uma torta, então a pesquisa sugere que a hereditariedade representa cerca de 40% dessa torta, enquanto 60% são atribuídos a outros fatores, especialmente experiências de vida. Quase o mesmo pode ser dito para o local de trabalho: em um estudo recente de longa duração, os pesquisadores descobriram que, embora a carga de nascença tivesse um peso de cerca de 30% da satisfação no trabalho aos 21 anos, sua importância caiu para menos de 20% quando medida novamente aos 25 e 30 anos. Assim, fatores ambientais no local de trabalho tornam-se mais importantes com o passar do tempo.

A importância relativa de alguns desses fatores ambientais mudou recentemente. O World Happiness Report 2021 observou que, no local de trabalho, a felicidade diante da pandemia se deveu, em grande parte, ao senso de pertencimento dos funcionários a uma organização, à relação com os colegas de trabalho, à flexibilidade oferecida aos trabalhadores, à inclusão e ao senso de propósito ao seu trabalho (em ordem decrescente de importância). As coisas mudaram drasticamente durante a pandemia: ter um gestor que oferece apoio tornou-se o maior prognóstico de felicidade – quase duas vezes mais importante que o fator seguinte, o propósito.

Não surpreende que o dinheiro também tenha seu peso para a felicidade dos funcionários – mas pesquisas demonstraram que isso ocorre principalmente para aqueles funcionários que já haviam indicado que consideravam o dinheiro importante no início da pesquisa. Em um estudo recente, a relação entre renda e felicidade foi acima de quatro vezes maior para as pessoas que fizeram essa correlação em comparação com aqueles que se importavam muito menos com dinheiro. Assim, para os funcionários que não são movidos pela remuneração, a renda pode ser apenas um fator, sem influência significativa sobre a pontuação.

No local de trabalho, sabemos que funcionários mais felizes são mais propensos a emergir como líderes, obter pontuações mais altas em avaliações de desempenho e tendem a ser melhores colegas. Também sabemos, com base em pesquisas consistentes, que funcionários mais felizes são mais saudáveis, têm taxas menores de absenteísmo, são altamente motivados para ter sucesso, são mais criativos, têm melhores relacionamentos com os pares e são menos propensos a deixar uma empresa. Todas essas correlações de felicidade influenciam significativamente o resultado final de uma empresa.

Juntos, os dados indicam que há muito espaço para líderes e organizações influenciarem a felicidade no ambiente de trabalho. Embora a felicidade seja influenciada pela hereditariedade e por motivadores como um senso de propósito, uma parcela maior da felicidade pode resultar de fatores como flexibilidade, salário, tipo de trabalho e gestores encorajadores. Isso significa que é possível para os líderes moldar o ambiente de trabalho e assim tornar os funcionários mais felizes.

Como promover a felicidade dos funcionários?

Para começar, sugerimos que os líderes sigam a ciência e adotem uma abordagem estruturada para contratar, promover e desenvolver a felicidade dos funcionários. Embora a abordagem varie com base nas necessidades organizacionais, os líderes devem se comprometer com três ações.

1. Medir a felicidade tanto entre os funcionários quanto entre candidatos a vagas. Em muitos aspectos, “contratar aquele que é feliz” exige que se coloque as coisas em perspectiva. Embora não acreditemos que a felicidade deva ser colocada à frente de conhecimentos, habilidades ou talentos necessários para um trabalho, defendemos o uso de medidas de felicidade e otimismo como diferenciadores, ou desempate, porque os riscos são baixos e os benefícios podem ser grandes. Também é importante usar ferramentas de avaliação comprovadas e não contar com a intuição de um gestor que se baseie apenas na própria percepção.

Muitas organizações já usam vários instrumentos para avaliar candidatos a emprego. Mesmo que a adição de perguntas sobre felicidade e otimismo à avaliação do candidato resulte em apenas um pequeno aumento na produtividade e rentabilidade mais adiante, a maioria dos gestores adoraria essa oportunidade, porque não custa quase nada. Se você extrapolar nossas descobertas do estudo militar para um contexto do setor privado em que mil contratações serão feitas, usar o bem-estar como critério de contratação deve levar a cerca de 11 funcionários que trarão resultados excepcionais a mais do que se a empresa simplesmente contratasse pessoal sem levar em conta o bem-estar.

Além da contratação, a felicidade dos funcionários também deve ser observada ao se medir o desempenho organizacional. Sim, o desempenho objetivo ainda importa muito. Mas, embora uma divisão de alto desempenho dentro de uma empresa possa trazer lucro em curto prazo, se esse desempenho foi impulsionado por práticas tóxicas de liderança e gestão, esses lucros poderiam evaporar rapidamente caso, em reação, os funcionários deixassem a empresa. Rotatividade sem necessidade custa caro. O exército norte-americano, por exemplo, percebeu isso e desligou oficiais que fomentavam climas organizacionais ruins, e às vezes tem feito isso preventivamente, antes que um evento catastrófico possa ocorrer. Afinal, recrutar e treinar um engenheiro de reator nuclear custa várias centenas de milhares de dólares e anos de esforço, e muito mais em relação a um piloto.

A rotatividade e a escassez de talentos em uma corporação têm efeitos negativos semelhantes. Assim, defendemos tratar a felicidade como um resultado objetivo de desempenho da organização, bem como um indicador do sucesso da liderança. Em nosso estudo, utilizamos uma das medidas padrão-ouro do bem-estar, o Positive and Negative Affect Schedule (PANAS), que tem sido usado em milhares de estudos publicados para examinar a felicidade em diversos contextos. São necessários apenas dez minutos para completá-lo.

2. Desenvolver a felicidade em sua força de trabalho. Dados todos os requisitos de treinamento e desenvolvimento que existem na maioria das organizações, a ideia de buscar ativamente desenvolver a felicidade entre os colaboradores felizes pode inicialmente parecer estranha, demorada e cara. No entanto, a literatura acadêmica mostra repetidamente que iniciativas de treinamento voltadas para o bem-estar dos funcionários não exigem um investimento de tempo significativo, são rentáveis e geram um ROI elevado.

Aqui estão três exemplos de exercícios simples, cada um apoiado por rigorosas evidências. Na primeira, a Visita de Gratidão, os participantes preparam e apresentam um testemunho de 300 palavras de gratidão a alguém que mudou sua vida para melhor. No segundo, Três Coisas Boas, os participantes escrevem, por uma semana, três coisas que vão bem a cada dia e o que fez com que isso acontecesse. O terceiro, Usando seus Pontos Fortes de uma Nova Maneira, convida os participantes a completar uma pesquisa de pontos fortes online e, em seguida, usar um de seus principais pontos fortes de um novo jeito a cada dia por pelo menos uma semana.

Pesquisas que testam essas abordagens descobriram que os exercícios de Três Coisas Boas e de Pontos Fortes aumentaram significativamente a felicidade e diminuíram a depressão ao longo de seis meses, enquanto a Visita de Gratidão fez o mesmo ao longo de um mês. É claro que essas iniciativas de felicidade no ambiente de trabalho funcionam melhor quando as pessoas querem se tornar mais felizes, estão dispostas a se esforçar e acreditam que esses esforços renderão dividendos. Além disso, os custos são bastante baixos, as intervenções podem ocorrer em qualquer nível de organização, e não exigem consultores externos.

Nossa recomendação: primeiro, medir o bem-estar. Em seguida, comece com os exercícios fáceis de aplicar e que mostram que a empresa valoriza o bem-estar dos funcionários. Então comece a investir nos programas mais complexos ao longo do tempo à medida que a felicidade aumenta.

3. Reter os funcionários que estejam felizes. A pandemia nos lembrou de algumas realidades difíceis, ou seja, que as organizações podem se contrair em tempos turbulentos tão rápido quanto se expandem quando a economia está crescendo. Claramente, nosso estudo com os militares mostra que as organizações devem querer funcionários felizes, porque eles têm um desempenho significativamente melhor do que aqueles que estão infelizes.

Porém acontece que as organizações também precisam de funcionários felizes, porque a felicidade é de fato contagiosa. Por exemplo, pesquisadores examinaram 20 anos de dados de 4,7 mil participantes do Framingham Heart Study e descobriram que, não apenas a felicidade pode se espalhar por uma rede social, mas também que pessoas felizes estão muito mais conectadas a outras pessoas felizes dentro da rede. Talvez a descoberta mais marcante desse estudo tenha sido que o efeito da felicidade se estendeu por três graus de separação do primeiro indivíduo (assim, amigos dos amigos de seus amigos).

Outro achado importante do estudo é que, assim como a felicidade, a infelicidade também é contagiosa. Esse efeito de contaminação coloca os líderes em uma posição difícil, especialmente se forem apresentados com o difícil cenário de conseguir manter apenas um de dois funcionários, por exemplo. Com o desempenho e outros fatores mantidos em equilíbrio, eles devem manter aquele que é mais feliz.

Lidere pelo exemplo

Nosso trabalho com o Exército dos EUA na última década identificou uma verdade fundamental de maneira consistente: as iniciativas de bem-estar dos colaboradores funcionam melhor quando a liderança apresenta o material com confiança e quando os líderes seniores dão ênfase significativa ao esforço geral para atingir resultados. Assim, os gestores devem estar dispostos a investir sua energia para que as iniciativas sejam bem-sucedidas, não apenas defendendo-as – como garantindo recursos para programas e promovendo mensagens estratégicas positivas – mas também participando do treinamento e incorporando-as a seus próprios comportamentos.

Se os líderes querem melhorar a felicidade dos funcionários, eles servir de modelos para que isso se torne parte integrante da linguagem e da cultura da organização. Aprendemos melhor observando os outros. Em outras palavras, deixe seus funcionários aprenderem a ser felizes observando você sendo feliz.

Dos militares para (todos) os empregadores

Os achados do nosso estudo são amplamente aplicáveis porque a amostra utilizada não foi extraída de uma área funcional específica, como costuma ocorrer em pesquisas publicadas sobre felicidade no ambiente de trabalho. Nosso estudo incluiu soldados que executavam trabalhos típicos do Exército, mas muitos outros eram profissionais de escritório, motoristas de caminhão, policiais, médicos e outros profissionais de saúde, especialistas em logística, pilotos, engenheiros e estrategistas, entre outros.

Assim, nossa medição é única e torna nossos resultados altamente aplicáveis ao mundo dos negócios. Em suma, a felicidade importava em todo o espectro de trabalho. A amostra também importa por outras razões. Por ser enorme e realizado por cinco anos – com quase 1 milhão de pessoas, é o maior estudo de bem-estar de longo prazo já feito – poderíamos realizar análises mais detalhadas com os dados e demonstrar que os achados eram verdadeiros independentemente dos diversos dados demográficos, como dissemos acima.

Embora a maior conquista deste estudo seja vincular a felicidade ao desempenho exemplar, ele também corrobora descobertas de pesquisas anteriores, o que é fundamental para a ciência. Atualmente, o campo da ciência comportamental está enfrentando uma crise de corroboração, com o questionamento da validade de muitas teorias de liderança, de gestão e comportamentais que são ensinadas nos programas de MBA. A Open Science Collaboration divulgou em 2015 que menos de 40% dos experimentos seminais da ciência comportamental poderiam ser replicados. Isso é muito pouco. Já as nossas descobertas são altamente precisas, representam resultados de longo prazo e abrangem muitos trabalhos.

Sobre a pesquisa

– Os pesquisadores acompanharam quase 1 milhão de militares do Exército dos EUA por cinco anos, medindo sua felicidade e otimismo relativos a partir de 25 perguntas tiradas do Positive and Negative Affect Schedule (PANAS) e do Life Orientation Test. Essas perguntas se somaram a uma pesquisa maior feita anualmente com cada membro do Exército.- Essa medida de bem-estar combina as próprias autoavaliações dos indivíduos e seus relatos sobre a frequência de emoções positivas e negativas experimentadas, para produzir o que os pesquisadores chamaram de medida de felicidade.- Os pesquisadores verificaram o desempenho anterior e diversos fatores demográficos que poderiam influenciar nos resultados posteriores. No entanto, os soldados que eram os mais felizes e otimistas passaram a ganhar significativamente mais prêmios por desempenho no trabalho nos cinco anos seguintes em comparação com aqueles que estavam inicialmente infelizes e pessimistas.”

Paul B. Lester, Ed Diener e Martin Seligman
Paul B. Lester é professor associado de gestão na Naval Postgraduate School. Martin Seligman é professor de psicologia da Zellerbach Family na University of Pennsylvania, diretor do Centro de Psicologia Positiva da universidade e ex-presidente da American Psychology Association. Ele foi nomeado pela Academic Influence como o psicólogo mais influente do mundo na última década. Ed Diener faleceu em abril de 2021. Foi professor de psicologia na University of Utah e na University of Virginia, professor emérito University of Illinois, e cientista sênior da Organização Gallup. Recebeu o Prêmio da American Psychology Association por sua contribuição geral em 2012, e seus trabalho já tiveram mais de 250 mil citações.

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