Transformação central para a estratégia do negócio não passa mais apenas pela área de tecnologia e conta com apoio do alto comando das organizações, mas ainda requer avaliações
É notório que o setor bancário brasileiro tem passado por inflexões que mexem com a base de seu funcionamento, como a abertura dos serviços financeiros com o open banking, a comoditização desses serviços e a aplicação da Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD) e suas implicações para o processamento, armazenamento, custódia, transparência, manutenção e compartilhamento de informações de clientes. Devido a mudanças como essas, emergiu no setor a necessidade urgente de adequações regulatórias e sensibilidade maior a respeito do comportamento de consumidores cada vez mais preocupados com seus dados e em busca de relações menos burocráticas.
A partir desse contexto, há cerca de cinco anos, os bancos nacionais (sejam eles grandes, médios ou nativos-digitais) amadureceram seu entendimento sobre a adoção de tecnologias. “Um indicativo dessa mudança de comportamento é o número de executivos que se dizem satisfeitos com a jornada de adoção da nuvem nas operações”, afirma Leonardo Fraga, diretor executivo de digital & technology strategy da Accenture. “De 2019 para 2020, essa percepção dobrou, passando de 7% para 15%.”
Entretanto, 15% ainda reflete uma fatia pequena da confiança dos executivos da área, demonstrando que há muita insegurança a respeito de programas de transformação para a nuvem, assim como há receios quanto a questões como segurança e investimentos. Para Fraga, essa (ainda) alta taxa de desconfiança está ligada à ambição e ao apetite por inovar desses profissionais e dos modelos de negócios.
“Para aqueles que desenharam ambições maiores, que investiram em business cases mais robustos, os resultados foram melhores”, diz o executivo da Accenture. “Ao mesmo tempo, é necessário observar a capacidade desses executivos em gerir os programas de transformação para a nuvem. Isso nos leva a ver grandes bancos construindo estruturas de apoio à gestão desses programas que sejam capazes de acompanhar e comparar os resultados executados com o que havia sido dinamicamente planejado. É por meio das lições aprendidas que conseguimos ir muito além da massa crítica.”
Um momento único exige um novo conjunto de atitudes em que todos aqueles que pertencem à cadeia bancária devem agir. Os altos comandos não querem retornar à antiga maneira de trabalhar e avaliam como aproveitar o cenário disruptivo para introduzir novos hábitos de trabalho e de engajamento digital das equipes, partindo do princípio que nada será como antes.
“Quem toma decisões de investimento hoje num ambiente com muito mais flexibilidade, e que também não tem tanta certeza sobre qual vai ser o comportamento do consumidor, tem assumido uma característica mais exploratória em todos os sentidos”, diz Fraga. “O alto comando não quer, diferentemente de dez anos atrás, comprometer investimentos de grande magnitude, mas já tem muita clareza que há uma necessidade de investimentos em infraestrutura de tecnologia sem precedentes, por exemplo.”
Assim, mesmo para aqueles que estejam impossibilitados de agir devido a programas complexos de transformação digital e de migração para a nuvem, é possível observar cinco elementos essenciais que caracterizam uma adoção da nuvem bem-sucedida, de acordo com a Accenture:
1. Migrar e escalarA partir da infraestrutura mais adequada ao seu negócio, transfira as cargas de trabalho com mais agilidade, segurança e confiança.
2. Aproveitar os hyperscalersAposte na inteligência e inovações dos grandes provedores de nuvem para gerar o valor apropriado à sua estratégia.
3. Modernizar e acelerarSeja mais ágil ao reestruturar arquiteturas, aplicativos e dados no ambiente de cloud.
4. Executar e otimizarGaranta a sustentabilidade do negócio ao adotar operações que levem ativos de nuvem a níveis mais altos de desempenho.
5. Inovar e crescerExperimentação rápida para operações e modelos de negócio são alavancados a partir do uso da nuvem.
Segundo Fraga, ainda que haja resistência na relação entre a tecnologia e o negócio, o setor deve prosperar ao pensar num modelo de trabalho novo que tire proveito de todas as inovações proporcionadas por essa adoção. “Os bancos precisam operar esse serviço que está na nuvem, e se você abre mão de aproveitar esse momento para construir uma transformação dentro da sua operação, uma infraestrutura própria, você não tira o melhor benefício desse movimento todo”, diz. “Há uma mudança de agenda em grandes bancos da América Latina, e essa discussão é de negócios.”
Assim, atores do setor devem considerar dimensões quantitativas e qualitativas ao investir na migração para a nuvem. A primeira delas é que o uso de serviços em nuvem traz a vantagem de reduzir os tempos de entrega de programas digitais, o que assegura uma resposta mais veloz às mudanças do mercado. Quando a organização entende o ambiente flexível que a nuvem oferece, o negócio ganha mais autonomia e agilidade para acelerar mudanças – caso, por exemplo, da implantação de produtos como o crédito digital, de ponta a ponta.
Outro benefício da migração está na transformação da curva de custos – e esse é um tema sensível para o setor, afinal, espera-se que haja um investimento de enormes proporções para a transformação e migração de ambientes, com retornos a prazos longínquos. “Temos evidências de que o custo da nuvem para muitas aplicações é menor quando comparamos com empresas que possuem infraestrutura própria”, afirma Leonardo Fraga.
“Especialmente quando consideramos o volume de aplicações e de otimizações necessárias constantemente, é muito fácil ficar para trás. Tem sido mais viável financeiramente aproveitar a expertise dos grandes provedores para elaboração de produtos SaaS.”
A gestão de dados, de risco e de segurança também se beneficia dos investimentos em nuvem. Segundo Fraga, a criação do open banking exige que os dados de clientes e das transações sejam compartilhados de forma segura e com permissão, exigindo dos bancos o tratamento correto de dados sensíveis, proteção a funções críticas e capacidade de análise.
“Em contraste com cerca de três anos atrás, quando empresas colocavam na nuvem apenas dados não sensíveis e anonimizados, hoje vemos operações mais robustas e seguras sendo migradas para a nuvem exatamente pela qualidade de proteção, análise e monitoramento de dados sensíveis”, afirma.
“Os provedores dão condições para você hospedar dados identificados dos clientes sem que você tenha que se preocupar com potenciais vazamentos. E o que isso traz de possibilidades é sem precedentes: não só na condição de hospedá-los adequadamente, mas de usar serviços analíticos cada vez mais sofisticados e elaborados para capturar novos insights desses dados. Isso está na mão de várias empresas hoje, não só das grandes, o que possibilita maior democratização.”
Apesar dos benefícios, toda organização deve avaliar e propor estratégias de mitigação para encarar os desafios que a migração para a nuvem pode acarretar.
– Estratégia: bancos buscam confirmar a melhor estratégia para o programa, entre migrar e transformarO que fazer: entender o potencial valor para os negócios, a pressão por velocidade e a expectativa de ROI e payback para a transformação, além de entender as complexidades do ambiente atual e qual o impacto sobre os objetivos de negócio.
– Investimento: bancos que fizeram investimentos recentes em cloud privada e infraestrutura on premiseO que fazer: avaliar o ambiente atual, seu valor residual, e definir o momento e estratégia de divest.
– Segurança: conformidade a normas, privacidade e proteção de dadosO que fazer: assumir o controle da conformidade regulatória e não deixar na mão do provedor, criar um roteiro de transição de controle ponta a ponta.
– Complexidade de negócios: incapacidade de definir e implantar um modelo de agilidade de negócios devido à burocracia corporativaO que fazer: quantifique os benefícios financeiros e estratégicos de longo prazo para estabelecer um caso macro para migração em massa, realize um piloto para a reformulação fim a fim e considere uma estratégia de nuvem híbrida para se preparar para a fluidez das regulamentações.
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