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O Brasil deveria liderar a inteligência artificial (aberta)

O País não precisa perder o trem da IA como aconteceu em outras ondas tecnológicas: se direcionarmos bem leis e estratégias, dá tempo de liderarmos a frente da IA open source

Fabro Steibel
23 de outubro de 2024
O Brasil deveria liderar a inteligência artificial (aberta)
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IA aberta não é algo novo, mas ganhou momentum recentemente.

Já cresce o olho de governos e empresas de venture capital para liderar esse mercado.

A Databricks, que lançou o mais poderoso modelo de IA até o momento, investirá US$ 10 milhões para promover a tecnologia para que seja usada livremente.

O Hugging Face, marketplace de modelos de IA aberta, já tem mais de 350 mil componentes disponibilizados, e recebeu investimentos de US$ 100 milhões para crescer.

A União Europeia liberou de carga regulatória grande parte da IA aberta, pensando em inovação. A corrida está começando, e o Brasil está em boa posição para se destacar.

E por que a IA aberta é tão interessante?

Dados e software aberto possuem diversas licenças, mas em geral pensamos dados e código como abertos ou fechados. Na IA aberta já é melhor falar de gradientes de abertura, componentes intermediários que podem ser abertos ou fechados. É possível, sim, ter uma IA inteiramente aberta. Mas é muito mais eficiente ter “degraus” de desenvolvimento abertos. Essa é uma opção mais escalável, econômica e promotora de inovação que opções de ID completas ou fechadas.

IA aberta é abrir camadas da construção da tecnologia, antes de tudo. A Noruega, por exemplo, em suas estratégias de IA incluiu a criação de um “banco de língua norueguesa”, o que é útil para inúmeros processos intermediários que envolvem acesso, leitura e processamento de dados, sem contar o potencial para chatbots e outros mecanismos de interação entre governo e sociedade. A Noruega inclusive colocou a meta de 80% das instituições públicas com algum uso de IA até o ano que vem.

Quando a União Europeia propôs a primeira versão da Lei de Inteligência Artificial, em 2021, o mundo todo passou a pensar em IA como um modelo fechado, uma “coisa” usada para um fim específico. Ledo engano. IA até pode também ser pensada como um modelo fechado, como qualquer produto vendido no mercado. Mas IA é melhor descrita como um conjunto de partes e componentes. O estudo do BAIR, da University of Berkeley, mostra inclusive como muitas das IAs que conhecemos são resultados de combinações de camadas abertas e interoperáveis.

Exemplo: SABIÁ

A inteligência artificial aberta é uma boa inspiração para a infraestrutura digital pública. É claro que processamento em nuvem e acesso a placas de GPU são essenciais, mas as criações nacionais como Pix ou o Gov.br são muito mais que meros dados processados. Aprendemos ali o poder da infraestrutura digital, que faz com que os ecossistemas digitais floresçam. Imagine se criamos o “pix” ou “gov.br” da inteligência artificial, algo que o mundo aprenda conosco.

Já temos alguns exemplos de como a IA aberta está sendo feita no País. Inspirada na OpenAI, a Maritaca, sediada na Unicamp, já oferece o Sábia, um modelo de linguagem de larga escala (LLM) 45 vezes mais barato do que opções estrangeiras populares (e apenas 16% menos eficiente).

Inspirado no portal dados.gov.br, que tem bases de dados públicas para fomento de ecossistema, devíamos ter o “Hugging Face” brasileiro. Ou fazer com que esses portais de componentes sejam recheados de IA aberta nacional. O ganho aqui é na escala: quanto mais atores adotarem modelos abertos, mais acessível a solução é. E, quanto mais modelos falarem “Brasil” ou português, mais protegidos estaremos.

Há quem encare com preocupação os riscos sociais da IA aberta, e é válido pontuar que existem sim modelos criados para desrespeitar a lei (criando conteúdo tóxico, por exemplo). Mas as pesquisas, uma depois da outra, deixam claro que modelos abertos tendem a gerar melhores soluções de controle. Novamente o ganho é na escala: infraestruturas abertas tendem a ser mais vigiadas que soluções fechadas ou isoladas.

A HORA É AGORA. É agora que discutimos como podemos ter mais ambição na Estratégia Brasileira de Inteligência Artificial (a famosa EBIA). É agora que p Congresso debate que tipo de legislação o Brasil deve ter. Pois a IA aberta é um excelente caminho para nos inspirar. Já temos fama por nossa comunidade de dados e software aberto, está na hora de ficar famoso também por enxergar na IA infraestruturas abertas que façam essa oportunidade mais acessível e segura para todos.

Fabro Steibel
Diretor-executivo do Instituto de Tecnologia e Sociedade do Rio de Janeiro (ITS-Rio), Fabro Steibel é membro do Conselho Global do Fórum Econômico Mundial, pesquisador independente da Open Government Partnership, fellow da Organização dos Estados Americanos (OEA) para governos abertos, professor da inovação da ESPM e membro do conselho editorial da MIT Sloan Review Brasil.

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1 comentário

  • roberto disse:

    Parabens pelo artigo aqui exposto. Estamos caminhando, em passos lentos, para um desenvolvimento mais aberto. Precisamos educar nossos legisladores primeiro do que se trata essa inovação aberta. Ainda bastante fechada, muitos e uteis e poucos e vitais. Embora tenha uma dose de otimismo bastante aguçada quando lendo os seus comentários. Obrigado!

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