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O valor da busca ativa organizada

Empresas inovadoras se aproximam dos ecossistemas que formam as startups

Maximiliano Carlomagno
30 de julho de 2024
O valor da busca ativa organizada
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Em 2017, o atacante brasileiro Vinicius Jr. entrou para a história do futebol mundial. Com apenas 16 anos, ele foi vendido pelo Flamengo ao Real Madrid por 45 milhões de euros. Esse tipo de transação tem sido frequente no mercado do futebol e nos proporciona lições importantes sobre inovação aberta com startups.

Os grandes clubes europeus e brasileiros têm empreendido uma estratégia clara de busca de jovens jogadores para qualificar suas equipes. Para tanto, esses clubes adotam abordagens estratégicas de scouting, busca ativa e análise de alternativas baseadas em dados ao redor do mundo, especialmente junto aos clubes formadores de jovens talentos. Eles perceberam que não podem aguardar os jogadores se transformarem em craques, pois correrão o risco de não contratá-los.

O mesmo acontece com as empresas inovadoras. Elas entenderam que precisam se aproximar dos ecossistemas que formam as startups para terem acesso a essas tecnologias antes de seus concorrentes. Esperar que as melhores soluções batam à sua porta não é uma alternativa inteligente. Para ter acesso às melhores startups é preciso ter uma postura ativa, consistente e conectada com os ecossistemas mais adequados aos interesses de cada empresa. Nesse sentido, para otimizar seus esforços de scouting, direcionar a busca, alinhar o formato e entender a visão das startups são posturas bastante eficazes.

1) Direcionar a busca a partir de desafios estratégicos

O primeiro passo para ser efetivo no processo de scouting é definir com clareza quais são as áreas de interesse. Quem não sabe o que quer não reconhece quando o encontra. Essas áreas de interesse devem ser temas estratégicos para a empresa. De preferência, tendo times internos com autonomia, vontade e recursos para não apenas explorar, mas selecionar e executar os potenciais projetos em parceria com as startups.

Essas áreas de interesse, também chamadas de desafios, podem ser dores internas ou oportunidades de novos negócios, de acordo com a estratégia de inovação da companhia.

Por meio desses desafios, a busca se torna mais eficaz, com menos tempo investido e mais retorno. Ao invés de avaliar toda e qualquer alternativa potencialmente interessante, a empresa passa a direcionar e focar naquilo que importa. Esse direcionamento permite discernir com clareza as melhores das piores alternativas. Também possibilita priorizar os melhores ecossistemas a serem explorados.

2) Selecionar a melhor abordagem: pública ou privada, receptiva ou ativa

A busca ativa pode ser feita de maneira pública, por meio de um programa comunicado ao mercado, ou de modo privado, sem expor inicialmente a empresa. A busca pública se alavanca na imagem e reputação da empresa para gerar interesse. Quando Itaú, Unimed ou SLC Agrícola manifestam suas áreas de interesse, as fintechs, healthtechs e agtechs sabem com quem estão lidando e qual o tamanho da oportunidade. Essa estratégia permite uma apresentação detalhada dos interesses da organização. A busca privada se destina a temas nos quais a empresa entende que a confidencialidade é um pré-requisito.

Além da definição sobre a publicização ou privacidade da busca, existe uma reflexão sobre a conveniência de ter um canal para receber passivamente potenciais soluções e diversas empresas brasileiras têm esse canal. A nossa experiência é que o aproveitamento desse tipo de alternativa é baixo. Primeiro pela ausência de alinhamento estratégico com os temas de interesse, segundo pela seleção adversa que esse modelo cria. As melhores startups têm sido reticentes em relação a esse mecanismo.

Para encontrar as melhores soluções é preciso ir até onde elas estão e mostrar que a empresa está preparada para esse tipo de relacionamento. Recentemente, fomos recebidos por uma startup com um checklist de sete perguntas antes de aceitar fazer um pitch para a diretoria de uma das 10 maiores empresas do Brasil.

3) Aproveitar as oportunidades com incubadoras, aceleradoras, hubs e bases de startups

Há fontes de startups, atualmente, no Brasil. Cada um desses lugares tem um tipo de solução, mecânica de interação e interesse no contato. As principais fontes são:

Incubadoras: estruturas de apoio a empreendedores ligadas à universidade. Lá podem ser encontradas soluções em estágio bem inicial e com base científica. A Raiar, por exemplo, é a incubadora do Tecnopuc da PUC-RS.- Aceleradoras: organizações que investem e apoiam com mentoria e capacitação as startups em estágio inicial. Há aceleradoras especializadas e genéricas. A WOW, por exemplo, é uma aceleradora que reúne mais de 300 investidores pessoa física e já investiu em mais de 100 startups nos últimos nove anos.- Hubs: espaços físicos e digitais que reúnem startups e empresas que querem fazer negócios. Realizam eventos e programas de fomento aos negócios entre os residentes e com o mercado em geral. O Cubo, principal hub de startups digitais na América Latina, integra mais de 400 startups já mais maduras e habituadas a fazer negócios com corporações.- Bases de startups: soluções digitais que reúnem startups em forma de software e reports. A Associação Brasileira de Startups (ABS) tem uma base disponível para quem quiser conhecer.

Essas estruturas têm em comum o objetivo de gerar oportunidades de negócios. Incubadoras, aceleradoras e hubs têm foco nas startups de seu portfólio. Aceleradoras e incubadoras não costumam cobrar pelo acesso às startups. As bases, plataformas e reports por vezes são pagas, como a base global do Crunchbase ou CB Insights. Os hubs tendem a ter ofertas diversas de como as empresas podem se relacionar com suas startups.

Há milhares de startups no Brasil e centenas de incubadoras, aceleradoras e hubs. No entanto, algumas empresas perceberam que, dependendo do tema, pode ser útil explorar além-mar. O Brasil tem ecossistemas em expansão, mas não há dúvidas de que existem alternativas mais desenvolvidas em determinados setores fora do país. Por exemplo, serviços financeiros em Londres, Cingapura e Hong Kong, óleo e gás em Houston, biotech em Boston e inteligência artificial em Israel. Para extrair o máximo dessas conexões é preciso saber o que você quer. Além disso, é importante entender a visão das startups sobre esse tipo de relacionamento.

4) Entender a visão das startups

As startups correm contra o tempo e têm recursos escassos e disponíveis por tempo determinado até uma futura captação de recursos ou geração de caixa suficiente para pagar suas contas. Atualmente, são mais de 4.000 grandes empresas com iniciativas organizadas de relacionamento com startups no Brasil. Esse excesso de oferta causa um processo duplo de seleção. Não são apenas as grandes empresas que selecionam as startups. As melhores startups também selecionam as empresas com quem priorizam trabalhar. E o fazem a partir do entendimento do grau de maturidade da companhia para esse tipo de relacionamento.

Tempo é dinheiro. Tamanho e volume de negócios são métricas de sucesso. Startup não é uma fábrica de software para a produção de soluções sob medida. Também não é um fornecedor convencional para aplicar as mesmas regras com que são avaliados e priorizados os fornecedores de matéria-prima.

No jogo, grandes clubes de futebol e grandes empresas não podem se dar ao luxo de esperar que os melhores negócios batam à sua porta. Para encontrar as melhores soluções para seus desafios é preciso ir atrás com clareza de propósito e entendimento do mercado.”

Maximiliano Carlomagno
É sócio-fundador da Innoscience, consultoria de inovação corporativa que trabalha com empresas como Roche, Coca-Cola, Duratex, Hypera Pharma. SLC Agrícola, Sicredi, M. Dias Branco, Braskem, Nestle, Ipiranga e Avon. É autor do livro “Gestão da Inovação na Prática”.

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