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Psicólogos foram – e serão – essenciais para a IA

O papel desses profissionais no surgimento da inteligência artificial é pouco reconhecido. Mas isso deve mudar

Alexandre Nascimento
Psicólogos foram – e serão – essenciais para a IA
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O Nobel de Física de 2024 premiou o cientista da computação britânico Geoffrey Hinton e o físico americano John Hopfield pelas suas contribuições para o desenvolvimento de técnicas que permitem aos computadores aprender com dados, no processo que ficou conhecido como “machine learning” – ou, em português – aprendizado de máquina. 

Hinton dedicou sua carreira acadêmica inteira ao aperfeiçoamento das redes neurais artificiais e suas aplicações. O trabalho dele permitiu um avanço sem precedentes no campo da inteligência artificial, e nem mesmo nos chamados invernos da IA (os períodos em que a tecnologia caiu em descrédito por não entregar tudo o que prometia), ele jogou a toalha.

Hinton seguiu em frente, isto sim, e ajudou a consolidar as redes neurais artificiais como a base das soluções computacionais que hoje reconhecem imagem, voz, padrões em dados e fazem previsões. A IA que usamos atualmente deve bastante a seu trabalho como cientista da computação – e como psicólogo.

Muitos podem achar surpreendente que Hinton também seja psicólogo cognitivo, mas o fato é que o campo da IA surgiu e se desenvolveu com contribuições da psicologia (e também da neurociência, biologia, matemática e filosofia), além da própria computação. Não poderia ser diferente, pois a IA busca entender os princípios de funcionamento dos humanos e outras espécies na resolução de problemas e nos processos cognitivos para poder imitá-los por meio de modelos computacionais. 

E Hinton não está só. Outros psicólogos foram essenciais para a IA. É o caso de Frank Rosenblatt, que, na década de 1950, criou uma das engrenagens mais importantes para o desenvolvimento das redes neurais artificiais, que permitiriam que Hinton fizesse seu trabalho. Rosenblatt propôs um modelo matemático baseado no funcionamento dos neurônios. Batizado de perceptron, é considerado uma das primeiras redes neurais artificiais. 

A partir da criação de Rosenblatt, surgiu o perceptron de várias camadas (MLP, na sigla em inglês), que imita um pequeno cérebro com vários neurônios conectados e é capaz de aprender relações muito mais complexas entre variáveis – na prática, ele podia reconhecer imagens ou dizer qual o tipo de doença uma pessoa tinha a partir dos dados apresentados.

Além de Rosenblatt, David Rumelhart e James McClelland são outros exemplos de psicólogos que fizeram grandes contribuições para o desenvolvimento da IA. Talvez o trabalho de todos eles seja menos celebrado porque, com o tempo, a IA incorporou estudos de diversos outros campos, como computação, engenharia e medicina, e, com isso, nós passamos a ter a impressão de que essas são as únicas áreas que respondem pelas inovações no setor. Mas, sem os psicólogos, não teríamos chegado até aqui. 

É muito importante valorizar a contribuição dos psicólogos à inteligência artificial. Isso porque hoje, mais do que nunca, a IA precisa da psicologia. Hoje, mais do que nunca, nós precisamos de uma IA alimentada pelo trabalho desses profissionais. 

Ora, se um algoritmo passará a ser nosso conselheiro em várias esferas de nossas vidas, como imaginar o futuro da relação entre humanos e IA sem o envolvimento dos psicólogos para tornarem essa relação mais segura, criarem limites e mecanismos de autorregulação?

Tivemos uma amostra dos problemas que virão, quando, em outubro último, um adolescente americano se suicidou (aparentemente) por conta de uma relação amorosa com uma personagem criada por IA. 

Os psicólogos não foram fundamentais apenas no desenvolvimento do campo da inteligência artificial; eles serão cada vez mais necessários daqui em diante.

Alexandre Nascimento
Alexandre Nascimento realiza pesquisas aplicadas em tecnologias inovadoras ligadas a algumas das principais universidades do mundo, como o próprio MIT, Stanford e Singularity University, e é empreendedor em série, hoje sediado no Vale do Silício. Tem trabalhado com desenvolvimento de inteligência artificial desde 1998, possuindo diversas patentes na área.

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