Pesquisa, formação de ecossistemas e novos negócios estão na agenda dos líderes de inovação aberta para os próximos anos
O sucesso do South Summit, em Porto Alegre, e a maciça presença de brasileiros no South by Southwest (SXSW) 2023, em Austin, nos Estados Unidos, evidenciam nosso gosto por tendências. Essa vontade de antecipar o futuro quem sabe seja produto de anos de pura turbulência econômica. Algo como aquele voo de São Paulo para Curitiba no final de tarde em pleno verão que você sabe que vai balançar.
Na correria do dia a dia o ser humano tem uma necessidade quase existencial de saber o futuro. Mesmo que o futuro seja um lugar que só exista nas nossas imaginações ou ansiedades. Queremos ver, antes que os demais, o que pode potencializar ou ameaçar nossas carreiras e negócios.
O ambiente de negócios é sedento por futuro. Como disse o ex-presidente do Banco Central do Brasil, Gustavo Franco, “a economia é uma profissão em que não há base científica para o ofício de profeta, mas há enorme demanda por profecia”. Profecia é uma coisa, tendência é outra.
Tendências são padrões emergentes de comportamento tecnológico ou mercadológico observáveis. Há tendências sobre diferentes temas empresariais, como RH, sustentabilidade, experiência do consumidor e, claro, tendências em inovação corporativa.
Participei recentemente do Panela Cast, o podcast da plataforma de inovação aberta da Nestlé onde a Carol Falcowski, responsável pelo Panela, me questionou sobre as principais tendências em inovação aberta. Ao pesquisar no Google encontramos mais de 14 milhões de resultados de busca sobre inovação aberta. A California Management Review publicou recentemente uma edição especial sobre o tema. Destaco quatro tendências que visualizo potencial para os próximos 5 anos para aqueles que trabalham com inovação aberta.
As parcerias empresariais não se resumem a relação entre duas empresas como no caso entre a Ambev e a Switch App, por exemplo. A principal característica dos ecossistemas de empreendedorismo é a diversidade de atores. Investidores de risco, universidades, startups, corporações e governo. Determinadas soluções demandam a articulação com alguns desses atores, bem como hubs, aceleradoras, incubadoras e parceiros. Atuamos apoiando uma operadora logística que conecta startups e clientes corporativos como Nestlé no desenho conjunto de potenciais inovações. A Moove, em seu programa Moove Solutions Lab, integrou startups, distribuidores e clientes para conceber e testar novos serviços digitais. Como resultado a empresa lançou uma nova área de negócios: a Moove Engineering Solutions. A articulação de um volume maior de atores diversos traz desafios de governança mas promete a possibilidade de desenvolver projetos incríveis. Entendo que nos próximos anos veremos o crescimento desse tipo de abordagem para potencializar os ganhos da inovação aberta.
Nem todas as oportunidades de inovação são digitais e nem todas as empresas podem esperar que algo tenha se transformado numa startup de 40 pessoas residente no Cubo em São Paulo para fazer negócios. Há um processo gradativo e consistente de fortalecimento da visão empreendedora em universidades brasileiras. Esse contexto, somado à escassez de recursos de financiamento para pesquisa, amplia a possibilidade de reconectar a inovação aberta com a produção científica brasileira. Empresas farmacêuticas, de cosmético, tecnologia e energia já perceberam o potencial de se envolver com pesquisas antes que tenham se transformado em startups. Clusters de inovação como o Tecnopuc, Porto Digital e Supera Parque são algumas das estruturas nas quais as empresas estabelecidas podem buscar potenciais alternativas. O nível de prontidão dessas tecnologias, também conhecido como technology readiness level (TRL) varia muito. Há tecnologias que ainda estão em fase de pesquisa. Por isso, as empresas devem articular diferentes formatos de relação, como uma pesquisa de longo prazo sob demanda, um licenciamento imediato de tecnologia ou um consórcio de pesquisa com concorrentes. O crescimento da concorrência, busca por inovações além do digital e a necessidade de monetizar o conhecimento existente nas universidades brasileiras deve potencializar a inovação aberta com a universidade, mesmo que existam desafios de timing, linguagem e mentalidade relevantes.
Ecossistemas de empreendedorismo são esses aglomerados de empresas, universidades, investidores de capital de risco e empreendedores que, juntos, criam condições para a criação de novos negócios inovadores. Ecossistemas de negócio são conjuntos de diferentes empresas que, sem uma relação hierárquica, se relacionam cooperativa e competitivamente para entregar uma nova proposta de valor a um usuário final, normalmente conhecidos como plataformas de inovação, por exemplo, Apple, Salesforce, Amazon e Google. As plataformas normalmente tem um orquestrador e um conjunto de complementadores que potencializam a oferta geral. Essas plataformas geram os chamados efeitos de rede, diretos e indiretos. Quanto mais de um ator tem no ecossistema, mais de outros querem estar. As empresas mais valiosas do mundo tem implementado essa estratégia. Não é trivial. No entanto, a mentalidade de inovação aberta é um primeiro passo para consolidar essa abordagem que percebo deve se acentuar a partir da integração desses dois ecossistemas usando soluções de startups como complementadores de produtos e serviços existentes. No Brasil, a empresa de tecnologia VTEX ou a empresa de bebidas Ambev, tem feito esse movimento.
O cenário atual é de contração de investimentos em exploração do novo e maior foco em inovações incrementais de eficiência operacional. Estive em três reuniões recentemente com diretoria de clientes onde escutei que a estratégia é “”back to basics””. O CEO da Havaianas disse ao Brazil Journal que depois de 3 anos de foco em crescimento agora o tema é “arrumar a cozinha”. O aumento da taxa de juros e impacto na disponibilidade e custo de capital fez com que as empresas se tornem mais seletivas em explorar. Todos querem inovações disruptivas mas na prática, atualmente, não é o cenário dominante. O padrão atual é direcionar inovações para o core business. É exatamente nesse contexto que a inovação aberta pode servir de alavanca para novos serviços e modelos de negócio. A crise vai passar. Em breve teremos um novo ciclo de crescimento. No novo ciclo, aqueles que tiverem semeado novos negócios estarão em vantagem. Isso não quer dizer que a empresa deva concentrar todos esforços em novos negócios. Apenas que a erradicação completa desse tipo de movimento irá cobrar um preço alto no futuro. A necessidade de criação de novos negócios origina-se nos menores ciclos de vantagem competitiva e nas incríveis oportunidades que a revolução digital traz para empresas incumbentes. Aproveitar essa tendência, mesmo que seletivamente, pode ser uma oportunidade interessante. O Zé Delivery, a CashMe ou a AWS da Amazon não foram criados do dia para a noite, no tempo que sobra. Ninguém faz nada incrível sozinho no tempo que sobra.
A inovação aberta é uma mentalidade e uma abordagem gerencial de gestão da inovação. Permite reduzir riscos, acessar novos recursos e acelerar o desenvolvimento de novos projetos.
Nos próximos anos, devemos vivenciar mais casos de inovação aberta multiatores formando ecossistemas que permitam a criação de novos negócios.
É pagar pra ver.”