Compreender os desafios e a importância da média gerência dentro das organizações colabora para o desenvolvimento de boas estratégias de D&I
“Diversidade e inclusão (D&I) continua sendo uma das principais prioridades das organizações, e encontrar o caminho para essa transformação cultural tem sido um dos maiores desafios atuais. O que vemos frequentemente é um movimento vindo de colaboradores individuais, clientes, cadeia de fornecedores, investidores e toda a sociedade que pressiona CEOs e vice-presidentes a se responsabilizarem pelas mudanças que esperam todos esses stakeholders.
O quadro geral da maioria das empresas que estão buscando crescer alguns dígitos em suas metas de D&I, é basicamente o seguinte: de um lado, colaboradores pressionando suas lideranças sobre práticas, atitudes e comportamentos mais inclusivos e, de outro lado, comitês executivos e CEOs cobrando números e resultados sobre a implementação das estratégias de D&I.
No meio disso tudo está uma camada importantíssima das organizações, formada por gestores e gestoras da linha de frente, o famoso middle management ou gerência média. Essa camada está espremida, esmagada e congelada, por isso apelidada de frozen middle.
O termo é usado para estereotipar gerentes de nível médio, que supostamente bloqueiam o progresso de uma organização por falta de capacidade, motivação ou por medo de correr riscos. Essa camada de gestão tem um papel crucial em garantir a execução bem-sucedida das iniciativas e estratégias desenhadas lá em cima pela alta liderança, principalmente quando falamos de transformação cultural; ou seja, o papel desses gerentes é o de traduzir estratégia em execução.
Contudo, o que acontece com frequência é que as estratégias organizacionais são desenvolvidas de forma isolada, por um grupo pequeno de tomadores de decisão, o que acaba levando a um cenário em que as demais pessoas não acreditam no plano proposto. Seja boa ou ruim, uma estratégia desenvolvida desta forma pode ser difícil ou quase impossível de implementar, e é o que vemos acontecendo com os programas de D&I nas organizações.
Para entender a falta de engajamento das ações dessa camada, mesmo acreditando no propósito da empresa e querendo continuar crescendo em suas carreiras, é importante entendermos os desafios que essa média gerência enfrenta. Muitas dessas pessoas estão em seu primeiro cargo de liderança e isso inevitavelmente causa medo, principalmente o medo de falhar.
Há um temor em não atender às expectativas de todos os lados (líderes e times) e esse estresse pode resultar em mau desempenho e menor tendência a tomar de riscos. E todos nós sabemos que arriscar menos é uma receita infalível para termos menos inovação e os piores resultados.
Essa média gerência também está sobrecarregada. Além disso, muitas vezes ela precisa cumprir direcionamentos executivos sem os recursos necessários para fazê-lo, o que os fazem adotar uma postura defensiva e negativa quando novos projetos aparecem. Esse grupo se sente não valorizado e não recompensado de forma justa e essa insatisfação pode ser percebida pelos seus times o que agrava o sentimento de isolamento.
A média gerência sente não pertencer a nenhum grupo social em sua organização, pois muitos deles foram promovidos para cargos de chefes de seus antigos pares e, assim, deixam de fazer parte desse grupo.
Outro dia um colega comentou que não o tiraram do antigo grupo de WhatsApp do time, mas criaram outro sem ele e pararam de utilizar o que ele estava. No entanto, esse grupo também não faz parte do grupo do nível de liderança acima deles e, quando olham para o lado, preferem não confiar em seus pares, talvez por considerá-los concorrentes. Como resultado, esse isolamento social afeta a performance e o engajamento dessa camada média de gestão.
Para finalizar o raio-x dos desafios da média gerência, muitos reportam ter dificuldades para que suas ideias sejam consideradas relevantes, e o nível elevado de crítica da liderança leva a um sentimento de questionamento de suas próprias competências para o cargo que ocupam.
Todos esses fatores somados levam a um comportamento de letargia e fadiga que afeta negativamente a capacidade deles de criar valor para a organização e, por isso, o engajamento em qualquer atividade extra é visto como uma carga pesada demais para eles.
Se a estratégia de diversidade e inclusão tão bem desenhada pela alta liderança falhar, o problema vai acabar caindo sobre quem não conseguiu implementá-la, ou seja, a média gerência. No entanto, não se desesperem, pois há algumas pistas do que pode ser feito para descongelar esse “frozen middle” e trazê-los de volta para o jogo. A primeira delas é envolvê-los no desenho da estratégia.
Em um estudo do Insead, os pesquisadores observaram que 80% dos 117 projetos iniciados pela alta liderança falharam ou ficaram abaixo das expectativas. Em contraste, 80% dos iniciados por gerentes de nível médio tiveram sucesso, gerando US$ 300 milhões em lucros anuais para uma empresa de telecomunicações.
A conclusão do estudo é a de que nas condições certas, a média gerência não bloqueia as mudanças, mas conduzem modificações porque possuem algumas competências e vantagens que o restante das pessoas da organização não possui. Por exemplo, gerentes de nível médio conhecem mais pessoas, estão mais perto delas e são mais influentes do que gerentes e executivos seniores. Como acompanham de perto o dia a dia dos colaboradores, e estão mais sintonizados com o humor e com as necessidades emocionais deles, a média gerência ajuda a impulsionar as mudanças que a estratégia de diversidade e inclusão demanda.
Outra maneira de tirá-los da inércia é usando influenciadores internos, capazes de modelar o comportamento desejado. Esses influenciadores podem ser encontrados em todos os níveis da organização e precisam conhecer a fundo os desafios que estão causando essa estagnação, para provocar a mudança.
Essa média gerência também precisa liderar e serem agentes ativos nesse processo, pois sabem antes de qualquer outra pessoa o que está funcionando ou não. Muitas vezes a resistência deles é porque não acreditam que aquela ação vai funcionar e por isso não se engajam.
Não adianta só cobrar atitudes desses gerentes, é necessário também prepará-los e prover as ferramentas que precisam para acelerar a transformação que a liderança tanto almeja. É imprescindível ajudá-los a aprender novas maneiras de trabalhar e converter esse conhecimento em resultados produtivos, identificando as habilidades necessárias, particularmente as habilidades pessoais que são essenciais para liderar transformações.
Descongelar o frozen middle não é tarefa fácil, mas sem essa etapa nada do que for decido sobre transformação cultural, vai realmente ser implementado na sua organização. Se você pretende fazer sua média gerência congelada trabalhar para você, primeiro você precisa respeitar seu poder e compreender o porquê da inércia, além de envolvê-los na concepção da estratégia.
As falhas no processo de transformação não são causadas por um grupo apenas, mas, ao compreender o que passa na camada da média gestão, você conseguirá identificar algumas alavancas que vão desbloquear as barreiras que impedem a inclusão de acontecer.
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