O futuro promete uma gestão descentralizada e a web3 possibilitará a consolidação de um ecossistema online desse modo, baseado em tecnologia blockchain
Escrito em co-autoria com o professor da Inova Business School, Cássio Pantaleoni, autor do livro Humanamente digital e um estudioso do movimento de convergência entre máquinas e humanos, o tema da tecnologia e digital monopoliza agendas e prioridades na gestão.
As derivadas das novas possibilidades dos negócios decorrentes do avanço das tecnologias encaminham os recursos digitais para um protagonismo recorrente. Desde seu início, a revolução dos dados tem oferecido possibilidades exponenciais para as empresas e para os governos, mantendo o estatuto de ser o principal núcleo de inovação. Gradativamente, a transformação digital desfia o tecido carcomido dos tradicionais paradigmas organizacionais. O que se firma no horizonte dos próximos anos serve bem à filosofia da descentralização, da inclusão, da otimização e da extensão do mundo físico para sua versão virtual.
Para os negócios que se obrigaram a apressar os seus projetos transformadores em função da pandemia, as tendências que impuseram novas jornadas digitais para clientes e colaboradores promoveram a descoberta de grandes oceanos azuis.
No horizonte destes oceanos, já é possível dar ao metaverso o estatuto de grande laboratório para a economia da hiperpersonalização. É neste espaço e em seus ambientes derivados, que a inteligência artificial (IA) infiltra raízes profundas, onde a ética digital e a garantia dos direitos à segurança e à privacidade passam a pesar o valor reputacional das organizações.
Diante deste quadro, a inevitabilidade da guerra por talentos instiga novas práticas de atração, formação e capacitação acelerada de profissionais. Vista como a terceira geração da internet, a web3 possibilitará a consolidação de um ecossistema online descentralizado e diversificado baseado em tecnologia blockchain – serviços e páginas online produzidos em uma rede de computadores interconectada que garante suas funcionalidades sem censura, limite ou remoção deliberada de conteúdos específicos. O futuro promete gestão descentralizada.
A primeira tendência a observar é o uso do metaverso como espaço de convergência física e digital para os negócios em diversos ambientes passíveis de diversas utilizações.
Impulsionado pela indústria de jogos, o metaverso já supera as indústrias de filmes e música combinadas. Sua consolidação causará grande impacto social e econômico, dada suas características imersivas, transformando o modo como trabalhamos, vivemos e socializamos.
Dado que o metaverso simula um ambiente 3D, diversas capacidades tecnológicas se tornam necessárias: Internet of Things (IoT), IA, criptomoedas, non-fungible tokens (NFTs), dispositivos de realidade aumentada (AR) e realidade virtual (VR), aplicações distribuídas (Dapps), entre outras.
A combinação desses elementos propicia explorar centenas de milhares de mundos virtuais, jogar interativamente, comprar ativos digitais, investir em ativos digitais ou criar avatares que representem os seus usuários do modo como eles querem ser representados.
Sua consolidação demanda migrar o modelo de rede centralizado para um modelo descentralizado, exigindo aplicações digitais que sejam executáveis em uma rede blockchain de computadores, ao invés de residir em um único dispositivo.
É o que se denomina web3, ou seja, uma arquitetura que dispõe de programas livres de controle ou interferência de uma autoridade única. Tal característica possibilitaria a segurança da privacidade do usuário, a ausência de censura, a flexibilidade de desenvolvimento e, por consequência, o aumento da produtividade. Tudo isto compreende aspectos essenciais para o funcionamento adequado do metaverso, ainda nos seus primeiros passos.
A evolução desta tecnologia promove a coevolução da realidade aumentada (AR) e realidade virtual (VR), que demandam dispositivos cada vez mais leves e de baixo custo, impulsionando consideravelmente a indústria de wearable devices (dispositivos vestíveis).
Em função do seu caráter imersivo, tal tecnologia exige ações específicas para constituir o que se denomina “confiança digital”.
Até o presente momento, a IA e o machine learning (ML), cumpriram importante papel para os projetos de transformação digital. Tal qual a eletricidade, a IA serve a objetivos diversos. Ela possibilita a otimização e a automação de processos de qualquer indústria.
Como correntemente o desenvolvimento da IA acontece de maneira heterogênea, devido às suas diferentes áreas de aplicação e paradigmas (i.e. modelos de processamento da linguagem natural, reconhecimento de imagens, reconhecimento facial, chatbots, análise preditiva, análise prescritiva etc), as questões de responsabilidade ética ainda são tratadas à luz de perspectivas distintas. Contudo, será cada vez mais importante unificar todas estas ilhas em um continente único (uma Pangeia da IA) onde o humanismo digital prevalecerá.
Leve-se em conta que os potentes modelos generativos de transdutores pré-treinados, os casos de uso de dados sintéticos (que se contrapõem às gigantescas bases de dados usadas para treinar os modelos) e à necessidade de incorporar ML em dispositivos de IoT, demandam regulação de interesse internacional. A Pangeia da inteligência artificial será alcançada mediante esta demanda.
Uma lei geral da IA, fundamentada no humanismo digital, dará às empresas responsabilidades relativas ao potencial da tecnologia. O desenvolvimento acelerado de deep learning e neural networks por laboratórios como o DeepMind será reconduzido pelas vias da ética, da privacidade e da transparência dos algoritmos. A inevitável explosão da inteligência artificial nos colocará mais próximos de discussões sobre os impactos da cultura digital na sociedade.
Não há dúvidas de que a evolução digital tem proporcionado novas perspectivas para o trabalho. Desde o início da pandemia, as empresas se obrigaram a acelerar suas reflexões sobre as jornadas digitais de seus clientes e colaboradores.
Uma vez que as pessoas entenderam que os recursos tecnológicos possibilitam o trabalho remoto de maneira satisfatória, notou-se uma transformação no comportamento dos indivíduos. Os benefícios do trabalho remoto resultaram em mais tempo junto à família, reduziram o tempo de trânsito e possibilitaram dedicação a projetos pessoais. Inevitavelmente, o trabalho remoto veio para ficar, indiferentemente dos desejos das lideranças.
O fato é que não há mais uma linha divisória entre trabalho e vida privada. Em função disso, as organizações precisam de liberdade para compor produtos e serviços que dão conta do ser humano que ocupará a posição. Na guerra por talentos, o vencedor será aquele que tiver a habilidade de escutar atentamente os candidatos em uma perspectiva dupla: as expectativas da empresa e as expectativas do indivíduo.
Quando se observa o fenômeno da grande resignação, que tem levado um significativo contingente de colaboradores a deixar seu trabalho, verifica-se que um dos maiores motivos é a percepção das pessoas de que elas não são escutadas legitimamente por suas lideranças. Elas simplesmente não veem seu progresso, sua real importância.
A digitalização faculta aos talentos viver de maneira mais produtiva, tanto no que diz respeito aos objetivos profissionais como pessoais. E diante de um mercado global, onde não importa mais onde se vive e como se vive, não há mais restrição. Cada pessoa pode trabalhar remotamente em qualquer empresa do planeta.
Flexibilidade deverá ser a palavra-chave, tanto a física como a cultural.
O hype dos non-fungible tokens (NFTs) concede espaço para a descentralização financeira. As criptomoedas, legitimadas pela tecnologia do blockchain, se associam rapidamente às NFTs para servir de meio de compra e venda de ativos digitais.
A NFT legitima a prova de propriedade e as criptomoedas sustentam o escambo sem a necessidade de modelos tradicionais de movimentação financeira.
Até então, se você detém uma propriedade qualquer, seja um bem imóvel, um carro ou um título do governo, é possível vendê-la ou alugá-la. No caso de um imóvel, por exemplo, é possível usá-lo como garantia para aquisição de crédito visando a aquisição de um novo bem.
No mundo dos ativos digitais, entretanto, a figura do agente intermediário – o banco – é substituível por smart contracts que viabilizam a transferência, o tratamento e a movimentação das NFTs. Os bancos se tornam entidades redundantes em um mundo descentralizado e legitimado pelo blockchain.
Entre as características das NFTs que colaboram para a descentralização do segmento financeiro são:
– A possibilidade de fracionar a propriedade de um ativo digital, ou seja, vários proprietários usufruem do mesmo ativo.- A possibilidade de escassez (escassez digital) em função de edições limitadas de ativos digitais cunhados por um limitado número de NFTs.- O caráter único das NFTs, ou seja, não é possível encontrar duas NFTs idênticas.- A transparência e autenticidade garantida pelo blockchain.- Sua interoperabilidade, ou seja, podem ser negociadas através do blockchain em conexões descentralizadas.
Estas características concedem às NFTs o poder de criar novas maneiras para gerar receita. Qualquer coisa que for desejada por um consumidor pode ganhar valor, seja por meio da confecção, da venda, do aluguel ou de um modo distinto de empacotamento. Além disso, linhas de investimento podem ser obtidas através de modelos de crowdfunding.
Os próximos anos remodelarão o escambo, o crédito e o investimento.
Segundo matéria da Forbes, estimava-se em 2021 que 93% das empresas estavam vulneráveis a ataques de criminosos digitais. As empresas que se tornaram vítimas destes ataques tiveram vazamento de dados comprometedores, como o caso do LinkedIn, que em 2021 teve 700 milhões de registros vazados.
Prevê-se que os hackers, scammers, deep fakes, malware, ataques de phishing e outros tipos de ação criminosa no meio digital serão responsáveis por prejuízos de mais de US$ 10 trilhões em 2025.
Diante de tal cenário, especialistas no assunto aludem a ideia de uma abordagem para sistemas de segurança baseada em confiança zero. Ou seja, todo e qualquer agente que interage com algum dispositivo digital é merecedor de total falta de confiança por definição, sendo inicialmente sempre uma ameaça aos sistemas.
A grande tendência para os próximos anos, enquanto assistimos à consolidação do metaverso e do aperfeiçoamento crescente da IA, é o estabelecimento de arquiteturas zero trust (confiança zero). Isto requererá verificação de identidade de qualquer agente que solicite conexão.
Em um mundo dotado de drones, carros autônomos, sensores digitais, plataformas de metaverso, consoles de jogos, smartphones, computadores pessoais e wearable computers com IA embarcada, as arquiteturas de segurança zero trust deverão tirar proveito do blockchain para compor a criptografia adequada para proteger dados, serviços, sistemas, redes, etc.
Contudo, para pequenas e médias empresas, perseguir o ideal de zero trust demanda custos incabíveis. A tendência do aumento da virtualização e a adoção de soluções baseadas em nuvem que tenham arquiteturas zero trust pode “democratizar” a abordagem.
Além disso, observa-se a disponibilização de soluções de cibersegurança como serviço, em que ML e deep learning cumprem o papel de agentes primários no combate ao cibercrime.
A sofisticação dos ataques às organizações aos seus sistemas e dados, além do ataque aos usuários dos serviços digitais, exigirá a educação contínua sobre segurança. Há uma clara tendência de estabelecer programas de atualização contínua para colaboradores. O objetivo é expandir a capacidade de desconfiar de conteúdos, de identificar pequenas mudanças de processos, manuseio de identidades virtuais, etc.
Na próxima década, a cibersegurança deverá ser pauta recorrente nas organizações.
Estes, entre outros possíveis temas, são conceitos que nos direcionam a importância das tendências para a nossa jornada de gestão. Caberá a cada um de nós decidir como melhor aplicá-la.”