Baterias são estratégicas para uma transição energética mundial sustentável
Toda fonte de energia ligada a fenômenos naturais, e que se renova sem gerar grandes impactos ambientais, é considerada renovável. Já a energia limpa é aquela que não emite nenhum tipo de poluente no ato de geração. Dentre as renováveis, há alternativas mais ou menos limpas. “A usina hidrelétrica de Belo Monte (PA) é renovável e é limpa, porque no momento da geração de energia não emite nenhum poluente. A biomassa, no entanto, é uma energia renovável que não é limpa, pois tem geração de metano”, explica Markus Vlasits, conselheiro da Associação Brasileira de Energia Solar Fotovoltaica (Absolar).
Especialistas do setor como Vlasits são otimistas quanto ao futuro das energias limpas, especialmente a eólica e a solar fotovoltaica. No Brasil, onde o Sol e o vento são abundantes e capazes de oferecer muita energia, o crescimento desses players tem sido robusto – com potencial de colocar o país entre os benchmarks mundiais da transição energética. A questão é que ainda há desafios a serem superados, como a intermitência e as mudanças climáticas. Desafios esses que podem ser superados por tecnologias de armazenamento da energia gerada pelas fontes renováveis.
Usinas hidrelétricas como Furnas (MG) e Emborcação (GO-MG), construídas entre as décadas de 1970 e 1980, contam com reservatórios que funcionam como “baterias”. Mas são as de íons de lítio que estão se destacando – as mesmas usadas pela fabricante de carros elétricos Tesla. Segundo a consultoria Wood Mackenzie, o mercado de baterias elétricas deve crescer 2.700% até o fim da década.
Alimentadas pelo excesso das energias solar e eólica, as grandes baterias de íons de lítio têm potencial disruptivo. Por exemplo: elas podem recolher o que é produzido pelas usinas eólicas durante a madrugada – energia que muitas vezes é desperdiçada, pois não há grande demanda – e injetar quando necessário à rede elétrica. E se considerarmos que 16,4% da energia brasileira é furtada ou perdida por razões técnicas, tanto em linhas de transmissão quanto em redes da distribuição, as baterias carregadas por geração distribuída são outra forma de combate ao desperdício.
A Tesla projeta no Texas a criação de uma super fazenda de baterias, capaz de reter 100 megawatts de energia. Seria suficiente para abastecer 16,4 mil casas em um dia quente de verão. A empresa não revelou detalhes sobre a dimensão do projeto. Mas, para efeito de comparação, o modelo Megapack, cujo tamanho se assemelha ao de um contêiner, tem uma potência de 0,8 megawatt. E é um sucesso de venda, com direito a fila de espera – está esgotada até 2023. Nos EUA, cada Megapack da Tesla custa cerca de US$ 1,2 milhão. Estima-se, contudo, que o custo da bateria de íon de lítio caia 68% entre 2020 e 2050, segundo a consultoria BloombergNEF.
A Califórnia lidera a corrida global de armazenamento de energia em baterias. Em 2020, quando o estado americano enfrentou uma onda de calor sem precedentes, foram elas que ajudaram a aliviar o sistema pressionado pelo excesso de uso de ventiladores e ar-condicionado. Mais de 30 mil baterias injetaram no sistema elétrico a mesma quantidade de energia de uma usina movida a gás natural de médio porte. O pico de fornecimento chegou a 147 megawatts. O abastecimento só não foi maior, cerca de 530 MW, devido a entraves burocráticos e de regulação estadual. (Hoje, no Brasil, as baterias só são permitidas no modelo off-grid, sem a possibilidade de compartilhar com a rede pública.)
Há quem torça o nariz para as baterias. O argumento mais utilizado é que as usinas de gás natural são mais seguras, menos poluentes que o carvão e relativamente baratas – ignorando o fato de que em duas décadas é possível pagar o investimento em baterias e ainda economizar recursos dispensados com combustíveis fósseis. Por outro lado, a tecnologia atual tem a desvantagem de fornecer eletricidade apenas por períodos curtos, de quatro a seis horas. O que, claro, é insuficiente para lidar com a demanda e possíveis oscilações da geração eólica e solar.
E existe outro problema: risco de incêndios. Segundo uma reportagem do jornal Financial Times, houve 38 incêndios em baterias de íons de lítio desde 2018. A última ocorrência em uma superfazenda de baterias foi em agosto de 2021, em Moorabool, Austrália. O local abriga o Victorian Big Battery, uma das maiores instalações da Tesla no mundo, com 210 baterias Megapack. Os bombeiros levaram três dias para conter as chamas. Isso porque o fogo só apaga com o esfriamento da bateria – que produz oxigênio sozinha ao se romper, criando sucessivos focos de incêndio.
Em fevereiro passado, o navio cargueiro Felicity Ace, que transportava milhares de veículos de luxo, pegou fogo e ardeu em chamas por dias, alimentado em parte pelas baterias dos carros elétricos a bordo. Embora os incêndios em veículos sejam raros, há um certo risco de inflamabilidade, especialmente à medida que os veículos elétricos se tornam populares. Em sua defesa, o presidente da Tesla, Elon Musk, disse que pretende criar variantes de suas baterias com fosfato e ferro em lugar de níquel e cobalto, mais adequadas e seguras para grandes instalações.
Outra alternativa é acoplar baterias menores para armazenamento de energia na própria casa, a ser usada entre 18h e 20h, horários de pico de consumo. “O volume de consumo não corresponde ao de geração de energia, por isso a bateria é importante. É o meio de fazer o casamento entre consumo e geração de forma eficiente. A bateria fará o papel de regular a carência de energia nos horários de pico”, explica Claudy Marcondes, diretor de operações da 2W Energia.
A Tesla já oferece o modelo Powerwall, que vale em torno de US$ 7.500. Neste caso, os carros elétricos também funcionam como uma bateria, mas sobre rodas. Segundo Marcondes, “escolher a energia renovável, poupar o planeta e zerar o carbono” significa pensar no futuro dos negócios e das próximas gerações. “Conseguir fazer isso com economia seria o melhor dos mundos.””