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Sim, a geração Z gosta de trabalhar. E tem muito a ensinar sobre o modelo híbrido

Jovens de 20 e poucos anos sabem valorizar os benefícios do escritório. O problema real não está neles, mas em conciliar demandas diferentes de gerações diferentes quanto ao modelo híbrido. Confira cinco ideias para enfrentar esse desafio e fazer com que os mais velhos e os mais jovens se ajudem a trabalhar bem no mundo “figital”

Brian Elliott e Amanda Schneider
19 de julho de 2024
Sim, a geração Z gosta de trabalhar. E tem muito a ensinar sobre o modelo híbrido
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Pessoas da geração Z, aquelas que estão na faixa dos 20 anos, muitas vezes são alvo de piadinhas sobre sua suposta falta de engajamento no trabalho e sua relutância em se deslocar para escritórios e interagir com os colegas. Só que a realidade é muito diferente.

Pesquisas mostram que, comparados a funcionários de outras idades, esses jovens são os mais propensos a querer estar no escritório dois ou três dias por semana. Sim, eles estão confortáveis com opções híbridas e trabalhando em casa, mas eles também se sentem sedentos por socialização presencial e pelo tipo de aprendizado que vem da interação com colegas mais experientes.

Esse é um desafio para as empresas que ainda estão tentando encontrar o melhor desenho para locais de trabalho, as políticas mais adequadas e os modelos de interação que possam sustentar uma cultura próspera – e, talvez o mais importante, atender às necessidades de aprendizado e desenvolvimento das gerações mais jovens. Mas juntar gerações em busca de melhores resultados organizacionais exigirá mais do que simples soluções ditadas por políticas uniformes.

A conexão natural é impulsionada por estar no mesmo ambiente. Com a tecnologia certa, isso também pode acontecer online – um formato particularmente natural para os funcionários mais jovens.

Para as empresas, isso quer dizer que elas precisam investir em um emaranhado de treinamento e suporte, tecnologia, espaços físicos redesenhados e comunicação bidirecional que atenda aos trabalhadores, onde quer que eles estejam. Significa criar ambientes digitais e físicos que promovam conexão, colaboração e produtividade.

Ou seja, os líderes devem fazer parte desses ambientes. Isso é absolutamente necessário para desenvolver o grupo de trabalhadores mais jovens e ajudar a construir organizações que que terão sucesso no futuro.

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ESPAÇOS FÍSICOS ADEQUADOS PARA TODOS

Em nossa experiência como pesquisadores e consultores, vemos muitas empresas em que os funcionários mais jovens vão para o escritório, mas a camada intermediária de gestores, logo acima deles, não vai. Comparecer ou não ao escritório é algo, muitas vezes, guiado por demandas familiares e fases da vida diferentes. O que cada grupo etário precisa, em termos de flexibilidade na vida profissional, varia um bocado.

Desde 2020, uma pesquisa trimestral realizada com mais de 10 mil profissionais administrativos mostra, consistentemente, que o grupo mais jovem é o menos propenso a querer trabalhar de maneira totalmente remota ou totalmente presencial. Enquanto 78% dos funcionários da geração Z dizem poder trabalhar bem remotamente, 86% deles também dizem que a principal maneira de criar novas conexões profissionais é por meio de experiências presenciais.

As empresas entendem que os trabalhadores mais jovens querem e precisam de mentores. Mas a ideia de forçar os gestores intermediários a estarem no escritório três ou quatro dias por semana, para interagir com os juniores, não funcionou.

A primeira razão para isso é que esses gestores são os profissionais mais esgotados. Em geral, eles lidam com a combinação da carga individual de trabalho e a da liderança (um terreno em que, com frequência, eles são estreantes).

A segunda razão é que as equipes e seus gestores estão mais dispersos geograficamente do que costumavam ser. Na Microsoft, por exemplo, a porcentagem de equipes em que todos os membros estão no mesmo local caiu de 61% antes da pandemia para 27% hoje. Os gestores da linha de frente têm que liderar pessoas em diferentes locais e fusos horários, não apenas no andar de um prédio.

O risco de perder líderes experientes ao impor sanções é alto. Pesquisas recentes mostraram que a obrigatoriedade de retorno ao ambiente físico, e a consequente desconfiança, levam ao desgaste exatamente daqueles que todos querem como moderadores e treinadores: os de alto desempenhoos mais experientes e os líderes executivos.

Como os formatos únicos mostram que não são benéficos nem para empresas nem para funcionários, algumas organizações estão deixando para os gestores o fardo de decidir o que funciona melhor para suas equipes. Mas esses gestores estão recebendo pouco ou nenhum apoio: 75% das empresas não deram a eles qualquer treinamento sobre como liderar uma equipe remota. Também está claro em nossas conversas com centenas de líderes, em diversas organizações, que qualquer gestor pode se prender ao que lhe é familiar, na crença de que o trabalho lado a lado é a única maneira de novos funcionários se conectarem e aprenderem.

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AS EMPRESAS PODEM APRENDER COM O JEITO DA GERAÇÃO Z DE SE CONECTAR

Para a maior parte da liderança sênior, a cultura e as conexões foram construídas no ambiente físico. Ferramentas digitais tinham mais a ver com produtividade e eficiência. No entanto, hoje temos duas gerações de nativos digitais com fluência físico-digital. Cultura, conexões e produtividade acontecem perfeitamente em seu mundo “figital” (físico + digital).

Por exemplo, a geração Z está acostumada a usar o autoatendimento para encontrar informações. Se eles precisam descobrir como criar uma tabela dinâmica no Excel, não perguntam a um colega de trabalho, vão direto para o YouTube.

É o que mostrou um estudo de seis meses comparando preferências de aprendizagem entre gerações: a geração Z é mais propensa a usar os recursos do YouTube do que qualquer outra. Mas, quando se trata de uma consulta pessoal, esses jovens não deixam claro o que os orienta na busca: muitas vezes, hesitam em entrar em contato com mentores e colegas porque não sabem se eles estão disponíveis ou não querem incomodá-los. Isso se aplica tanto em situações no escritório quanto ao trabalho remoto. Os membros da geração Z também não querem parecer ignorantes e preferem “fazer a lição de casa” antes de procurar ajuda.

Além disso, muitas empresas estão firmemente estabelecidas em um modelo de aprendizagem que favorece os extrovertidos e as pessoas que se parecem e pensam como seus gestores. É uma forma que não cria maneiras adequadas para dar um feedback mais profundo para funcionários de todas as idades e origens.

Tivemos centenas de anos para desenvolver normas sociais geralmente aceitas no mundo físico, mas ainda estamos aprendendo a adaptar essas práticas a um mundo híbrido. Formas assíncronas de trabalho e ferramentas virtuais ainda parecem desajeitadas. Porém, construir relacionamentos online e aproveitar ao máximo as interações assíncronas é o que a geração Z faz muito bem, e com muita naturalidade. E aí está uma pista para ajudar as equipes híbridas a desenvolver maneiras modernas de se conectar.

CINCO IDEIAS PARA ENFRENTAR O DESAFIO DO TRABALHO HÍBRIDO

Como lidamos com esses desafios, especialmente considerando que a maioria das equipes em muitas empresas agora está distribuída em várias cidades e fusos horários? Será preciso investir em ferramentas digitais e ambientes físicos que ajudem a promover conexão, colaboração e produtividade, assim como olhar para seus trabalhadores mais jovens para saber como usar essas opções. Aqui estão cinco das melhores ideias que já vimos.

1. Construa conexões, cultura e oportunidades de mentoria digitalmente, não apenas fisicamente. A conexão hoje é multimodal. Os líderes precisam enxergar a construção de cultura como algo que acontece tanto em tempo real, presencialmente, quanto em ambiente digital. Uma maneira de ajudar os executivos a entender isso é comparar com feiras de negócios: depois de conhecer alguém pessoalmente, o avanço do relacionamento em geral se constrói no modo virtual. Da mesma forma, a geração Z está mais propensa a não apenas se conectar no escritório, mas também a aproveitar ferramentas digitais (e-mail, Slack/Teams etc.) para aprofundar conexões e conseguir novas.

Pequenas medidas podem ter grande efeito. Regras claras, como um horário de expediente digital para gestores (por exemplo, das 10h às 11h de segunda a quarta-feira) ajuda os colegas mais jovens a saber quando não há problema em bater em portas virtuais para obter conselhos.

Por outro lado, a liderança deve capacitar os funcionários da geração Z a criar conteúdo e fóruns para serem mentores dos colegas mais velhos nos novos recursos e formatos, seja uma programação de almoço e aprendizado ou uma demonstração de compartilhamento assíncrono de vídeo. Eles também podem incentivar o uso de plataformas de comunicação para a construção de cultura: por exemplo, em uma empresa de consultoria, o canal para fãs de tênis e cultura urbana de um funcionário evoluiu de um pequeno espaço para alguns amigos que trocavam informações para um canal com milhares de funcionários de departamentos em todo o mundo. Essa nova forma de conexão oferece um meio de construir laços mais gerais.

2. Invista no redesenho dos locais de trabalho como hubs de conexão. Projetos de escritórios abertos, dedicados apenas ao trabalho individual e concentrado, não atendem às necessidades da maioria das equipes atuais. Os espaços podem ser reaproveitados para apoiar um trabalho mais colaborativo, criativo e flexível.

Em vez de simplesmente reduzir a metragem para economizar custos, envolva as equipes para que elas deem sua contribuição para o projeto. Obtenha várias perspectivas e leiautes antes de investir em mudanças em grande escala.

Quando as vendas da Gucci estavam em queda, ela criou um grupo de funcionários jovens não executivos para serem consultados pelos líderes sobre iniciativas estratégicas. Sua contribuição ajudou a empresa a reformular produtos e a marca para se conectar com um público mais jovem.

As vendas cresceram 136% em quatro anos. Da mesma forma, um grupo interno de conselheiros formado por pessoal mais jovem pode apresentar suas próprias ideias sobre o design do escritório.

3. Incentive as equipes a criarem suas regras de funcionamento. Acordos de equipe são diretrizes de como um time deve trabalhar. Essas regras geralmente incluem uma combinação sobre as expectativas de tempo de resposta, as ferramentas de comunicação que seus membros devem usar, os motivos e a frequência das reuniões – por exemplo, sessões mensais de planejamento para uma equipe de engenharia ou terças-feiras para revisão da clientela em uma equipe regional de vendas.

As regras são especialmente importantes para os novos funcionários, mas há enormes benefícios em envolver todos na sua criação. Os membros da equipe que revisam regularmente suas regras de trabalho têm quase duas vezes e meia menos probabilidade de deixar seu emprego em comparação com outros funcionários. As equipes que definem suas políticas de trabalho juntas também se mostraram mais eficazes e felizes.

4. Meça o sucesso pelos resultados, não pelas atividades ou participações aparentes. A mera circulação pelo ambiente não garante a gestão de equipes fisicamente dispersas. Monitorar horas ou toques no teclado só piora a situação: os funcionários conseguem driblar a vigilância aparecendo para o cafezinho ou mexendo o mouse.

Para conseguir saber se está funcionando, concentre-se nos resultados. Os funcionários são mais produtivos e engajados quando podem contar com flexibilidade e confiança para administrar seus horários e quando são avaliados pelos resultados com os quais se comprometeram.

As empresas também podem alavancar o espírito empreendedor e a energia jovem da geração Z propondo como metas certos desafios que eles possam ajudar a resolver. Esclareça o objetivo final, mas deixe em aberto como eles serão alcançados. Em seguida, recompense pública e autenticamente o progresso no atingimento desses objetivos.

5. Treine a média gerência para comunicar metas e expectativas com clareza. Os líderes da linha de frente que têm maior risco de burnout precisam de aconselhamento tático, treinamento e ferramentas. O ônus de fazer o local de trabalho funcionar melhor não pode recair apenas sobre eles.

Especialmente na era híbrida, os gestores precisam ser treinados em como conduzir uma boa reunião individual. Uma sessão semanal de 30 minutos deve, em princípio, discutir os avanços em relação às metas da semana anterior, as prioridades da semana atual e os obstáculos que o funcionário está enfrentando. Encontros regulares melhoram o desempenho e oferecem espaço para o diálogo sobre o que está funcionando e o que não está.

Ferramentas como um pequeno manual sobre cada indivíduo também podem preencher lacunas no entendimento entre colegas de equipe. Saber quem é uma pessoa matutina versus uma coruja noturna, ou quem gosta de entrar em uma conversa de brainstorming versus ter tempo para digerir uma ideia, pode ajudar o gestor a construir equipes intergeracionais mais eficazes.

Se a ideia de implementar todas as nossas recomendações parece pesada demais, os líderes podem começar conversando com seus próprios funcionários e descobrir quais fazem mais a diferença. Ter um grupo dedicado de pessoas em recursos humanos, TI e comunicações voltadas para a criação de práticas de trabalho flexíveis mais eficazes pode ajudar muito a aplicar essas ideias e fazer das organizações ambientes mais produtivos.

O ESSENCIAL É ENTENDER A DUPLA IMPORTÂNCIA DESTE MOMENTO. Nunca antes foi tão importante se preocupar com o aprendizado e OV desenvolvimento dos trabalhadores da geração Z. Igualmente, nunca antes foi tão importante aprender com eles.

Esse grupo deverá representar cerca de 27% da força de trabalho até 2025. Seria bom que as empresas trouxessem esses funcionários mais jovens diretamente para a conversa e os envolvessem no processo de descoberta do que é investir em colaboração e conexão presencial e digital.

Embora muitas organizações ainda estejam lutando para redefinir o próximo normal neste mundo híbrido, dá para afirmar que o futuro já está chegando às empresas em que as próximas gerações de líderes estão engajadas.

Brian Elliott e Amanda Schneider
Brian Elliott é consultor corporativo nos EUA e coautor de “How the Future Works: Leading flexible teams to do the best work of their lives”. Amanda Schneider é fundadora do ThinkLab e apresentadora do podcast Design Nerds Anonymous, também nos EUA.

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