O melhor time para esta década

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Editorial

Certa vez, há uns quatro anos, um famoso app de mobilidade me fez entrar na contramão.

Isso poderia ter causado consequências graves para mim, para o meu filho no banco do passageiro, e para outros carros e pedestres. Sem falar nas potenciais perdas financeiras. Acabou-se ali minha confiança no aplicativo. Aconteceu só uma vez, mas devo dizer que, até hoje, essa confiança não foi completamente restaurada.

Pois o Brasil, assim como o app, está perdendo a confiança do mundo. Não que o País tenha sido um motorista exemplar ao longo de sua história, mas, agora, ele definitivamente entrou na contramão. E pelo menos três vezes. A primeira foi com a aversão das autoridades federais à ciência e aos dados, o que se traduz na flacidez das medidas preventivas e do plano (?) de vacinação contra a Covid-19, no desestímulo à preservação ambiental, no desprezo por qualquer tentativa de se criar estratégias para a inovação e para a educação no País, e por aí vai.

Uma segunda contramão, relacionada com a primeira, é a aversão ao futuro. Com a interdependência global cada vez mais compreendida, nossa falta de ambidestria não nos torna apenas párias planetários; viramos uma ameaça aos demais.

E quando, em vez de nos afastarmos da economia de carbono, insistimos em dar incentivos ao consumo de diesel e gasolina, essa ameaça fica mais clara ainda. (A paráfrase trágica a Stefan Zweig é: Brasil, País sem Futuro.)

A terceira contramão, eu diria, é a aversão à globalização.

Isso até soa como piada num mercado onde 90% dos princípios ativos dos medicamentos vêm da China e da Índia, mas é uma piada que custa cada dia mais caro às empresas e aos consumidores brasileiros.

Porém o que mais nos choca na MIT Sloan Review Brasil não é o fato de que pegar a contramão tantas vezes está nos levando para a beira do abismo. O pior é a comunidade empresarial não se posicionar contra isso. Há exceções louváveis, mas elas perdem tração quando uma pesquisa XP/Ipespe mostra 55% dos entrevistados avaliando o atual líder da República como ótimo, bom ou regular.

Falando dos respondentes que atuam em negócios, só posso achar que aplicaram o conceito de “trade-off ” onde não cabia – porque não cabe aceitar essa destruição de vidas e de valor (valor presente e futuro) em troca, por exemplo, da aprovação de reformas e de algumas privatizações. Além de esse ganho na troca poder ser sonho de noite de verão, um pensamento utilitarista assim tem tudo para dar péssimos resultados em tempos de investidores ESG. E omitir-se no caos talvez torne o pensador mais parecido com um corruptor do que ele gostaria – a diferença entre os dois é legal, não moral.

O conselho editorial desta revista nos cobrou um posicionamento público cristalino em relação ao que ocorre no Brasil, porque isso é o certo a fazer. Então, ei-lo. Queremos nos fortalecer eticamente com as três ações propostas no artigo “Como construir uma organização eticamente forte”, da revista nº 2: reconhecer a ambiguidade ética (éramos ambíguos ao silenciarmos), deixar claros os nossos compromissos éticos (este editorial) e garantir o comportamento exemplar da liderança (estamos nos expondo com essa intenção e convidamos nosso leitorado a fazer o mesmo). É perfeitamente possível ser ético e ter bom desempenho, não importa o que reze a lenda, e nossos conteúdos reiteradamente provam isso.

No dia 8 de julho de 2020, nossa instituição-mãe, o MIT, iniciou, com Harvard, um processo contra o então governo Donald Trump por sua decisão de deportar estudantes estrangeiros que estavam tendo aula só online. Trump queria forçar as universidades a abrirem os campi na pandemia. No dia 13, mais de 200 instituições já apoiavam MIT e Harvard, e Trump recuou. Rafael Reif, presidente do MIT, se declarou profundamente inspirado pelo movimento. Temos um benchmark.

O melhor time para esta década
Adriana Salles

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