A possibilidade institucionalizada de home office pode, sim, ser uma (revolucionária) ferramenta de aceleração da equidade de gênero
Ano passado fizemos um evento de atração de talentos aqui na Oracle só para mulheres. Nossa intenção era (e é) estreitar o relacionamento com essas profissionais para que elas nos conheçam melhor e queiram trabalhar na nossa empresa. Fizemos uma pesquisa rápida com as mais de 60 participantes no dia do evento e perguntamos em uma palavra o que é um fator de decisão para mulheres quando buscam um novo emprego. A resposta com mais votos foi FLEXIBILIDADE. E quando falamos de millenials, estudos têm mostrado que 40% das pessoas desse grupo etário consideram flexibilidade no trabalho um dos principais fatores na hora de decidir se aceitam ou não uma oferta de trabalho.
Nos últimos dias, muitas pessoas ao redor do mundo começaram a testar um novo modelo de trabalho, o tal home office. Mas muitas empresas ainda temem implementar práticas como essa no seu dia por acreditarem que seria mais difícil manter o engajamento e a rotina de seus colaboradores. No entanto, empresas que implementaram regime de trabalho flexíveis e com políticas de home office tem reportado bons resultados de performance e redução de absenteísmo, além da redução de custos de espaço. Para os colaboradores, há impactos positivos diretos sobre o equilíbrio entre vida profissional e pessoal, melhorando o bem-estar e reduzindo o estresse resultante do deslocamento diário.
Mas um benefício que pode ser gerado indiretamente por essas políticas é a relação direta entre as políticas de home office e o aumento da diversidade de gênero em muitas empresas. Um relatório recente feito por consultores da Timewise e da Deloite constatou que o local de trabalho tradicional foi projetado para uma estrutura familiar na qual uma pessoa ficaria em casa e outra sairia para trabalhar. E, infelizmente, as mulheres continuem assumindo a maior parte da responsabilidade pelos cuidados infantis e outras tarefas não remuneradas.
Estudos no Reino Unido demonstraram que dar às mães acesso a trabalho flexíveis diminuiu significativamente a probabilidade de elas abandonarem a carreira após o nascimento do primeiro filho. Também diminuiu a probabilidade de reduzirem o horário de trabalho após a maternidade. Em países onde é comum a prática de trabalho no regime _part-time_, considera-se essa uma das causas mais importantes da persistente diferença salarial entre homens e mulheres e a flexibilidade seria uma arma importante para ajudar a reduzi-la.
Construir uma cultura em que a flexibilidade é a regra e onde colaboradores são julgados pelos resultados e não pelo presenteísmo, pode ser uma tremenda oportunidade para mulheres. Essa política beneficia claramente todas as pessoas que trabalham, mas para as mulheres em particular, a flexibilidade vai além de permitir um melhor equilíbrio entre casa e trabalho. Também pode permitir que mais mulheres que retornam depois de um período ausente sejam altamente produtivas, mantendo-as no caminho das promoções e crescimento de carreira que reduzirão a desigualdade.
Mas é importante ter em mente que trabalho flexível em culturas onde não há uma divisão igual de trabalhos domésticos e cuidados com os filhos entre homens e mulheres, pode reforçar papéis de gênero e prejudicar as mulheres. Estudos mostram que os homens, em média, são mais propensos do que as mulheres a trabalhar mais horas e têm maior probabilidade de se preocuparem mais com as tarefas do trabalho do que com as demandas de cuidados em casa, o que não é o caso das mulheres. Muitas mulheres, especialmente mães ou responsáveis por cuidar, não sentem que podem prolongar seus dias de trabalho e acabam aumentando seu tempo em atividades no lar, o que não acontece com os homens. Por isso é importante pensar em um modelo onde o número de horas trabalhadas por semana ou dia tenha um limite, tanto para homens como para mulheres, para que os dois possam colaborar na divisão das responsabilidades familiares e manter os mesmos níveis de produtividade no trabalho.
Para atrair mais talentos femininos, é importante que as políticas de trabalho flexíveis estejam claras nos anúncios de oportunidades de emprego. No entanto, as políticas por si só não são suficientes e é importante que seja uma realidade quando as candidatas forem contratadas. Para isso, é necessário mudar a mentalidade do trabalho flexível, implementar processos, prover ferramentas necessárias, entender os diferentes estilos de trabalho e dar suporte as mulheres. Uma boa maneira de começar é implementar a política de _home office_ em algumas equipes, com um projeto piloto. Entender erros e acertos e depois implementar em larga escala, pode poupar tempo e garantir um melhor retorno e aceitação de todos os envolvidos.
Isso não quer dizer que a flexibilidade por si só possa resolver o problema da desigualdade de gênero. As questões envolvidas são complexas e específicas da cultura demais para desaparecerem apenas como resultado de mudanças na maneira como e quando as pessoas trabalham. Porém, se homens e mulheres tiverem mais controle sobre seus horários de trabalho e puderem construir vidas mais equilibradas, isso deverá resultar em um impulso significativo em direção a uma maior igualdade. Essa é uma das lições que podemos aprender depois dessa pandemia.