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O impacto positivo da pandemia para empresas de tecnologia

É preciso entender que alguns segmentos beneficiados pela pandemia continuarão favorecidos pela mudança de hábitos que gera nova demanda. E que as empresas precisam de um modelo de negócio exponencial para aproveitar isso – apoiado em velhas e novas leis

Raphael de Cunto e Juliana Soares Zaidan Maluf
18 de junho de 2024
O impacto positivo da pandemia para empresas de tecnologia
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Como será o mundo pós-Covid? É a pergunta que monopoliza reuniões, webinars e palestras atualmente. Se, por um lado, setores como aviação, hotelaria e eventos sofreram um colapso durante a pandemia, o que resultou no fechamento de muitas empresas ou redução substancial de seus funcionários, outros aproveitaram a desorientada crise para acelerar o desenvolvimento de seus negócios e conquistar sua base de clientes.

Podemos avaliar, sob um breve diagnóstico, três movimentos que ditarão os mais variados segmentos, sobretudo, os de empresas de tecnologia:

• No primeiro grupo, encontram-se as empresas que aproveitaram uma mudança repentina de consumo, mudança essa que provavelmente não se sustentará, como as empresas de aplicativos desenvolvidos exclusivamente para disseminação de informações acerca da pandemia, as de produtos de prevenção (como os mais variados tipos de máscaras) e as de produtos de higiene e limpeza diretamente relacionados ao combate ao vírus.

• Em outro grupo, estão os segmentos que tiveram mudança repentina de crescimento, que deverá se estabilizar no alto consumo, como plataformas de trabalho remoto e ensino a distância e empresas com atuação na área de telemedicina.

• O terceiro grupo é composto de segmentos que viveram, com a pandemia, a aceleração de um crescimento já existente, como plataformas de streaming, deliveries (em especial aqueles que envolvem supermercados, farmácias e restaurantes) e e-commerce

O esperado para as empresas do primeiro grupo é que serão reacomodadas para o patamar pré-pandêmico quando tudo se normalizar. Já no caso do segundo grupo, estudos demonstram que algumas mudanças de hábito vieram para ficar – aparentemente o consumidor incorporou à sua rotina determinadas atividades e gostou.

Por exemplo, o “tabu” do home office foi quebrado por muitas empresas tradicionais e com a utilização de ferramentas específicas como Zoom, Hangout Meetings e Skype ficou ainda mais evidente que o trabalho remoto funciona e a produção nem sempre é afetada. O Zoom teve sua popularidade disparada com a determinação pelos governos do home office e a transferência das aulas para o ambiente virtual, saindo de 10 milhões de usuários em dezembro de 2019 para 200 milhões em março de 2020. Mesmo com as suspeitas levantadas sobre privacidade, as ações que valiam US$ 68 em janeiro, fecharam no dia 22 de abril em US$ 150,25.

Por sua vez, o EAD veio como solução tanto para substituir as aulas presenciais de escolas e universidades, como para preencher o tempo de muitos que optaram por aproveitar o período de reclusão para adquirir mais conhecimento – seja por meio de cursos online ou consumindo conteúdos entregues via apostilas e lives. E teve um crescimento exponencial com isso.

Em São Paulo, a startup Eu Me Banco, fundada em 2019, investiu em geração de conteúdo para atender a demanda crescente de profissionais em busca de capacitação à distância durante a pandemia. “As matrículas nos outros cursos que disponibilizamos na plataforma Eu Me Banco também estão numa crescente desde março. Os resultados são impressionantes, tanto que batemos nosso recorde de alunos e de faturamento em meio à pandemia”, afirma Fabio Louzada, fundador da Eu Me Banco.

As empresas com atuação na área de telemedicina tiveram seu crescimento impulsionado pela sanção da Lei n. 13.989/2020, que autorizou a prática, em caráter emergencial, enquanto perdurar a pandemia. As ações de telemedicina autorizadas compreendem o atendimento pré-clínico, suporte assistencial, consulta, monitoramento e diagnóstico por meio da tecnologia da informação, diretamente entre médicos e pacientes.

A título de exemplo, a empresa catarinense TopMed é a responsável pela tecnologia e pelo atendimento do Ministério da Saúde, mas o serviço desenvolvido para o governo é apenas uma parte dos seus produtos, que oferece a outras empresas tecnologias voltadas à medicina e diferentes modalidades da telemedicina, como teleorientação e teleconsulta. No início da pandemia, a TopMed verificou um aumento de 760% no atendimento remoto aos pacientes.

O avanço da telemedicina foi uma quebra de paradigma e muitas empresas do ramo apostam que se os serviços a serem prestados forem realizados com alto nível de excelência durante a pandemia, tal fato pode contribuir para uma melhor regulamentação do segmento frente à alta demanda.

Do terceiro grupo, podemos destacar a colombiana Rappi, cuja operação brasileira, conforme seu relato, registrou uma demanda três vezes maior a partir de março quando comparado com os meses anteriores, além de registrar pico de crescimento no número de pedidos de cadastros de entregadores em seu aplicativo. Muitos brasileiros que perderam seus empregos ou tiveram redução salarial como reflexo da pandemia buscam nestas atividades autônomas uma renda complementar.

Vale acrescentar ainda que dados da Associação Brasileira de Comércio Eletrônico (Abcomm) informam um aumento de 30% nas vendas pela internet durante as duas primeiras semanas de abril.

Nos Estados Unidos, a Amazon anunciou no dia 13 de abril deste ano que contrataria algo em torno de 75 mil novos funcionários para atender o aumento da demanda só no mercado norte-americano. No dia 16 de abril, seu valor de mercado foi recorde, atingindo US$ 1,2 trilhão, uma valorização de 28,6% no ano.

Modelo de negócio escalável

A lista de empresas de tecnologia beneficiadas pela pandemia é longa. Mas o ponto que temos observado ao acompanhar esses movimentos de perto no Pinheiro Neto Advogados é outro. Em tempos de incertezas, há uma certeza, algo comprovado: o isolamento social despertou novos hábitos e, com eles, vieram novos vícios e a quebra de paradigmas. O foco das empresas de tecnologia ainda é atender às necessidades de seus consumidores e usuários de maneira disruptiva. Soluções digitais – antes inexistentes ou ainda tímidas na rotina – passaram a se incorporar no dia a dia, tornando-se essenciais. Provavelmente muito em breve veremos novas tecnologias que levarão esses hábitos adquiridos na pandemia a novos patamares, como por exemplo o uso de realidade virtual em EAD.

Quando a demanda cresce repentinamente, o que acontece? Empresas com modelo de negócio exponencial, que escala facilmente, levam vantagem sobre as que têm modelos tradicionais.

Como será o mundo pós-Covid? Poucos sabem. Mas a certeza é que as tech companies mais ágeis, adaptáveis e com essa exponencialidade tenderão a se consolidar no mundo pós-crise e continuarão se destacando quando novas janelas de oportunidades surgirem.

N. da E.: Recomendamos também a leitura deste artigo da última edição da MIT Sloan Review Brasil sobre a dinâmica competitiva da colisão.

Raphael de Cunto e Juliana Soares Zaidan Maluf
Raphael de Cunto é sócio da área de tecnologia de Pinheiro Neto Advogados Juliana Soares Zaidan Maluf é associada da área M&A, private equity e venture capital da Pinheiro Neto Advogados. Eles escreveram este artigo com exclusividade para o Fórum SMR de direito digital.

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