Em um ambiente de muitas incertezas e constantes mudanças, não basta que haja resiliência no plano individual; a empresa como um todo precisa ter essa capacidade – e construí-la depende basicamente dos líderes
Se a resiliência é uma característica cada vez mais valorizada em líderes e times, pergunto: sua empresa tem um programa estruturado para formar líderes e times resilientes? Recentemente, tive o prazer de participar da gravação de um podcast com Dr. Gene Coughlin, fundador de um programa chamado Resilience-Building Leader Program (RBLP), bastante conhecido aqui nos Estados Unidos. Na conversa, ele me contou como percebeu a necessidade de existir algo assim. Após uma extensa carreira militar, ele tinha se aposentado e começado a atuar como consultor. Nessa mudança de carreira, ele se surpreendeu com a falta de resiliência dos líderes e de seus times. Esses profissionais, apesar de seus altos gabaritos, sucumbiam ao enfrentar até pequenas crises ou adversidades.
Para Dr. Gene foi fácil perceber esta realidade e o impacto negativo dela. Isso porque, no exército, os times são preparados para adversidades e mudanças que podem ocorrer num campo de batalha. Já no dia-a-dia do mundo corporativo, vivemos a síndrome do sapo escaldado. As coisas vão acontecendo, os líderes não percebem ou ficam na inércia, e acabam literalmente cozidos! E o pior, levam seus times e, às vezes, toda a organização junto com eles. (Detalhe: como a revista The Atlantic já mostrou, não é verdade que o sapo não foge da água que esquenta; são só os gestores mesmo que são cozidos.)
É preciso desenvolver a resiliência coletivamente, não apenas em nível individual. Quando organizações desenvolvem a resiliência, todos os líderes ficam atentos às adversidades, possuem a mente aberta ao novo, promovem o aprendizado, constroem times de ponta, e têm coragem para fazer as mudanças que são necessárias para sobrevivência da empresa no curto e longo prazo.
Os líderes resilientes apresentam modelos mentais e mecanismos de enfrentamento diferenciados, tais como:- Autocontrole emocional.- Capacidade de manter a energia elevada mesmo sob pressão.- Habilidade para lidar com mudanças disruptivas.- Coragem para se adaptar e promover mudanças.- Facilidade em promover a recuperação após contratempos.- Superação de grandes adversidades sem comportamentos disfuncionais ou danos psicológicos aos outros.
O último ponto é particularmente importante. Muitos líderes se auto proclamam resilientes por entregarem resultados, serem ágeis, e por sua capacidade de reagir às crises. Porém, a forma como reagem é nociva para si e para os outros. Alguns reagem com comportamentos disfuncionais que ofendem ou causam estresse emocional aos colaboradores e pares. Esses são os líderes tóxicos. Outros líderes direcionam seus comportamentos disfuncionais para si mesmos, e acabam desenvolvendo diversas doenças psicossomáticas.
A construção de uma organização resiliente requer uma capacitação especializada, que possa também promover a reflexão e mudança individual dos líderes. A partir do momento que o líder desenvolve e incorpora os comportamentos de resiliência em seu dia-a-dia, ele passa a ser um multiplicador ao seu time.
Numa organização que decide promover a resiliência, é crucial começar essa construção pela linha de frente, que são líderes que estão diretamente com os clientes ou com o chão de fábrica. Isso porque é quando se está vendendo ou produzindo que as coisas acontecem, gerando receita e resultados.
Além disso, os líderes que estão na linha de frente têm contato diário com maior número de pessoas dentro e fora da organização. Portanto, uma mudança no comportamento destas pessoas pode ter um efeito exponencial nos resultados da organização.
O caminho para o desenvolvimento da resiliência organizacional impõe aos líderes ao menos três desafios.
O primeiro é construir times resilientes, com alto comprometimento, motivação, moral e coesão. Para que isso ocorra, cada líder precisa adotar três estratégias. (1) Criar um clima positivo, onde exista a confiança, respeito, responsabilidade e o prazer do trabalho em equipe.(2) Dar propósito ao time. Ou seja, criar uma visão de futuro que tenha significado.(3) Promover a coesão entre todos os integrantes. Assim, o líder precisa criar momentos para que interajam, discutam, celebrem e se divirtam juntos.
O segundo desafio do líder é facilitar o aprendizado do time. Times que aprendem conseguem solucionar problemas e superar desafios de maneira mais efetiva. Para promover o aprendizado do time, o líder precisa estabelecer metas efetivas a partir do propósito, encorajar o diálogo construtivo e honesto, e construir modelos mentais que sejam compartilhados por todos os membros do time.
O terceiro desafio é dar suporte ao crescimento organizacional. Pode-se dizer que o crescimento organizacional sustentável é obtido por meio de mudanças e construção de vantagens competitivas. Times resilientes contribuem para a formação do capital intelectual de uma organização, que é uma vantagem difícil de ser replicada, e isso é um suporte ao crescimento. É razoável dizer que o crescimento é uma consequência de times resilientes e do aprendizado organizacional.
A palavra “resiliência” é usada em diferentes campos do conhecimento. No campo da física ou engenharia, resiliência é a capacidade que alguns elementos têm de, após sofrerem um estresse ou deformação, voltar ao seu estado original. Pense em uma fita de borracha que, depois de ser esticada, volta à forma original.
Na psicologia, o termo se refere à capacidade de enfrentar adversidades. Diversos psicólogos definem resiliência como a capacidade de uma pessoa experimentar desafios, crises e dificuldades, mantendo seu estado emocional controlado. Essas pessoas, mesmo sob grande pressão, conseguem voltar com facilidade ao estado anterior ao momento em que o estresse ocorreu. Essa inteligência emocional permite que tais indivíduos vivam plenamente e com alto nível de consciência.
Na década de 1990, o termo resiliência foi incorporado à área de gestão. Foi então que surgiram novos conceitos como líderes e times resilientes. Apesar de eles existirem há mais de 20 anos, poucas organizações conseguiram desenvolver efetivamente a resiliência em suas lideranças. Nos últimos dois anos, com as incertezas geradas pela pandemia da covid-19, essa necessidade ficou ainda mais latente.”