Como criar uma empresa em que as pessoas tenham prazer genuíno em trabalhar
Esta é a segunda e última parte de uma série de artigos sobre felicidade no ambiente de trabalho.
Hoje cedo eu estava dando os últimos retoques nesta coluna e entrou o e-mail diário gratuito do “New York Times” com a notícia estarrecedora de que muitas empresas intensificaram seus monitoramentos via software de funcionários durante a pandemia. Gente, esse Big Brother não é o da Globo!
A ênfase recente em ESG é obviamente muito positiva. Mas não tenho visto muito foco em como criar e gerir empresas onde as pessoas realmente gostem de trabalhar. As afirmações de Richard Layard que expus na última coluna nos dão uma ideia da urgência do assunto.
A maioria dos meus leitores certamente concordará que algo precisa ser feito para tornar o trabalho um pouco mais agradável. Tem mais: a pandemia nos trouxe o movimento “Eu me demito”: milhares de pessoas em muitos países que não querem trabalhar em empresas que não atendem seus objetivos de bem-estar.
Pode ser que eu seja um otimista incorrigível (ouço risinhos mal abafados na última fila da plateia…), mas eu não enxergo conflito entre essas agendas, porque uma empresa tocada por gente feliz provavelmente também terá clientes felizes, fornecedores felizes, acionistas felizes. Isso será meio caminho andado para uma empresa que lida muito bem com meio ambiente, diversidade e inclusão. Duvido que me mostrem uma companhia com o firme propósito de aderir à agenda ESG, com dados que mostrem que estão inequivocamente nesse caminho, e que não tenha um ambiente espetacular de trabalho!
Eis minha lista mínima para você criar uma empresa em que as pessoas adorem trabalhar:- Comece por cultivar a sua autopercepção. Muitos vieses destrutivos vêm, em grande parte, inconscientemente, do/a próprio/a autor/a do redesenho. Lembre que autopercepção tem um componente interno (compreender-se) e outro externo (enxergar os outros).- Diferentemente do que se diz por aí, todo trabalho é pessoal. As pessoas só serão felizes trabalhando na sua empresa se você criar as condições para que todo mundo expresse isso. Comece a observar isso desde as entrevistas de recrutamento, identificando qual é o propósito de vida de todo candidato.- Lembre que o principal desmotivador de pessoas é o descompasso entre responsabilidade e autoridade: a pessoa mais próxima do problema tem que ter poder para solucioná-lo pelo menos 80% do tempo.- Leia o livro do Laloux (citado abaixo) independentemente de você gostar ou não de empresas sem hierarquia.- Inclua fornecedores-chave e alguns clientes na seleção das soluções para a sua nova organização.- Substitua o “errar menos” por “errar mais rápido”. Crie o hábito de fazer o exercício “lições que aprendemos” logo após o encerramento de cada projeto.- Seu modelo de reconhecimento e remuneração deve dar forte ênfase ao trabalho de equipe e pouca ou nenhuma ao desempenho individual.- Desenvolva métricas para avaliar como está progredindo. Inclua satisfação de clientes e de fornecedores. Chame a Best Places to Work e não contrate pesquisas de clima.- Ao considerar alguém para uma posição, abandone o modelo “já faz” e adote o “é capaz de fazer”. Contrate todo mundo que já pratica os comportamentos e valores da cultura que você pretende criar.- Algumas empresas selecionam quem melhor pratica a cultura e os valores que pretendem e treinam essas pessoas para serem influenciadores internos.
– Frédéric Laloux pediu as contas na McKinsey Bruxelas para sair pelo mundo evangelizando sobre empresas sem hierarquia. O livro dele é leitura obrigatória: Reinventando as Organizações: Um Guia Para Criar Organizações Inspiradas no Próximo Estágio da Consciência Humana.- Se você prefere um tratamento mais rigoroso do modelo flat, recomendo Self-Management, Entrepreneurial Culture, and Economy 4.0: A Contemporary Approach to Organizational Theory Development. São três autores com sobrenomes daqueles do Leste Europeu, em que as consoantes dão uma surra nas vogais. Excelente livro, e não precisa ler o Laloux antes.- Gary L. Neilson e Bruce Pasternack (que não escreveu Doutor Jivago) examinaram dezenas de empresas que são vencedoras há mais de vinte anos: Results: Keep What’s Good, Fix What’s Wrong, and Unlock Great Performance.- Por fim, já que qualquer iniciativa necessariamente passará pelo layout do escritório, recomendo visitar a nova filial de Helsinki da Airbus e observar os quatro tipos diferentes de ambiente: atividades comuns, trabalho focalizado, trabalho em equipe e treinamento.
Leia também a primeira parte: A maioria das pessoas não têm prazer nenhum no trabalho“