Não parece haver um problema de dinheiro, de dados, de sistemas, de satélites ou de estatísticas; o problema é de maturidade. Vamos usar o benefício da confusão para amadurecer?
Estamos todos participando, querendo ou não, do surgimento de novos padrões comportamentais sem precedentes graças à combinação de satélites, internet, smartphones e canais sociais. Estamos hiperconectados, não apenas observando, mas opinando e compartilhando, em volume e velocidade inéditos. E ainda não sabemos a potência que esse tsunami de ideias e rupturas pode alcançar.
Esses novos padrões ainda geram muita controvérsia, mas também são (in)convenientes e necessários para muitas causas. Dessa vez, foi a causa da Amazônia, e o que se viu foi uma repercussão épica. Os debates, sob o arcabouço das mudanças climáticas, aqueceram e enriqueceram a temática para todos os públicos, envolvendo pautas extremamente críticas e fundamentais na busca por soluções, como:
– Decisão de consumo e as co-responsabilidades dos atores da cadeia de valor.
– Relações internacionais, acordos comerciais e soberania.
– Territorialismo, legitimidade e direitos sobre a terra e sobre os recursos naturais.
– Desmatamento, queimadas, fiscalização e leis ambientais.
– Indígenas e populações especiais.
– Privacidade e segurança da informação.
– Tecnologia geoespacial.
– Geomonitoramento (em tempo ‘quase’ real).
Apesar de crescente, podemos considerar relativamente recente a macro-percepção de que os recursos são finitos, de que o mundo está ficando aquecido e escasso, de que precisamos produzir mais alimentos com menos recursos naturais – afinal, e inclusive, já temos e estamos em _overshoot day. É_ preciso ter mais clareza no reconhecimento do valor dos produtores; falta uma compreensão comum a respeito de quem decide sobre a posse da terra e o direito de explorá-la.
A oportunidade é que temos agora o benefício da confusão, e um ambiente fértil para desenvolver reflexões essenciais sobre o bem comum, a soberania das nações e os direitos e deveres legais dos indivíduos. As perguntas-chave são:
• Quais são “os custos e as oportunidades de manter a floresta em pé”?
• A quem pertencem?
• A quem importam?
Há que aproveitar a beleza do mundo conectado e da tecnologia disponível, uma vez que agora é possível individualizar as responsabilidades, as ações, as punições, os reconhecimentos, e tudo isso com muita transparência. Enfim, chegou a hora!
Ter uma base comum de conhecimento é pré-requisito para que nossa atual geração possa realmente surfar este momento, transformando críticas, discórdias e ataques, em um novo modelo de gestão do ativo (comum global) florestal.
Com isso, o próximo desafio é a capacidade de qualificar as áreas com floresta em seis critérios-chave:
1. influência hídrica;
2. biodiversidade existente;
3. carbono estocado;
4. aptidão agrícola;
5. relação fundiária;
6. legislação aplicável.
Pelo fato de todas as florestas mundiais serem classificadas como ativos globais, é esperado que a floresta amazônica seja reconhecida dessa forma. Os seis critérios podem tornar seu diferencial mais facilmente perceptível e isso vai tornar os diálogos sobre posse, usufruto, direitos e proteção bem mais coerentes.
A Amazônia total representa pouco mais de 17% de toda a floresta do mundo. Está na sua maior parte no Brasil (cerca de 60%), mas tem aproximadamente 30% de seu tamanho total nos vizinhos Peru, Colombia, Bolívia e Venezuela, e os 10% restantes divididos por Guiana, Suriname, Equador e Guiana Francesa . É preciso explicitar o benefício que a Amazônia, como floresta em pé, traz ao mundo e também conscientizar a todos que a Amazônia em si transcende muito a floresta, pois trata-se de um complexo ecossistema composto por diferentes e interdependentes climas, solos, subsolos, águas, terras, povos, riquezas e territórios que precisam ser levados em consideração em qualquer discussão séria.
E, já que a Amazônia viralizou, e que ela é vista como bem comum do mundo, que tal um plano de custeio e investimento global? Se cada cidadão e/ou internauta quiser, de fato, resolver o problema, basta colaborar, via crowdfunding, com US$ 0,05 para monitorar cada ‘campo de futebol’ amazônico. Seria uma espécie de cota de proteção e interesse global, garantindo assim, pelo menos o custo de monitoramento.
Enfim, não parece haver um problema de dinheiro, de dados, de sistemas, de satélites ou de estatísticas, e sim de maturidade geopolítica das nações e das populações. Maturidade para tratar com respeito e transparência o valor de um bem brasileiro, mas de alto interesse global, por seu enorme potencial de influência na vida da população mundial, e com preço em ascensão.
Pense fora da (sua) caixa. Considere a Amazônia um bem de todos, mas que tem dono, valor, leis, custos, e direitos de uso preestabelecidos.
Vamos ajudar a cuidar, custear, monitorar e valorizar.
A Amazônia agradece!