Muitas pesquisadoras de sucessos acabam no rodapé da história da ciência; nas áreas de STEM, o problema é ainda mais grave: além da falta de visibilidade, as mulheres não têm incentivos antes, durante e depois da formação
“200 anos: de acordo com o Fórum Econômico Mundial, esse é o tempo que levará para alcançar a igualdade de gênero no mercado de trabalho. Por enquanto, menos de 30% dos pesquisadores de todo o mundo são mulheres, e apenas 30% das estudantes optam por seguir em áreas relacionadas a STEM (ciência, tecnologia, engenharia e matemática) no ensino superior.
Entretanto, a US Bureau of Labor Statistics, a secretaria federal de estatísticas trabalhistas dos Estados Unidos, projeta que a contratação para cargos relacionados a STEM crescerá 3% a mais que outros cargos entre 2020 e 2030, e estima seu salário médio anual como dobro das demais ocupações. Assim, por que ainda há uma baixa taxa de entrada das mulheres nessas áreas? Resumidamente, podemos nomear três faltas: de incentivo, de representatividade e de contato antes do ensino superior.
A influência das mulheres na ciência é historicamente diminuída, negada ou completamente apagada. Nascida em 1799, Mary Anning tinha apenas 12 anos quando encontrou o esqueleto de um ictiossauro, 23 anos quando se tornou a primeira pessoa a encontrar um fóssil completo de pleiossaurus, e continuou a ser uma prolífica paleontóloga até o final da vida. Apesar disso, e de seu contato próximo com pesquisadores – que muitas vezes compravam seus fósseis –, ela raramente foi creditada nas publicações sobre suas descobertas e nunca foi aceita pela Sociedade Geológica de Londres – que ainda não aceitava mulheres, mesmo 57 anos após sua morte.
Infelizmente, Mary Anning não é a única mulher a ter suas descobertas relegadas aos rodapés da ciência até depois de sua morte. E é com essa longa história que meninas e jovens mulheres se deparam quando consideram as áreas de STEM.
O fenômeno da desigualdade de gênero nessas carreiras é presente tanto em países desenvolvidos quanto em desenvolvimento. Ao longo de décadas, estudos expuseram a falsa imparcialidade na percepção do gênero no mercado de trabalho, e apontaram que essa desigualdade ainda está muito inserida na cultura e nas estruturas organizacionais de empresas públicas e privadas.
Além de poucas referências próximas, há a distância do ensino superior: muitas meninas não têm contato com áreas de STEM no ensino médio, seja por falta de infraestrutura das escolas ou pela acessibilidade restrita em algumas regiões.
Na história moderna, a computação foi fortemente associada ao mundo masculino, em hobbies como os jogos eletrônicos, e, assim, as meninas que seguem nessa carreira muitas vezes são desestimuladas, ou inclusive, vítimas de assédio — apesar do pioneirismo de mulheres como a de Ada Lovelace.
Para as que concluem os estudos, no Brasil, grande parte do incentivo às pesquisadoras advém de financiamento público. Assim, foi possível observar ao longo dos anos o aumento de representatividade das docentes no ensino superior e consequentemente na pesquisa, alcançando 46% do total de acordo com o Open Box da Ciência. Contudo, isso não é suficiente, já que o abismo de gênero somado ao racial, étnico e de geográfico ainda existe.
Cerca de 35% das docentes são brancas e apenas 11% são pretas, pardas, amarelas e indígenas. Além disso, 85% não recebem bolsa de pesquisa, e entre as que recebem, as minorias estão sub-representadas. A representatividade feminina é ainda mais reduzida nas regiões Norte e Centro-Oeste.
A desigualdade de gênero dentro da comunidade acadêmica ou mercado de trabalho evidencia a necessidade de mais avanços para a maior inserção de mulheres nesses espaços. O apoio, reconhecimento e representatividade são necessários para a mudança desse contexto. Afinal, se falta visibilidade para exemplos de sucesso feminino, como podemos esperar que as mulheres vislumbrem seus potenciais nessas carreiras?””