Confira algumas das medidas preventivas que empresas podem adotar na implementação de algoritmos de precificação no Brasil
O uso crescente de Inteligência Artificial (IA) e machine learning para o desenvolvimento de algoritmos de precificação sofisticados cria oportunidades e eficiências econômicas, mas pode gerar riscos adicionais para empresas que fazem negócios no Brasil. No último artigo, apontamos os riscos atrelados ao uso de algoritmos de precificação.
A autoridade que cuida da defesa da concorrência no Brasil, o Conselho Administrativo de Defesa Econômica (Cade), ainda não enfrentou o desafio de julgar um caso que tratasse especificamente da legalidade do uso desses algoritmos. No entanto, já investigou empresas por acordo entre concorrentes associado ao uso de ferramentas de Tecnologia da Informação (TI) e tem aplicado de forma consistente a Lei de Defesa da Concorrência (Lei nº 12.529/11) nesses casos.
Para tanto, o Cade tem investigado se as organizações que utilizam programas de computador customizados conseguem acordar, manipular ou ajustar com concorrentes os preços de bens ou serviços oferecidos individualmente, o que é proibido pela Lei de Defesa da Concorrência.
A instituição acredita ter atualmente as ferramentas necessárias para lidar com investigações envolvendo a legalidade de algoritmos de precificação. Ao mesmo tempo, parece concordar com a vice-presidente executiva da Comissão Europeia para a estratégia Europe Fit for the Digital Age, Margrethe Vestager, que afirmou em 2017 que “as empresas não podem escapar da responsabilidade escondendo-se atrás de um programa de computador”, durante conferência na capital alemã, Berlim.
Considerando que o Cade já investigou empresas por cartel associado ao uso de ferramentas de TI e está bem ciente das preocupações levantadas por tais ferramentas de IA, a adoção de medidas acautelatórias é desejável para proteger negócios que pretendem implementar algoritmos de precificação no Brasil. Seguem cinco medidas sugeridas:
As empresas não devem fornecer informações sobre a estrutura de seu algoritmo de precificação publicamente ou para concorrentes. Ao compartilhar informações sobre a mecânica dos códigos, permitem que os concorrentes tirem conclusões sobre como os preços são definidos. Assim, para evitar investigações sobre adoção de condutas anticompetitivas, em que o desenho do algoritmo serve como um veículo para a troca de informações sensíveis, ou mesmo coordenação de atividades, deve-se evitar vazamentos de informações (mesmo não intencionais), considerando este tipo de dado como comercial e concorrencialmente sensível.
É aconselhável que as empresas se abstenham de implementar o mesmo algoritmo de precificação de seus concorrentes, desenvolvendo-os internamente. Presumivelmente, as preocupações com a caracterização de uma conduta anticompetitiva aumentam quando os concorrentes contratam a mesma fonte para desenvolver seus algoritmos. O uso intencional de algoritmos para implementar o mesmo esquema de precificação dos concorrentes aumenta as chances de o código ser interpretado como uma ferramenta digital para um acordo de fixação de preços.
Ao usar um algoritmo de precificação desenvolvido por terceiros, as empresas devem garantir que entendem e concordam com a mecânica dessa ferramenta. Considerando que alguns códigos sofisticados são projetados de forma que o raciocínio por trás de suas decisões é desconhecido até mesmo para seus programadores, é crucial entender a mecânica de um algoritmo de precificação de terceiros antes de implementá-lo.
O desenvolvimento dos algoritmos deve considerar trilhas de auditoria, pois autoridades como o Cade podem querer rastrear a lógica do mecanismo de mudança de preços. Portanto, deixe transparentes os fatores que levam os algoritmos a alterar os preços, pois impede a coordenação de valores ao possibilitar a vigilância. Margrethe Vestager, que certamente é seguida de perto pelos funcionários do Cade, já alertou que “o que as empresas podem – e devem – fazer é garantir o cumprimento da legislação antitruste desde o início do processo. Isso significa que algoritmos de precificação precisam ser construídos de uma forma que não permita que haja colusão”, segundo descrito pelos autores Marc Wiggers, Robin Struijlaart e Johannes Dibbits no livro Digital Competition Law in Europe: A Concise Guide.
As empresas devem desenvolver mecanismos para testar o algoritmo de precificação em uma base rotineira. O uso no dia a dia desses algoritmos pode propiciar uma coordenação involuntária e não programada ou esperada. Para evitar uma situação na qual os programadores não sabem se há conluio (tácito ou explícito), ou por quanto tempo eventual conluio está em andamento, é aconselhável que algum tipo de inspeção constante ocorra.”