
Debates no festival questionam como o ‘fator humano’ pode ser um diferencial competitivo decisivo no futuro com IA
Em um festival tão diverso quanto o SxSW (South by SouthWest), que aborda desde tecnologias revolucionárias até artes e música, tentar definir um único tema central pode parecer arriscado. Mesmo assim, decidi me aventurar.
Um dos meus grandes objetivos ao acompanhar presencialmente a edição deste ano foi entender o mood geral das pessoas que estão pensando nosso futuro. Quais perguntas ainda permanecem sem resposta? E como, enquanto humanidade, estamos comprometidos em resolvê-las num futuro próximo? Para onde caminha a humanidade?
Logo no início, o SxSW 2025 deixou claro qual seria o tom desta edição: pessoas. Em seu discurso de abertura, Hugh Forrest, presidente do festival, destacou que “vivemos tempos interessantes, especialmente nos EUA”, e que nunca um evento como o SxSW foi tão necessário. Uma clara referência crítica ao rumo atual da política americana e seus apoiadores.
A surpresa continuou com o painel de abertura, protagonizado pelas especialistas Amy Gallo e Kasley Killam, que discutiram não sobre inteligência artificial (IA), mas sim sobre a inteligência humana, abordando aquilo em que somos imbatíveis: os relacionamentos.
Era como se o festival dissesse: enquanto muitos se preocupam se os robôs vão tomar nossos empregos, nossa verdadeira preocupação deveria ser como cuidaremos uns dos outros quando tivermos mais tempo livre.
Que o mundo vai mudar bastante, todo mundo sabe. Mas o que realmente importa é como seremos melhores humanos depois disso tudo. Qual será nosso papel nesse futuro?
Nos dias seguintes, o festival continuou sua busca por respostas a essas questões existenciais, reforçando que o protagonismo deve ser humano, e não dos robôs de Elon Musk ou da turma dos chamados “tech bros” – referência aos bilionários que hoje dominam a economia e influenciam fortemente a política americana.
Pude acompanhar debates fascinantes sobre como o “fator humano” pode ser um diferencial competitivo decisivo no futuro, já que nenhuma IA consegue substituir plenamente a confiança, um traço essencialmente humano.
Especialistas renomados apontaram que em breve viveremos uma simbiose entre homens e máquinas, abandonando a ideia de escassez e competição e entrando numa era de abundância e possibilidades “super-humanas”. Nesse contexto, os melhores negócios e profissionais serão aqueles que souberem aproveitar ao máximo as novas tecnologias.
A revolução causada pela inteligência artificial já é inegável. As chamadas “AI-native companies”, empresas criadas após a chegada do ChatGPT, serão completamente diferentes das anteriores. A transformação digital, tema que dominou as discussões nas últimas décadas enquanto companhias tradicionais tentavam competir com as nativas digitais, já não será suficiente.
Se o salto do analógico para o digital já foi complicado para muitas empresas, o salto para a era pós-IA promete ser ainda maior. Sai a transformação digital e começa o que chamo de transformação cognitiva. A grande questão é: se hoje fosse o primeiro dia da sua empresa, como você desenharia os processos de trabalho?
Certamente, de maneira completamente diferente. E isso só agora começa a ficar claro para muitos executivos. Da mesma forma que reformar uma casa antiga é mais caro e complexo do que construir uma nova, essa transformação cognitiva promete ser ainda mais desafiadora.
Também precisamos repensar nossas carreiras. Assim como a internet democratizou o conhecimento e colocou o saber à distância de um clique, hoje a IA democratiza a expertise. Equipada com bons agentes de IA, qualquer pessoa pode se tornar especialista em quase qualquer área.
Em um mundo movido pela IA, todos seremos gestores – mas, em vez de gerenciar pessoas, provavelmente estaremos gerenciando agentes de IA.
Tudo indica que estamos entrando na era dos generalistas, profissionais capazes de se adaptar rapidamente às mudanças. Como já foi dito por muitos e repetido tantas vezes que é até impossível apontar a autoria original: “No futuro, você não perderá seu emprego para uma IA, mas sim para alguém que sabe usar a IA melhor que você”.
Agora, enquanto me preparo para o voo de volta ao Brasil, saio empolgado com o futuro. Saio com a certeza de que pessoas brilhantes decidiram dedicar seu tempo a discutir o que realmente importa: as pessoas.
Como destacou o ilustre Scott Galloway, outra estrela do SxSW, vivemos uma era em que nunca, na história, tantas pessoas dedicaram tanto tempo para melhorar a vida de outras que jamais irão conhecer. Seja através de doações ou usando IA para resolver os grandes desafios da humanidade, “nunca tanta gente plantou árvores cuja sombra nunca verá”. E isso, por si só, já é animador.
Para onde caminha a humanidade? Tenho razões suficientes para acreditar que estamos no rumo certo. E, do festival da tecnologia, saio com um sopro de humanidade. Eu gosto disso.