Resultado de uma pesquisa traz uma leitura sobre o empreendedorismo negro no Brasil; levantamento reforça a necessidade de solucionar desafios estratégicos, econômicos, socioculturais e históricos
“No Brasil, 40% dos adultos negros são empreendedores, mas ainda conhecemos pouco sobre essas histórias. Não faltam números para mostrarmos a relevância desse mercado: estamos falando de uma movimentação de R$ 1,73 trilhão por ano e de 56% da população do País.
Por isso, em parceria com Inventivos e Movimento Black Money, a RD Station decidiu analisar as características do empreendedorismo negro. Procuramos entender como elas podem diferir em suas formas e desafios do que comumente conhecemos quando não há um recorte específico de raça.
A Pesquisa Afroempreendedorismo Brasil foi realizada de 12 a 21 de maio. Tivemos 1.016 respondentes, mas consideramos 701 respostas válidas para a análise, pela completude do questionário. A pesquisa, aliás, foi concebida, desenhada e analisada majoritariamente por pessoas negras.
O link do relatório completo está descrito final deste artigo. A seguir, trazemos os seis principais achados da pesquisa, que resumimos a seguir:
O estudo recente Female Founders Report 2021, produzido pelo Distrito Dataminer, em parceria com a B2Mamy e Endeavor, destacou que apenas 4,7% das startups brasileiras foram fundadas exclusivamente por mulheres e 5,1% por mulheres e homens.
Quando falamos especificamente de empreendedorismo negro, vemos uma realidade bem diferente: 61,5% dos empreendedores são mulheres, e as indústrias predominantes são comércio, comunicação e cuidados.
Em outra pesquisa, organizada pelo Sebrae, foi revelado que esses negócios representam 17% do total no país e que, entre essas mulheres, quase metade (49%) são as responsáveis financeiras pelo seu núcleo familiar.
São mulheres que empreendem por necessidade e se apoiam em atividades historicamente vinculadas ao seu grupo. As indústrias predominantes refletem uma herança ancestral de cuidados coletivos, mas também, infelizmente, a herança escravocrata de estar a serviço do outro ou da outra.
Empreendedores visualizam oportunidades de negócio a partir de uma dor comercial. Empreendedores negros também partem de uma dor, mas geralmente ligada a uma questão racial.
Assim vemos pessoas como a Zarah Flor, uma de nossas entrevistadas, que criou um protocolo para depilação a laser para peles negras. Ela se cansou de ver clientes mal atendidas em clínicas e peles queimadas pelo desconhecimento de como tratá-las.
Também temos Maurício Delfino, que fundou a Da Minha Cor, ao ver a dificuldade que negros e negras tinham para usar toucas de natação. Hoje, ele exporta para países africanos. Como podemos ver, são empreendedores ocupando um espaço que não havia sido pensado até então para eles.
O empreendedorismo tem sido a alternativa escolhida por muitas pessoas negras, principalmente as periféricas, para obter o sustento e melhores condições de vida para as suas famílias. Segundo o Índice Folha de Equilíbrio Racial, a proporção de negros de 30 anos ou mais com diploma universitário se aproximou de sua representação populacional em 23 das 27 unidades da federação entre 2014 e 2019.
O desafio é refletir a alta escolaridade em aumento de renda. Em 2012, início da série histórica do IBGE para a medição, o rendimento médio mensal dos brancos foi 57,3% maior que o dos negros. Em 2019, quase nada havia mudado: a população branca recebeu, em média, 56,6% a mais que a população negra.
Desse modo, escolaridade não determina um lugar de oportunidade socioeconômico quando se trata da população negra no Brasil.
Quando comparamos dados da Pesquisa Afroempreendedorismo Brasil com a Panorama PMEs, conduzida em 2020, vemos como as indústrias em que os empreendedores focam são distintas.
Enquanto software e cloud aparece em primeiro lugar na pesquisa sem recorte de raça junto ao público pesquisado pela RD Station, o segmento nem aparece entre as 10 primeiras no afroempreendedorismo.
Os afroempreendedores enfrentam diversos obstáculos, mas colocamcomo as duas principais dificuldades o desconhecimento de estratégias digitais (50,9%) e formas de tornar seus negócios rentáveis (59,2%).
O marketing negro usa muito as redes sociais, mas tem mais dificuldades com software de marketing e métodos de pagamento. Por concentrarem muitas tarefas (61,2% dos empreendedores trabalham sozinhos), acabam não explorando e não tendo acesso às estratégias que incluem automação e análise de dados, o que lhes daria mais possibilidades de escalar seus negócios.
A dificuldade de acesso ao crédito lidera o ranking de desafios no afroempreendedorismo, com 40,4% das respostas. Embora o processo de concessão de empréstimos esteja evoluindo com sistemas de inteligência artificial, dados como CEP e receita mensal funcionam como marcadores étnicos e fazem com que a obteção de crédito seja mais difícil para os negros.
Alan Soares, do Movimento Black Money, aponta possíveis alternativas para o problema, como o crédito solidário (em que uma pessoa leva mais de um avalista), cooperativas de crédito para afroempreendedores, linhas exclusivas do BNDES (ações afirmativas). No entendo, ele afirma que a influência do racismo não para por aí. “A sociedade brasileira ainda não está disposta a admitir o preconceito existente e combatê-lo”, afirma.
Para ter uma visão mais aprofundada do levantamento,acesse aqui a pesquisa completa.
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