Método connection, construído em seis fases, permite que empresas estabelecidas alcancem uma taxa média de conversão de 50% dos projetos-piloto em boas oportunidades de negócios
“Inovação não é exclusividade de startups. Grandes empresas podem ser inovadoras sem ter que copiar o modelo de startups. Steve Blank, pai do lean startup, disse certa vez que “startups não são versões menores de grandes empresas”. Verdade. Startups requerem uma abordagem totalmente diferente de gestão. As competências para descobrir novos mercados são muito distintas daquelas para escalar as oportunidades. Para inovar, grandes empresas podem atingir melhores resultados estabelecendo parceria com startups do que as imitando.
O problema é que o relacionamento entre grandes empresas e startups tem baixa taxa de sucesso. Segundo dados da 500 Startups, 48% das corporações que estabelecem relação com startups têm menos de 10% de taxa de conversão de pilotos em negócios. Apenas 2% converte entre 50% e 75% dos pilotos realizados. A nossa experiência sugere que a baixa taxa de conversão se deve ao desalinhamento sobre os objetivos da iniciativa, falta de preparação de áreas de apoio, concepção e execução inadequada de projetos-piloto.
Não há dúvidas de que corporações e startups vivem contextos distintos, mas será que ainda é possível acreditar numa relação simbiótica, ganha-ganha? Infelizmente, parte das startups começa a questionar os resultados desse modelo. Para mudar a situação atual, as empresas estabelecidas devem saber exatamente o que esperam alcançar através do relacionamento com startups.
Incubação, aceleração, contratação, parceria e investimento são alguns dos formatos existentes para operacionalizar a interface. Cada formato cumpre determinado objetivo estratégico. Se o objetivo é otimizar o core business, a empresa pode contratar startups para funções onde têm baixa vantagem em desenvolver internamente. Nesse caso, a aquisição de uma tecnologia madura pode ser um atalho operacional com baixo risco. Quando a intenção é se mover para adjacências, o formato mais adequado é a parceria. Por outro lado, se o objetivo é criar novos negócios, as opções de corporate venture capital ou aquisição são rotas mais efetivas.
Não há como fazer algo novo sem correr riscos. No entanto, as empresas estabelecidas precisam melhorar a taxa de conversão da inovação aberta com startups. Nos últimos anos, vivenciamos a realidade de algumas dezenas de programas de startups em setores como farmacêutico, alimentos e bebidas, serviços financeiros, agronegócio, saúde, construção, varejo, energia, óleo e gás, entre outros.
Essa experiência permitiu identificar um padrão emergente entre os programas com melhores resultados. Em comum entre eles estava a sequência de um passo a passo de seis fases que garantiu taxa média de conversão de 50% de pilotos em negócios. Denominamos esse método de connection.
A estratégia de um programa de startups trata das principais escolhas sobre os resultados esperados, temas estratégicos, grau de maturidade de startups, formato e modelo de conexão. O alinhamento entre a alta gestão, área de inovação, áreas de negócio e apoio impacta diretamente na conversão das futuras parcerias.
O programa “Além da Ambev”, por exemplo, está focado em cocriar novos negócios digitais com startups, indo além dos produtos existentes da empresa. A empresa optou por buscar startups mais maduras ao desenvolver novos produtos, serviços e modelos de negócio. O formato selecionado envolve parceria entre as partes. A seleção das startups ocorre em modelo de batch.
Por outro lado, as duas edições do AgroX da SLC Agricola, gigante brasileira do agronegócio, tiveram como estratégia otimizar a operação agrícola e gerar produtividade ao negócio existente ao ser early adopter de tecnologias. As startups buscadas estavam em estágio de validação, tração ou escala. O formato de conexão foi de contratação de fornecedores em um modelo de batch. A fase de estratégia também deve abordar a preparação da organização para esse relacionamento. São pontos críticos a capacitação dos times que irão colaborar com as startups e o alinhamento com as áreas de apoio como financeiro, jurídico, compliance, suprimentos e tecnologia da informação para que atuem de forma ágil e adaptada ao contexto de startups. Envolver a todos na construção e lançamento da iniciativa irá facilitar todo o trabalho.
Há uma guerra pelas melhores startups. Em alguns casos a lógica se inverte e as startups acabam por escolher as grandes empresas mais preparadas. Ter um site do programa para inscrição de startups é a parte fácil.
A efetividade do scouting passa pela clareza dos temas de interesse da empresa, comumente chamados de desafios. A parceria com hubs de inovação e, principalmente, o contato direto com as startups ainda são as formas mais efetivas de atrair boas soluções e evitar a seleção adversa. Volume de inscritos em programa de conexão é métrica de vaidade. O importante é ter um conjunto reduzido de soluções altamente aderentes.
Para atrair as melhores startups, as corporações devem compartilhar evidências de que estão preparadas e que a startup não irá perder tempo e dinheiro ao participar.
Cuide bem das suas startups. Programas com track-record estabelecidos saem na frente. Iniciativas como o BoostLab, Germinar, Braskem Labs, Nestlé Beyond Food, Ocyan Waves, Scale-up Endeavor, Radar Santander e outros que têm histórico de sucesso, e são apostas mais seguras para startups que correm contra o tempo e não podem desperdiçar energia naquilo que não faz sentido para sua jornada de desenvolvimento.
A adoção de novas soluções tecnológicas em empresas estabelecidas tende a funcionar melhor a partir de um sistema de puxar do que de empurrar. Isso significa que ficar levando startups disruptivas para quem não tem interesse pode ser ineficaz, por melhor que sejam as soluções. Para fortalecer a conexão, a fase de seleção e filtro de startups deve ser feita em conjunto com os times responsáveis pelos desafios que serão os potenciais usuários, contratantes ou investidores da startup.
Os critérios de filtro dependem da estratégia definida na primeira fase. De forma geral, empresas que pretendem investir em startups devem atentar para o captable, tamanho de mercado e perfil dos founders enquanto que corporates em busca de fornecedores e parceiros devem dar atenção especial para a solução e à estrutura das startups.
Alguns critérios podem ser específicos da estratégia dos programas. O programa “Além da Ambev”, por exemplo, priorizou startups com mulheres, pessoas pretas e outros grupos sub-representados em cargos de alta gestão.
Muito cuidado com as aparências. Nem tudo que reluz é ouro. Há startups premiadas e com founders bastante conhecidos que não necessariamente têm as soluções mais adequadas para determinada empresa. Em função disso, analisar dados disponíveis, conversar com outros clientes ou parceiros das startups, e falar com founders e heads sobre suas soluções, é um caminho que aumenta as chances de seleção mais assertiva para os dois lados.
Todo cuidado na fase de seleção vale a pena. No entanto, é difícil saber o que funciona antes de testar. Mesmo investidores de risco altamente especializados têm uma baixíssima taxa de sucesso. O caráter incerto dessas apostas tem estimulado as empresas para a realização de experimentos, provas de conceito, protótipos e pilotos.
O maior desafio desse tipo de abordagem é colocar ambos os lados no mindset correto. Cada parte tem um pedaço da equação. É natural que executivos de empresas estabelecidas queiram resolver seus problemas ou mesmo endereçar as novas oportunidades o mais rápido e intensamente. Também é compreensível que startups queiram um novo cliente, parceiro ou investidor com quem consigam escalar de forma ágil e significativa seu negócio.Entretanto, o melhor caminho para ampliar as chances de sucesso é executar um piloto mínimo viável cocriado entre as partes que valide as principais incertezas antes de um rollout.
O excesso de ambição pode transformar discussões simples em debates complexos e que demandam alto investimento. Outro problema é desenhar os projetos-piloto de forma ágil e colocar todos os interlocutores de empresas estabelecidas e startups na mesa. Coordenar agendas de diversas pessoas num prazo curto não é nada fácil.
Para resolver esse desafio, adotamos três praticas de gestão que têm gerado resultados significativos na taxa de conversão: primeiro, forme um squad especifico com gente da startup e da corporação assumindo que passam a fazer parte de um time único com autonomia para desenho de um piloto.
Segundo, execute o desenho do piloto em modo imersivo com todos os interlocutores reunidos em dois a três dias sequenciais, como se fosse um design sprint.
Terceiro, aplique um framework de colaboração que facilite a adoção de uma linguagem comum. Mais de 73% dos projetos desenhados com essa abordagem obtiveram aprovação para execução de pilotos.
Experimentos são formas estruturadas para validar hipóteses de criação de valor. Sonhar grande faz todo sentido. Iniciar pequeno ainda mais. Bons projetos-piloto são iniciativas com escopo claro, KPIs e prazos definidos.
Os maiores pontos de atenção durante um projeto piloto são a mudança dos interlocutores, alteração de escopo sem razões justificadas por dados e acesso aos recursos humanos, financeiros e tecnológicos necessários. Bons pilotos são pequenos projetos focados de curta duração. Projetos de 12 meses, na maioria das vezes, não são pilotos ou provas de conceito.
Uma forma de estruturar os projetos-piloto com eficiência é usar o framework de aprendizagem de pilotos publicado na MIT Sloan Management Review Brasil que desdobra os principais temas necessários para alinhamento de expectativas entre as partes.
A execução do piloto requer clareza de responsabilidades e contato frequente entre os integrantes da startup e da empresa que compõe o squad. A adoção de rituais ágeis como sprint plannings semanais, daily meetings e utilização de ferramentas de kanban como o Trello irão acelerar a execução eficaz.
A última fase da jornada de programas de startups é a tomada de decisão sobre os projetos-piloto realizados. Para tanto, é necessário avaliar de forma criteriosa os resultados alcançados frente as hipóteses estabelecidas. A ausência de uma avaliação estruturada, baseada em dados, com a participação dos stakeholders de alta gestão necessários e isenta de vieses de decisão destrói a propensão à adoção em escala das soluções.
Nesse momento, é importante definir os possíveis passos subsequentes ao piloto. De forma geral podemos resumir os caminhos alternativos em: encerrar, estender ou expandir.
Encerrar é a melhor alternativa quando a solução não funcionou ou quando as partes não conseguiram trabalhar de forma eficaz conjuntamente. Há startups com bons produtos que não tem boa prestação de serviços. Nesses casos, ainda existe a chance de pactuar determinados padrões de serviço que devem ser alcançados para que haja continuidade da relação.
Estender é a decisão correta quando as incertezas e hipóteses foram parcialmente confirmadas. Contudo, ainda existem incertezas que devem ser respondidas antes de um maior comprometimento de recursos.
Por fim, expandir é o caminho adequando quando as incertezas foram positivamente respondidas. A intensidade e formato da expansão vão depender da estratégia, recursos e prioridades do projeto para startup e corporação.
O relacionamento entre empresas estabelecidas e startups pode ser benéfico para os dois lados. Com essa estratégia, as grandes empresas podem otimizar, renovar ou transformar seus negócios enquanto startups podem ter acesso a recursos únicos e valiosos para crescer de forma sustentada.
Lembrando de Steve Blank, a inovação em grandes empresas não é uma versão maior da inovação em startups. Copiar a forma de inovar das startups não é a melhor alternativa. Colaborar, a partir do passo a passo apresentado, pode ser um caminho bem mais efetivo.
Gostou do artigo do Maximiliano Carlomagno? Saiba mais sobre inovação aberta assinando gratuitamente nossas newsletters e ouvindo nossos podcasts na sua plataforma de streaming favorita.””