Conheça a iniciativa liderada pelo Instituto Votorantim para melhorar as práticas de gestão em resposta à covid-19 em mais de 140 prefeituras brasileiras, que provou ser eficiente
Que as organizações sociais têm servido de benchmark para muitas organizações com fins lucrativos e governamentais, não é novidade. Isso já acontece há algum tempo. Não há quem não admire a gestão da Bill & Melinda Gates Foundation, por exemplo, ou a da WWF (World Wildlife Foundation), ou a do próprio Greenpeace. E não há quem duvide de seu protagonismo crescente. Não foi por acaso que, em seus últimos anos de vida, Peter Drucker (1909-2005), considerado o pai da administração moderna, se dedicou à gestão das organizações sem fins lucrativos. Ele acreditava que esse tipo de organização teria maior relevância no mundo futuro.
E as organizações do terceiro setor brasileiro? E o que dizer da capacidade de gestão delas, com recursos que sempre são percebidos como limitados em relação às necessidades? Para responder a essas questões, o blog da MIT Sloan Review Brasil aprofundou uma estratégia específica, a iniciativa “Municípios contra o coronavírus”, relativa à pandemia de covid-19, liderada por uma organização em particular, o Instituto Votorantim em correalização com o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social).
Vale considerar que a presente crise está sendo particularmente desafiadora, à medida que exige uma velocidade de resposta ainda maior que a de praxe. “É uma crise diferente das outras, com múltiplas dimensões”, diz a especialista em gestão e cultura Betania Tanure, com base na história de pesquisas que a BTA Consultores faz. No mínimo, tem as dimensões sanitárias, econômico-financeira, antropológica e afetiva.
Ana Paula Bonimani, gerente de programas da organização, e Christiane Vila Nova Camargo, coordenadora de programas em dinamismo econômico e gestão pública do Instituto, dividiram com este blog os detalhes da iniciativa. Confira os principais pontos dessa mobilização:
Revisão do planejamento. O Instituto Votorantim foi um, entre muitos atores do investimento social privado, que, em 2020, foi ágil para revisar seu planejamento; fez isso em um mês. Mobilizou recursos específicos para enfrentar a covid-19 numa frente em que atua há mais de dez anos e que possui grande potencial de gerar impacto: o fortalecimento da gestão em governos municipais, ao lançar a iniciativa “Municípios contra o coronavírus”.
Opção por escalar via rede. A iniciativa foi uma correalização com o BNDES e foi realizada parceria com as várias empresas investidas da Votorantim (Votorantim Cimentos, CBA, Nexa, Votorantim Energia, Reservas Votorantim, CESP, Citrosuco, Banco BV), o Instituto Arapyaú e o Instituto Galo da Manhã. Ao todo foram investidos R$ 3,6 milhões, sendo a maior parte em aportes da Votorantim e do BNDES.
O escopo. Foi definido como prioridade oferecer apoio estratégico para que mais de 140 prefeituras brasileiras fortalecessem suas competências no enfrentamento da enorme crise que se instalou, em um programa com duração de quatro meses. Cinco dimensões-chave para o enfrentamento da pandemia foram observadas: (a) governança da crise; (b) comunicação; (c) vigilância epidemiológica; (d) assistência em saúde; (e) gestão fiscal.
Do plano à execução. Cada uma dessas dimensões foi desdobrada em um conjunto de práticas e competências de gestão que deveriam ser adotadas pelos gestores municipais. No total, foram propostas 11 competências de gestão a serem trabalhadas. “A primeira atividade prática do programa foi a aplicação de uma ferramenta de diagnóstico que analisou o estágio das práticas e processos de cada prefeitura nas cinco dimensões-chave”, conta Ana Bonimani. Com base nos resultados, os técnicos das prefeituras e do Instituto Votorantim priorizaram as ações e competências de gestão a serem fortalecidas definindo um plano individualizado com metas a serem alcançadas.
Modus operandi ágil. Com uma equipe formada por mais de 30 técnicos com experiência em gestão pública, houve uma rotina semanal de encontros virtuais em que as ações empreendidas pelas equipes de saúde dos municípios eram analisadas e propostas de melhoria eram desenhadas e implementadas. No total, foram incorporadas mais de 2.800 ações para fortalecer o combate a pandemia. “Trabalhamos num ciclo rápido de análise-desenho-implementação”, explica Christiane Vila Nova Camargo. “O fato de os resultados práticos aparecerem no curto prazo serviu de motivação para manter os gestores municipais engajados na iniciativa, apesar do cenário desolador e complexo”, completa.
Evolução. Ao final do programa, a ferramenta de diagnóstico utilizada no início dos trabalhos foi reaplicada, fornecendo uma visão clara de quais competências de gestão haviam avançado e se as metas almejadas foram atingidas. “Levando em conta o contexto de pandemia, a necessidade de executar as ações de maneira remota e o curto espaço de tempo em que as atividades do programa aconteceram, os resultados foram animadores”, afirma Ana Paula Bonimani. “Todos os municípios atendidos evoluíram, e 93% deles atingiram as metas pactuadas inicialmente. Em média, cada prefeitura registrou avanços em sete competências das 11 possíveis”, complementa Christiane Vila Nova Camargo.
Impacto. Os dados mostram com clareza que os municípios atendidos melhoraram a gestão. Mas será que uma gestão mais robusta foi capaz de melhorar os indicadores de contaminação e mortalidade pelo coronavírus? Para responder a isso, realizou-se uma avaliação de impacto. “Os dados dos municípios participantes do programa foram comparados com dados de um grupo controle formado por cidades estatisticamente muito semelhantes e que não foram atendidas pelo programa”, diz Ana Paula Bonimani, explicando a abordagem científica utilizada.
Em média, o impacto do programa até a primeira semana de dezembro de 2020 foi a redução de 1,3 óbitos a cada 100 mil habitantes, totalizando mais de mil vidas salvas nos mais de 140 municípios atendidos. Isso significaria que, caso fosse aplicado em todos os municípios brasileiros, o programa teria o potencial de salvar cerca de 10 mil vidas no mesmo período, das 175 mil mortes ocorridas no Brasil até aquele momento. Em relação ao número de casos, o programa também teve um impacto expressivo. Nos municípios atendidos pela iniciativa, foram evitados 33 mil casos de Covid-19.
Investimentos e redução de custos. Com um investimento aproximado de R$ 3,7 mil por vida preservada, essa iniciativa simples – e barata – de fortalecimento das práticas de gestão poderia ter reduzido em 6% o total de mortes no País. Se levarmos em conta o número de internações que deixaram de ser feitas e o custo médio de uma diária de internação em UTI, os casos evitados após a implementação do programa geraram uma redução de R$ 120 milhões em gastos para os cofres públicos. Esse cálculo se baseia em parâmetros obtidos no CDC (Center for Disease Control and Prevention dos EUA).
Reafirmação do propósito. “Isso confirmou para nós que o investimento social privado pode e deve dialogar, cada vez mais, com a gestão pública”, afirma Ana Paula Bonimani. “Os dados também sinalizam que fortalecer competências de governos locais e apoiá-los na implementação de políticas públicas é um caminho promissor para garantir resultados em áreas sociais básicas como a saúde, protegendo a população, reduzindo gastos e, neste caso, salvando vidas”, completa.
A iniciativa do Instituto Votorantim e seus parceiros durante a pandemia confirma a percepção do especialista em estratégia canadense Henry Mintzberg sobre a capacidade de inovação social existente no Brasil. Segundo ele, isso é tão importante quanto a capacidade de inovação tecnológica de polos como o Vale do Silício e deveria servir de benchmarking para outros países com mais frequência.
É interessante observar como o Instituto Votorantim se define: ele é um centro de inteligência social que atua em parceria com as empresas investidas da Votorantim S.A para promover impactos positivos na sociedade. Este blog pergunta: sua empresa também tem um centro de inteligência social? Se não, será que é hora de criar um?”