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O avanço da IA na saúde

Tecnologia gera eficiência ao setor e estimula tratamentos mais eficazes e personalizados, mas é preciso atenção à interoperabilidade dos dados na área da saúde

PATRÍCIA BASILIO
30 de julho de 2024
O avanço da IA na saúde
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A medicina registrou um longo processo evolutivo desde os antigos rituais de cura dos babilônios, egípcios e hindus — há quase 3 mil anos antes de Cristo —, ao desenvolvimento de equipamentos para diagnóstico e cirurgias no século XX. Em 1976, por exemplo, o médico britânico Ian McWhinney criou uma das primeiras aplicações de inteligência artificial (IA) para o diagnóstico de doenças baseado em regras. Mas foi a partir do século XXI que a tecnologia transformou o setor com sistemas de IA para gerar eficiência, precisão e produtividade.

Segundo estimativas da consultoria PWC a IA pode contribuir com um aumento de US$ 15,7 trilhões no PIB global até 2030, um salto de quase 15%. Na área da saúde, o crescimento também é exponencial. De acordo com a Statista, o mercado de IA para esse segmento, avaliado em US$ 11 bilhões em 2021, deverá valer US$ 187 bilhões em 2030.

A tecnologia, de acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), é uma grande promessa para melhorar a prestação de serviços no setor em todo o mundo. Segundo a Harvard’s School of Public Health, por exemplo, o uso de IA para fazer diagnósticos pode reduzir os custos do tratamento em até 50% e melhorar os resultados na saúde dos pacientes em 40%.

Dados do relatório Moving the Future, da consultoria MV apontam que as ferramentas digitais avançadas estão sendo utilizadas para agendamento online (35%); telemedicina (23%); aplicativos de bem-estar e saúde (12%); monitoramento dos sinais vitais ou plano de cuidados personalizado (7%); check-in (6%); automatização de processos repetitivos (6%), e reconhecimento do paciente (2%).

Sócio do setor de saúde da PwC Brasil, Bruno Porto confirma que soluções para a operação de hospitais e consultórios são as mais desenvolvidas e aplicadas no País. Para as operadoras de planos e seguros de saúde, a mais importante é a que mitiga fraudes no sistema de saúde. “Há operadoras que contratam até cinco health techs para conectar toda a rede familiar do paciente e identificar possíveis fraudadores e sinistros que não estão adequados”, explica.

A radiologia é uma das áreas da saúde que mais se beneficia da inteligência artificial generativa, capaz de criar conteúdo após ser treinada com padrões complexos a partir de uma base de dados – sem a necessidade de um programador. “Com a IA generativa, toda a análise inicial e comparativa de exames de imagens pode ser feita pelo sistema de forma rápida e eficaz, facilitando a decisão médica”, afirma o executivo. Entre os hospitais que aplicam as ferramentas estão o Hospital Israelita Albert Einstein e o Hospital Sírio-Libanês, ambos em São Paulo.

O PRESENTE E O FUTURO DA IA NA SAÚDE

Softwares com tecnologias avançadas estão também impulsionando a formação dos profissionais da saúde, simulando ambientes hospitalares, como salas de cirurgias e de Unidades de Terapia Intensiva (UTIs), acrescenta Wagner Sanchez, coordenador acadêmico do MBA em health tech da FIAP e pró-reitor da instituição. “Um sistema simples que funciona em muitos hospitais do Brasil é o que faz o prognóstico do paciente na triagem e indica se ele vai precisar de um leito. A ferramenta ajuda as unidades de saúde a agilizarem o atendimento da pessoa doente e se organizarem, uma vez que o custo de um leito desocupado é alto”, afirma Sanchez.

Em meio a tantas ferramentas, a promessa para a saúde do futuro está na medicina de predição, que desenvolve técnicas para customização de tratamentos de saúde, considerando as características genéticas dos pacientes e suas respostas às doenças e aos medicamentos e terapias. Esse novo formato não exclui o trabalho do médico. Pelo contrário, pretende fazer com que sua função seja mais precisa e otimizada.

O professor da FIAP destaca, por exemplo, o uso de dados para prever os riscos de um paciente desenvolver câncer e avaliar o melhor tratamento para cada tipo de tumor individualmente. “Existem diferentes soluções baseadas no comportamento, histórico e sinais do paciente. Há um investimento muito forte em startups que desenvolvem soluções simples, mas que têm grande impacto de aplicação”, avalia o coordenador.

OPORTUNIDADES E DESAFIOS DA INTEROPERABILIDADE

Para a digitalização da saúde, de fato, avançar no Brasil, é necessário superar o desafio da interoperabilidade: capacidade dos sistemas de informação de se comunicarem entre si e trocarem informações de maneira eficiente e eficaz. Segundo Teresa Sacchetta, diretora de saúde da InterSystems, a dificuldade de comunicação entre os dados ocorre tanto na área operacional quanto no atendimento aos pacientes. “Na gestão de estoque, por exemplo, os materiais são identificados nos bancos de dados com diferentes nomenclaturas. Quando não existe a interoperabilidade em redes hospitalares, não é possível fazer essa gestão de maneira eficiente, identificando se determinado material que está em falta em um hospital pode estar disponível em outro”, exemplifica.

Quando o assunto é relacionamento com clientes, a falta de interoperabilidade promove, por exemplo, a lentidão para registrar a primeira consulta em consultórios e hospitais. A especialista da InterSystems cita a necessidade de preencher repetidas vezes dados de clientes em atendimento, como medicamentos em uso, alergias e antecedentes de saúde. “Há uma grande quantidade de dados disponíveis em sistemas dispersos e isolados que pode aumentar significativamente a produtividade dos profissionais da saúde. O tempo de atendimento poderia ser otimizado eliminando a necessidade de coletar dados que são fundamentais para um atendimento de qualidade e que poderiam ser compartilhados na cadeia de prestadores de saúde”, diz a executiva.

E para que os dados, de fato, sejam o “novo petróleo” na saúde, os especialistas reforçam a importância da ética e do tratamento dos dados desde a coleta, utilização, armazenamento e eliminação das informações, de acordo com a Lei Geral de Proteção de Dados Pessoais (LGPD). “Existem muitos exemplos de IA que estão se tornando cada vez mais comuns em nosso cotidiano, como o ChatGPT. O impacto da indicação de um filme errado no Netflix ou de um livro na Amazon é muito baixo, mas na saúde a qualidade dos dados é fundamental e é necessário que os dados sejam tratados para que se mitiguem riscos de alucinação e de erros, além de vieses”, conclui Sacchetta.

PATRÍCIA BASILIO
Patrícia Basilio é colaboradora MIT Sloan Management Review Brasil

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