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O futuro da governança corporativa nas mãos das startups

Para crescer e alcançar o grande mercado de capitais, startups já nascem com uma cultura de governança; isso indica aos setores e ecossistemas de negócios os caminhos para a construção de uma governança corporativa transparente e objetiva

Colunista Marcelo Botelho da Costa Moraes

Marcelo Botelho da Costa Moraes

10 de Novembro

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Artigo O futuro da governança corporativa nas mãos das startups

Muito se fala da importância da governança corporativa para as organizações em geral. No entanto, poucos compreendem a forma como o conceito de governança é abrangente e interessa a todos as partes envolvidas, conhecidas por stakeholders. Governança é o ato de governar, ou seja, fazer a gestão organizacional. Contudo, no contexto corporativo, a governança vai além, tendo como propósito reduzir o conflito de agência. Esse conflito nasce naturalmente com o crescimento das empresas, quando temos a separação da figura dos gestores e investidores, respectivamente agente e principal, conforme a teoria da agência.

Em síntese, a teoria da agência foi apresentada em 1976 por Jensen e Meckling, na qual demonstram haver um conflito de interesse entre agente (gestor/administrador) e principal (investidor). Nessa relação contratual, o agente é um indivíduo que se compromete a realizar atividades para o principal. No entanto, a divergência de interesses pessoais entre essas duas partes pode levar ao conflito.

Nesse contexto, a governança corporativa ganha especial atenção para evitar que as decisões dos gestores não acompanhem o objetivo principal das organizações, que é gerar o maior retorno possível ao investidor. Vale considerar, ainda, que isso não tira a importância de outros objetivos como os sociais e ambientais. Em outras palavras, governança corporativa é sobre planejamento e controle. O planejamento consiste em definir objetivos e metas de longo prazo. Já o controle diz respeito ao acompanhamento da execução, avaliando se os objetivos definidos estão sendo realizados de forma adequada.

Evolução e modelos de governança corporativa

Pesquisas realizadas em empresas brasileiras e internacionais demonstram os benefícios da governança corporativa sobre o desempenho das organizações, reduzindo seu custo de capital e restrições financeiras e melhorando a alocação de seus investimentos.

Na evolução do mercado de capitais brasileiro, especialmente para as empresas de capital aberto, a governança corporativa corresponde a um conjunto de estrutura e funções desempenhadas para obter o alinhamento de objetivos entre as figuras do agente e principal. Entretanto, o conflito de agência no Brasil tende a ser baixo, tendo em vista o modelo de controle que as empresas de capital aberto possuem.

Em sua grande maioria, as empresas brasileiras são controladas pela família dos fundadores, ingressando na bolsa de valores como forma de aumentar sua captação de recursos e reduzir seu custo de capital, mesmo na captação de dívidas ao adotarem melhores práticas de governança. É nesse ponto que as startups ganham vantagem, pois possuem uma estrutura de governança diferenciada desde a origem.

Cultura de governança em startups

As startups nascem de uma visão empreendedora de seus fundadores, que não possuem recursos financeiros para os altos investimentos necessários ao seu rápido crescimento. Isso leva diretamente para a busca de outros investidores nas suas diversas rodadas de captação. Dessa forma, a startup precisa apresentar estruturas de governança para a definição de seu planejamento e controle de sua execução, caso contrário não terá acesso a recursos.

No curto prazo, isso significa que as startups já nascem com uma cultura de governança, com conselheiros, compliance e accountability (prestação de contas) de fazer inveja para grandes empresas. Isso ocorre porque as startups precisam estar preparadas para o rápido crescimento. Sem a preparação para as rodadas de investimento, e sem as definições de funções e da forma de obtenção de capital, não haverá investidor interessado nessa empresa.

No longo prazo, essa preparação implica em redução do controle acionário dos fundadores e a transferência para uma estrutura de tomada de decisão participativa, voltada para soluções disruptivas que apresentam potencial de geração de valor mesmo antes de gerar caixa ou lucro.

Se pensarmos no caminho natural de crescimento das startups, o mercado de capitais é o destino mais lógico. Ao chegar nesse objetivo, essas empresas já terão estruturas de conselho de administração e conselho fiscal em funcionalidade plena. Em complemento, ao chegarem nesse estágio de evolução, as startups já terão uma cultura de compliance, além de auditorias enraizadas e efetivas. No mais, essas empresas possuem estruturas organizacionais claras, além de relacionamento consolidado e bem resolvido entre os investidores.

Por um lado, as startups não precisam se preparar para o mercado de capitais, que entendem a governança como algo natural no processo de crescimento, e não apenas uma exigência de regulação. Por outro lado, o mercado de capitais do Brasil precisa se preparar para as startups. Para isso, é preciso melhorar o ambiente de negócios, reduzir os custos da abertura e manutenção das empresas na bolsa de valores e proporcionar facilidade dessas empresas em acessar o mercado de capitais, inclusive por meio de soluções intermediárias antes da listagem em bolsa; caso contrário, perderemos essas startups para outros mercados mais desenvolvidos.

Por tudo isso que o futuro da governança corporativa está nas mãos das startups, inclusive para que possam criar formas disruptivas de governança, com mecanismos mais eficientes para gerir a tensão do conflito de agência.

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Autoria

Colunista Marcelo Botelho da Costa Moraes

Marcelo Botelho da Costa Moraes

Com pós-doutorado na Sloan MIT, é professor da Faculdade de Economia, Administração e Contabilidade de Ribeirão Preto da Universidade de São Paulo (FEA-RP/USP).

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