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O futuro das regulações ambientais

Especialistas falam sobre o papel do Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) na promoção da biodiversidade

Sandra Regina da Silva

01 de Julho

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Artigo O futuro das regulações ambientais

A necessidade de conservação ambiental é um tema para lá de debatido – e há décadas. Ainda assim, estudos destacam os fatores que estão colocando em risco a sustentabilidade do planeta. Um deles, da University of Copenhagen, na Dinamarca, divulgado em 2023, aponta que já ultrapassamos seis dos nove limites planetários seguros, colocando em risco a vida na Terra.

Os limites excedidos incluem a integridade da biosfera, mudanças climáticas, poluentes (como microplásticos), fluxos biogeoquímicos (processos naturais em que ocorrem a ciclagem dos elementos ou sua passagem do meio ambiente para os organismos vivos e depois de volta ao meio ambiente), degradação do solo e escassez de água doce. Em contrapartida, a camada de ozônio, a carga de aerossol atmosférico e a acidificação dos oceanos ainda estão em zonas seguras.

Outro dado alarmante vem do Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas (IPCC), como explica David Canassa, diretor-executivo da Reservas Votorantim. “Se tivermos sucesso em segurar o aquecimento global em 1,5º C – meta que ainda não alcançamos –, ainda assim perderemos de 10% a 40% da biomassa das florestas tropicais do mundo todo em 100 anos, segundo o IPCC”, conta ele. Então, mesmo com esse esforço, o planeta passará por processos como os chamados de desertificação ou de savanização. “As florestas vão perdendo biomassa e se transformando em florestas ‘mais fracas’.”

Canassa abordou o assunto durante o segundo episódio da série Sustentabilidade, Inovação e Governança - O futuro das regulações ambientais, uma coprodução de MIT Sloan Management Review Brasil e Pinheiro Neto Advogados, que teve como tema PSA: Novos caminhos para promover a biodiversidade no Brasil.

O papel do Brasil no ecossistema global

O Brasil, com a maior reserva de água doce do mundo, vastas florestas e uma biodiversidade ainda pouco explorada, ocupa uma posição estratégica para liderar iniciativas de proteção ambiental. Nesse contexto, o Pagamento por Serviços Ambientais (PSA) emerge como um elemento chave, especialmente após a sanção da Lei nº 14.119, em 2021. Paula Amaral Mello, sócia da área ambiental de Pinheiro Neto Advogados que também participou do podcast, ressalta que, apesar de não ser um conceito novo, a formalização do PSA na legislação brasileira é um avanço significativo.

Ela explica que o PSA visa reconhecer e premiar aqueles que contribuem para a manutenção, recuperação ou melhoria dos serviços ecossistêmicos, promovendo assim a preservação ambiental. Um dado importante é que o PSA promete ser muito maior do que o mercado de crédito de carbono em si, o qual, aliás, está incluso na nova legislação. “PSA é muito além do carbono, envolve outras questões, como a água ou a biodiversidade – os especialistas dizem que a perda de biodiversidade é muito mais grave do que o problema do carbono, mas não estamos sensibilizados o suficiente para entendê-lo em sua profundidade”, avisa Canassa.

Vale explicar que serviços ambientais à luz da lei “são as atividades realizadas individualmente ou de modo coletivo que favorecem a manutenção, a recuperação ou a melhoria de serviços ecossistêmicos”, explica Mello. Serviços ecossistêmicos, por sua vez, são aqueles que podem promover efetivamente serviços e atividades ambientais, como a proteção da água, da fauna e da flora, gerar crédito de carbono, ecoturismo, polinização, entre outros.

O poder público, principalmente, tem o grande desafio de viabilizar esse mercado, na opinião da especialista jurídica. “Porque ele pode morrer, como o que aconteceu com a cota de reserva legal, um mecanismo muito interessante ainda presente no Código Florestal, que prevê um mercado de comercialização entre crédito e déficit. Mas não decolou.”

Portanto, só a publicação da lei não é suficiente. É preciso, o mais rápido possível, que saiam adequadas regulamentações, além de o poder público ter uma política de incentivos. Para Mello, deve-se pensar além do conservadorismo, buscando soluções inovadoras e conectando iniciativas privadas e públicas, com abordagem integrada. Enquanto não há mercado consolidado de pagamento por serviços ambientais, já existem ações, algumas públicas e outras da iniciativa privada, “daqueles que estão tomando uma posição mais corajosa”, pontua Mello.

Na prática

O projeto da Reservas Votorantim, que é voluntário, é voltado para o carbono. “O que fizemos foi pensar numa metodologia que tivesse como tópico principal o carbono como moeda. Porém, dentro da metodologia, estão diversos ecossistemas em que os serviços estariam sendo garantidos pela prestação de serviço ambiental que o dono da área tem que garantir”, conta Canassa.

Se o proprietário rural faz sua parte, os serviços ecossistêmicos estão mantidos – como conservação de água, de biomassa e, consequentemente, carbono, assim como a manutenção de animais que dispersam as sementes. A conexão de tudo isso leva a floresta a se renovar.

A metodologia, chamada PSA Carbonflor, criada em parceria com a Eccon, tem um roadmap de boas práticas para o proprietário rural, o qual ao seguir vai ampliar o carbono estocado na floresta. O crédito gerado é colocado para compradores interessados. “Fizemos de carbono, mas poderia ser qualquer outro crédito, de água, de biodiversidade, de serviços ecossistêmicos conjugados. A escolha foi porque hoje o carbono é um mercado que funciona, apesar de não ainda em sua plenitude”, justifica ele.

Para Canassa, o PSA pode ser estimulado, partindo do princípio que todo grande empreendimento tem que fazer várias análises, como de conservação de água, de biodiversidade, de florestas... “Em vez de ser feito como uma compensação, poderia ser como pagamento por serviço ambiental. Então, é utilizar uma estrutura que já está pronta a lei e ampliar a visão, até em processos que já estão rodando. Isso é uma possibilidade, mas é claro que precisa se criar as metodologias.”

Além dessa iniciativa, merece destaque uma local, feita numa reserva de 31 mil hectares, chamada Legado das Águas, no Vale do Ribeira, em São Paulo, que foi onde a Reservas Votorantim aplicou seu primeiro PSA. “Há 13 anos, colocamos como estratégia de conservação desse território o desenvolvimento do ecoturismo. Naquele momento, havíamos entendido que, se a população local não defende a floresta, ela não fica em pé. Para essa defesa, era preciso gerar emprego e renda, e o ecoturismo era a melhor opção para aquela região.”

Mas são várias as possibilidades que fomentam a conservação. “Fato é que, se não tivermos todos esses serviços ecossistêmicos funcionando no médio e longo prazo, o problema só vai piorar. São mudanças climáticas mais intensas, mais doenças – lembrando até que a pandemia foi um problema de biodiversidade, que escapou do controle”, afirma Canassa. Sob o ponto de vista do PSA, ele conclui que é possível fazer com que esses problemas possam ser solucionados por metodologias e criação de mercados para PSA, que fomentem melhorias nas questões naturais em que vivemos.

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Autoria

Sandra Regina da Silva

Jornalista com 30 anos de experiência em cobertura de negócios e inovação.

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