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Regulamentação das apostas e jogos online avança no Brasil

Em um ano de transição, indústria de entretenimento precisa fazer investimentos em tecnologia e adaptar o modelo de negócio para operação das bets e cassinos online

Denise Turco

16 de Abril

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Artigo Regulamentação das apostas e jogos online avança no Brasil

O filósofo Sêneca definia a sorte como o encontro da preparação com a oportunidade. Hoje o mercado de apostas e jogos online no Brasil parece reunir esses dois aspectos. O setor ganha cada vez mais espaço no País, com crescimento de 360% entre 2020 e 2022. Neste período, o número de empresas que atuam nesse segmento passou de 51 para 239; no primeiro trimestre de 2023, mais 60 entraram nesse mercado. No futebol, 19 times recebem apoio dessa indústria, segundo dados do DataHub.

Os gastos dos brasileiros com jogos e apostas online somaram R$54 bilhões de janeiro a novembro de 2023, segundo levantamento feito pela Folha de S. Paulo, com base em dados do Banco Central. Diante dessas oportunidades (inclusive para o governo, que vê a chance de elevar a arrecadação tributária), a indústria precisa se preparar para um novo momento: a nova regulamentação e os desdobramentos legais e jurídicos que impactam, inclusive, o modelo de negócio.

Desde 2018, a lei nº 13.756 liberou as apostas em eventos esportivos reais, as bets. Em dezembro do ano passado, foi aprovada uma nova lei, nº 14.790, que alterou a regra anterior e ampliou o escopo, legalizando também os jogos online de quota fixa. Além disso, determinou que, para operar nesse mercado, seria necessário obter uma licença, emitida pelo Ministério da Fazenda.

Recentemente, o Ministério da Fazenda publicou a Portaria nº 561, que institui a Política Regulatória da Secretaria de Prêmios e Apostas (SPA) e um cronograma com cerca de 11 portarias que serão expedidas durante o primeiro semestre. São esses instrumentos que indicarão o que as empresas precisam fazer na prática. Portanto, 2024 é o ano da transição.

Segundo Daniel Dias, professor da FGV Direito Rio, os pontos centrais da Portaria nº 561 trazem valores jurídicos relevantes, como estabelecer as ações regulatórias prioritárias; conferir segurança jurídica, previsibilidade e eficiência ao processo de regulamentação das apostas de quota fixa; e prover um ambiente regulatório estável, atual, transparente e atrativo ao investimento.

André Santa Ritta, associado da área de jogos e apostas do Pinheiro Neto Advogados, destaca que uma das portarias mais importantes diz respeito à integridade dos jogos, pois cria mecanismos de controle, apoiados em ferramentas tecnológicas robustas, em três aspectos: identificação de usuário (requer uso de reconhecimento facial), rastreabilidade de recursos (ferramentas de monitoramento já utilizadas para a prevenção de lavagem de dinheiro); e identificação de padrões comportamentais (inteligência artificial para detectar padrões suspeitos de apostas ao longo das partidas). “São exigências regulatórias que o operador terá de cumprir para conseguir e manter a licença”, explica.

As portarias trazem ainda outros pontos relevantes segundo os especialistas, como a destinação social dos recursos dessa indústria em benefício da sociedade; e o jogo responsável, que exigirá a implementação de ferramentas que limitem a quantidade de apostas e o tempo de login, entre outras, a fim de evitar o vício.

Para viabilizar o funcionamento de todos esses aspectos, a tecnologia é fundamental para a indústria de apostas e jogos online. “A tecnologia é transversal. Ela vai passar por uma série de áreas que interessam ao negócio, desde o desenvolvimento dos jogos em si, a experiência dos usuários e os novos mecanismos de controle obrigatórios por lei. Além disso, em benefício da transparência, o Ministério da Fazenda pretende fazer o processo de licenciamento totalmente online, e não da maneira convencional, com um monte de papel e reunião presencial com o regulador, que é onde normalmente acontece a corrupção”, diz Santa Ritta.

Desafios para o mercado

O novo cenário regulatório também deve gerar mudanças substanciais no modelo de negócio dessa indústria. “As plataformas passarão a ser negócios domésticos, instalados no Brasil, porque hoje todas estão no exterior e contam com instituições brasileiras como facilitadoras para coletar os pagamentos e enviá-los para fora”, explica Santa Ritta. Segundo ele, à medida que as empresas passam a ter uma base nacional, precisarão observar os desafios do ponto de vista da constituição do negócio, tributação, regras consumeristas, questões trabalhistas, entre outros, vigentes no País.

Há ainda outro impacto no modelo de negócios. Em geral, um único site costuma oferecer diversos tipos de jogos, como crash games, e-Sports, fantasy, pôquer etc. No entanto, a nova legislação brasileira criou tributos específicos que se aplicam apenas àqueles que se enquadram na modalidade de quota fixa. Jogos de cassinos online e pôquer, por exemplo, têm tributações diferentes no Brasil. Assim, a tendência é que os sites passem a segregar a oferta de jogos, segundo o especialista do Pinheiro Neto Advogados.

Próximos passos

A expectativa é que no segundo semestre de 2024 as empresas já estejam preparadas para cumprir os requisitos da nova lei. “Quem não tiver licença e não estiver no Brasil, não poderá mais oferecer aposta de quota fixa. A ideia do governo é responsabilizar os meios de pagamento, empresas de tecnologia e provedores de internet, ou seja, todos que viabilizam o negócio das plataformas irregulares também estarão expostos”, diz Santa Ritta. Empresas que estiverem em situação irregular não poderão enviar dinheiro para o exterior nem patrocinar clubes de futebol.

Com tantas transformações, para onde caminha o mercado de jogos e apostas no Brasil? “Com as futuras regulamentações, o cenário brasileiro caminha para uma redução de agentes econômicos, uma vez que as exigências para a exploração do serviço, assim como as regulatórias propriamente ditas, farão uma espécie de ‘peneira’ entre aquelas preparadas para seguir em um setor regulado, e aquelas que não”, afirma Dias. Mas isso não deve ser visto como um ponto negativo, segundo ele, pois a regulação cria um ambiente de segurança, previsibilidade e facilita a interação entre consumidor-apostador e operador, contribuindo para a redução de fraudes.

“É possível que num futuro próximo a gente discuta a liberação da construção de cassinos físicos no Brasil. Vários operadores estrangeiros estão entrando no mercado nacional pelo online, mas com ambições de construir cassinos físicos”, diz Santa Ritta, comentando que projetos de lei antigos sobre esse tema voltaram à pauta do Congresso Nacional recentemente com a proposta de atrair esse tipo de empreendimento para regiões que precisam de desenvolvimento econômico e social.

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Autoria

Denise Turco

Denise Turco é colaboradora da MIT Sloan Review Brasil

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