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Sobre o nosso momento de transição

Os líderes, com papel crucial na criação do futuro, estão trocando sua velha visão de futuro, algo que se desenrola linearmente do presente, por uma tela em branco em que um novo mundo pode ser criado

Juliana Proserpio
6 de agosto de 2024
Sobre o nosso momento de transição
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Estamos chegando ao final de 2020 e não vimos ainda nenhum skate voador passando pela nossa frente, mas estamos vivenciando provavelmente a maior oportunidade de transformação do mundo de nossos tempos.

Antropólogos comportamentais chamam o que estamos vivendo de “momento liminar”, um tempo entre tempos, um momento de transição. “Em momentos liminares os limites normais de pensamento, auto compreensão e comportamento são relaxados, abrindo caminho para a novidade, a imaginação, a construção e a destruição”, como lemos no livro Liminal Thinking, de Dave Gray, em uma menção aos antropólogos Arnold van Gennep e Victor Turner.

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Nesse momento liminar, líderes têm um papel crucial no desenrolar do futuro. Nos últimos anos, a maioria enxergava o futuro como um desenrolar linear, mas agora vivemos uma inflexão com os efeitos do coronavírus. Os padrões previamente existentes ficaram em suspensão, dando liberdade para a criação de novas visões de mundo.

Antes de que o mundo se acomode novamente, com o perigo de cair num espectro de futuro distópico como vemos nos episódios da série de TV Black Mirror, podemos usar essa janela para projetar futuros desejáveis.

Pense: quais são as oportunidades de remodelagem e redesign do seu negócio, do seu contexto, da sua vida e da nossa sociedade que podem ter futuros mais desejáveis? Como você faria para ativar esses futuros?

O ato de transformar intencionalmente é o que se conhece por design, e essa abordagem se tornou uma aliada aos negócios desde a construção de visões de futuro, a influência em culturas de inovação, até chegar ao desenho de produtos centrados no ser humano.

A ASCENSÃO DO DESIGN NOS NEGÓCIOS

Um dos grandes motivos da valorização do design é o simples fato de que a digitalização dos negócios fez com que o alcance dos produtos e serviços desenvolvidos ganhasse muito mais escala, e é por isso que o design se tornou tão importante no mundo corporativo e mais recentemente também na esfera pública.

A primeira onda do design veio com a revolução industrial. Saindo da manufatura, o papel do designer, que pensa sobre o desenho do produto do ponto de vista de seus usuários, unindo as conformações dos processos industriais, foi imprescindível. Com a revolução digital, o impacto e alcance dos produtos tornou-se ainda maior.

Você deve ter assistido ou ouvido falar no documentário O Dilema das Redes, da Netflix. O documentário é uma crítica às grandes empresas de tecnologia, aos mecanismos de recomendação e à dinâmica viciante das redes sociais. O grande problema por trás de tudo isso: um problema de design. As escolhas de criação dos algoritmos, o modelo de interface, os likes, os números de seguidores, as palmas, as recomendações cruzando voz para te mostrar aquilo que você conversou com sua família no almoço, todos um problema de design. O design se tornou pervasivo, sofisticado e quase invisível.

O design dos nossos produtos e serviços, digitais e físicos, bem como a cultura das nossas empresas e as políticas públicas são todas criações humanas, intencionais e, portanto, passaram por um processo de design. Sendo ele consciente ou não, fechado a sete chaves em salas de privilégio ou não, bem projetado ou não.

O mau design (ou a ausência de design) pode gerar resultados de impacto negativo para o negócio, ou ainda pior, criar produtos que influenciam comportamentos indesejáveis ou preconceituosos, por exemplo. Já o bom design traz resultados para o negócio, para o usuário de sua solução, e por fim impacto positivo na sociedade.

DESIGN COMO MEIO DE ESPECULAR FUTUROS

Design significa “”transformar condições existentes em condições preferíveis””, como define Herbert Simon no livro Sciences of the Artificial. O ato de especular futuros a partir do design, significa construir futuros ao invés de somente planejá-los ou prevê-los, e assim moldar a realidade em que queremos viver.

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Na Austrália, a Worksafe, um órgão do governo de Vitória que fomenta segurança no trabalho, desenhou seu futuro para 2040. Sua premissa: segurança no trabalho não significará mais somente reabilitação física – uma perspectiva que era baseada no modelo de trabalho industrial.

Em vez de planejar seu futuro baseando-se somente em tendências tecnológicas, a Worksafe se apoiou na abordagem do design, criando especulações de futuros baseados em tecnologias emergentes, bem como em comportamentos e necessidades da sociedade emergentes. Em vez de criar um simples relatório orientador, a Worksafe criou experimentos de suas visões de futuro e as testou com seus colaboradores, bem como com seus parceiros e com a sociedade. Esse projeto se tornou a base de todas as iniciativas da Worksafe dali por diante, transformando-a, do órgão de reabilitação que era, em um órgão de bem-estar no trabalho, um bem-estar que passa por aprendizagem contínua, requalificação, prevenção mental e proteção de dados individuais.

E SE…?

Se você pudesse redesenhar o futuro da sua organização, como fez a Worksafe, o que você faria?

É hora de aproveitar o momento liminar para projetar novos futuros, seja ele do seu time, de um produto, de sua organização ou na esfera pública. Sugestão: ao projetar futuros intencionais, lembre-se da ótica do design e dos três princípios norteadores para desenhar futuros desejáveis:

1. O futuro está emergindo agora e sempre deve ser criado a partir das pessoas.2. Visões de futuros influenciam a sociedade e por isso devem ser éticas e diversas.3. O futuro é sempre uma possibilidade e não uma previsão.

E cuidado! Todo design de futuro é um ato político, não inocente e gera efeitos, e é por isso que deve ser feito com responsabilidade, como nos lembra o livro Design Anthropological Futures (que nesse caso se remete ao paper de L. Watts The Future is Boring).

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Conseguimos mudar o futuro? Creio que sim, é perfeitamente possível, e é com isso que eu trabalho. Mas, nas palavras de Fei Fei Li, codiretora do Instituto de Inteligência Artificial Centrado no Ser Humano da Stanford University,””nós temos tempo de consertar o futuro, mas precisamos fazer isso agora!””.”

Juliana Proserpio
É cofundadora e chief design officer da Echos, laboratório de inovação, escola e consultoria.

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