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Projeto Relatus: tecnologia e dados no combate à violência de gênero

Numa iniciativa de Instituto Glória e Microsoft, a inteligência artificial será utilizada para mapear esse tipo de violência no Brasil e ajudar a melhorar políticas públicas

Alessandra Del Debbio, Alessandro Jannuzzi, Cristina Castro-Lucas e Gustavo Guimaraes
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“Dia 25 de novembro é o Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher. Em 2018, antes da covid-19, a Organização das Nações Unidas (ONU) já considerava os casos de violência como pandemia mundial. Cotidianamente, a violência contra mulheres e meninas está em toda parte e, para muitas pessoas, incluindo especialistas nas áreas correlatas ao temas, o foco em uma cura para esta doença social é urgente.Parece incrível, mas o nível educacional, classe social, raça, e ter ou não uma deficiência, não deixa uma mulher mais ou menos vulnerável. Até o final da leitura deste artigo, ao menos uma mulher terá sido assediada moralmente ou terá sofrido violência doméstica. Além disso, uma menina terá sido abusada sexualmente por alguém que ela conhece. Essa é uma realidade que incômoda e mostra o quanto é preciso investir em soluções para combater esse tipo de violência propiciando uma sociedade mais inclusiva e sustentável.

Será que a combinação de tecnologia e dados, que tem gerado avanços em tantos campos, não poderia ser útil também nesse caso?

Há um problema nos dados atuais

Sim, a tecnologia e os dados podem ajudar – e muito. Podem vetores de transformação positiva. Assim, ante a impossibilidade humana em acolher a quantidade assombrosa de mulheres e meninas em situação de violência no mundo, está nascendo o Projeto Relatus, que trabalha com tecnologias de ponta.

O Instituto Glória e a Microsoft resolveram somar forças para mudar o cenário da violência de gênero. As equipes que se conectaram para trabalhar nesse projeto, alinhadas aos valores essenciais das duas organizações sobre empoderamento das pessoas para “alcançarem mais”, acreditam que a tecnologia, canalizada para a humanização, atinge sua forma maior de impacto – indo muito além da tão comentada transformação digital.

Existe um problema com os dados sobre violência de gênero no Brasil. As principais fontes oficiais desses dados são os boletins de ocorrência e os prontuários médicos. Ambos são preenchidos por terceiros e, portanto, interpretados por pessoas que não vivenciaram a violência. Uma rápida leitura mostra que esses registros usam termos que a vítima não disse e, sim, que traduzem, cada qual em seu dialeto, a violência que ocorreu.

Então, era preciso fazer uma inovação em dados para evitar distorções e lidar melhor com a questão, e é isso que o Projeto Relatus fará: ele dará voz às vítimas e, assim, permitirá compreender o padrão de comportamento tanto delas como dos agressores.

Um novo mapa da violência de gênero

De maneira transparente, ética, com responsabilidade, respeitando a privacidade e atendendo às necessidades do espectro de diversidade que esse mundo comporta, o Projeto Relatus pretende assimilar diretamente os testemunhos de mulheres e meninas que já sofreram ou podem vir a sofrer violência. A Microsoft aporta no projeto a expertise técnica de engenharia de software e ciência de dados, trabalhando em conjunto com desenvolvedores do Instituto Glória e comitês de ética para discussão das arquiteturas propostas, cenários de uso e gestão dos dados.

Como ele vai funcionar?

Em primeiro lugar, qualquer pessoa poderá contar sua história, relatar a violência que viveu, como quem manda uma mensagem de áudio para alguém em aplicativos de mensagens instantâneas. Com a garantia do anonimato. Sem intermediários nem interpretações, o Relatus construirá o primeiro glossário da violência de gênero no Brasil. Na verdade, o primeiro no mundo.

Todas as palavras serão transcritas e alimentarão um banco de dados de termos e expressões da violência. Algoritmos de mineração textual farão o mapeamento semântico. Dados como faixa etária e localização, cedidos espontaneamente, serão usados na construção de métricas associadas aos tipos de violência e características das ocorrências.

Paralelamente, o Relatus também testará pela primeira vez um detector de discurso de ódio. Tanto a base de dados quanto o detector vão migrar para projetos de código aberto, de modo a contar com a ajuda de mais especialistas para a compreensão do fenômeno e para a expansão das funcionalidades. As métricas estarão à disposição dos agentes públicos para que criem – ou melhorem – políticas públicas, preventivas inclusive. Um novo mapa de testemunhos de violência de gênero, feito agora pelas vítimas com o apoio da inteligência artificial, permitirá um ganho de de assertividade e eficiência nessas políticas.Microsoft e Instituto Glória acreditam que, em última instância, esse projeto ajudará a redefinir o que é “dado” dentro do contexto da violência de gênero e que, no futuro, novos projetos poderão fornecer visões ainda mais elaboradas sobre o tema.

O PROJETO RELATUS ENFATIZA A NECESSIDADE de as organizações atuarem em conjunto, unindo forças, pois ninguém nesse mundo é capaz de solucionar problemas dessa complexidade de maneira isolada. Além da parceria entre o Instituto Glória e a Microsoft, outras organizações estão convidadas a somar esforços na construção dessa jornada. Teremos muito mais chances de vitória na medida em que estendermos a possibilidade de novos desenvolvimentos e criação de novas soluções tendo a tecnologia como uma ferramenta para fazer o bem.

Agradecimento especial na realização do Projeto Relatus para o time da Microsoft: Kathy Lee, Facundo Santiago, Fernanda Lasmar, Hao Luo, Mario Garcia, Sarah Aly, Vianey Araujo, Chew-Yean e Yame David Makogon; bem como para o time do Instituto Glória: Gustavo Guimarães, Bruna Azambuja, Carolina Brandão, Erick Giffoni, Murilo Simionato, Sara Lima e Cristina Castro-Lucas.

Este artigo compõe uma série de publicações divulgadas no site/app e nas redes sociais da MIT Sloan Review Brasil ao longo deste mês, até dezembro, em celebração ao segundo mês dedicado às mulheres além de março, que engloba o Dia Internacional do Empreendedorismo Feminino (19 de novembro) e o Dia Internacional pela Eliminação da Violência contra a Mulher (25 de novembro).

O primeiro artigo da série destacou o trabalho de cinco empreendedoras brasileiras de destaque no setor de tecnologia. Já o segundo artigo detalhou uma inciativa de empreeendedorismo feminino do Norte do Brasil em apoio às mulheres vítimas de acidente de escalpelamento“”

Alessandra Del Debbio, Alessandro Jannuzzi, Cristina Castro-Lucas e Gustavo Guimaraes
Alessandra Del Debbio é vice-presidente jurídica e de assuntos corporativos da Microsoft Brasil. Alessandro Loesch Jannuzzi é director of digital and application innovation para a América Latina da Microsoft. Cristina Castro-Lucas é fundadora e CEO do Instituto Glória. Gustavo Guimarães é diretor de tecnologia do Instituto Glória

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