Um relato direto de Baku, Azerbaijão, sobre as habilidades para liderar e moldar o futuro com base em valores humanos, transparência e confiança
A 29ª Conferência das Nações Unidas sobre Mudanças Climáticas (COP29) tem sido mais do que um encontro de formuladores de políticas e cientistas climáticos. É um chamado à ação, um convite para que líderes de todos os setores adotem uma mentalidade de adaptabilidade, resiliência e colaboração em um mundo cada vez menos linear.
Nesse contexto, liderar não é apenas gerenciar crises, mas também antecipar e moldar o futuro com base em valores humanos, transparência e confiança. O impacto do clima em rápida transformação e com efeitos em cascata exige que líderes transcendam os modelos tradicionais de tomada de decisão, reconhecendo a interconexão entre indivíduos, comunidades e sistemas globais.
Para que essa liderança seja eficaz, é essencial que as decisões estejam centradas nas pessoas e em suas necessidades e experiências. As discussões da COP29 sobre adaptação e resiliência ecoam a importância de soluções que se conectem diretamente com as vivências humanas. Enfrentar desafios como rupturas econômicas, insegurança alimentar e perda da biodiversidade demanda abordagens inclusivas, que fortaleçam as comunidades e empoderem os indivíduos para agir de forma colaborativa e sustentável.
Minha crença no poder transformador de uma governança humanizada está profundamente alinhada aos princípios debatidos na COP29. A liderança não pode mais se limitar a correções imediatas; deve criar espaços colaborativos, onde vozes diversas – especialmente aquelas historicamente excluídas – moldem o futuro. Isso exige um movimento deliberado em direção a processos anti-briefing, que rejeitam as estruturas rígidas e diretrizes prescritivas em favor de consentimento, propósito compartilhado e exploração aberta.
Na COP29, o Resilience Hub – espaço colaborativo que conecta diversos atores para promover soluções inclusivas e práticas de adaptação e resiliência às mudanças climáticas – estruturou sua abordagem em torno de seis desafios, que convergem para planos de ação.
1. Disrupção Econômica e Lacunas de Financiamento
O descompasso entre as necessidades de adaptação às mudanças climáticas e os recursos disponíveis ressalta a urgência de uma visão estratégica. Cabe aos líderes impulsionar sistemas financeiros mais equitativos, promovendo parcerias público-privadas que otimizem recursos e fortaleçam a confiança na gestão e na alocação desses fundos.
2. Inseguranças alimentar e hídrica
Garantir o acesso a esses recursos essenciais requer soluções inovadoras que respeitem os contextos locais e integrem o conhecimento ecológico tradicional. A construção da resiliência nesse cenário exige um pensamento sistêmico que conecte inovação agrícola, gestão hídrica eficiente e engajamento comunitário ativo.
3. Ação positiva para a natureza
A conexão intrínseca entre resiliência climática e biodiversidade evidencia que a prosperidade humana está ligada ao equilíbrio dos ecossistemas. Líderes devem priorizar soluções baseadas na natureza, equilibrando demandas econômicas com sustentabilidade ambiental e reafirmando seu compromisso com responsabilidades ecológicas compartilhadas.
4. Resiliência urbana
As cidades são um reflexo em microescala dos desafios globais. Um planejamento urbano inclusivo, que integre comunidades marginalizadas, priorize infraestrutura sustentável e crie espaços seguros e adaptáveis exemplifica uma governança verdadeiramente centrada nas pessoas.
5. Eventos climáticos extremos e recuperação de desastres
Preparação é uma necessidade, não uma escolha. Líderes precisam investir em sistemas de alerta precoce, focar na redução de riscos de desastres e adotar a filosofia de “reconstruir melhor”, criando estruturas mais resilientes e preparadas para enfrentar eventos inesperados ou de grande impacto que podem ocorrer no futuro.
6. Conhecimentos culturais e originários
Incorporar as vozes e práticas indígenas oferece uma oportunidade valiosa de fundamentar estratégias em saberes tradicionais. Respeitar as nuances culturais é essencial para construir sistemas resilientes, profundamente enraizados na equidade e no respeito mútuo.
Os desafios das mudanças climáticas refletem as complexidades mais amplas de um mundo que, muitas vezes, desafia soluções lineares e exige habilidades fundamentais.
É o caso da adaptabilidade, uma habilidade profundamente relacional e necessária para ajustar estratégias e respostas de forma flexível. Liderar em tempos de incerteza significa ser capaz de aprender e se adaptar rapidamente, promovendo uma cultura de inovação e diálogo com diversas perspectivas para encontrar soluções eficazes.
Mas fato é que resiliência não se constrói apenas com respostas rápidas, mas também com uma base sólida de transparência e governança. A confiança é fundamental em qualquer processo de adaptação, e, sem ela, a colaboração se desfaz. Para fortalecer a resiliência, os líderes devem se comprometer com a prestação de contas, alinhando suas ações com as promessas feitas aos stakeholders.
Já a transparência e a governança são os alicerces da confiança. Líderes devem se comprometer com a prestação de contas, garantindo que suas ações ressoem com as promessas feitas aos seus stakeholders.
Por fim, a colaboração se destaca como uma habilidade crucial para catalisar a resiliência. Em um mundo interconectado, as soluções para os desafios climáticos não podem ser alcançadas isoladamente. Líderes do futuro devem ser capazes de promover parcerias que transcendem setores, fronteiras e realidades. Seja entre entidades públicas e privadas, ciência e prática, ou entre as esferas globais e locais, a colaboração é essencial para desenvolver soluções coletivas que realmente façam a diferença.
A operacionalização do Fundo de Perdas e Danos na COP29 exemplifica como a colaboração pode gerar resultados concretos. Ao unir recursos e focar nas comunidades mais impactadas, o fundo demonstra o poder de ações conjuntas para enfrentar crises climáticas complexas.
Liderar nesta era é mais do que adaptar-se ao presente; é moldar um futuro que honra o potencial compartilhado da humanidade. Isso exige coragem para questionar paradigmas ultrapassados, humildade para aprender com os outros e determinação para agir com decisão.
Em suma, estamos falando da essência da liderança: dar significado em um mundo que frequentemente parece incompreensível; cultivar conexão diante da divisão; e abraçar a transformação como um empreendimento tanto individual quanto coletivo. Ao fazer isso, cumprimos nosso contrato social mais profundo não só com aqueles a quem lideramos, mas também com as gerações que estão por vir.
A COP29 nos oferece uma lição poderosa: os problemas globais não podem ser resolvidos isoladamente. A resiliência necessária para enfrentar um planeta em transformação exige colaboração genuína – entre pessoas, organizações e nações. Requer também a capacidade de imaginar e construir um futuro que, ao mesmo tempo, atenda às necessidades do presente e prepare o caminho para gerações vindouras.
Não por acaso, liderar virou um ato de profundo altruísmo: não se trata apenas de tomar decisões estratégicas, mas de abraçar a responsabilidade coletiva de moldar um mundo que reflita os valores de equidade, inclusão e sustentabilidade.
Liderar com propósito é também reconhecer que cada decisão – seja em uma pequena equipe ou em uma conferência global – carrega a oportunidade de criar impacto e se comprometer a:
Ao abraçar essa visão de liderança, criamos não apenas organizações mais fortes, mas sociedades mais justas e resilientes. O legado da COP29 não está apenas em suas discussões, mas na inspiração para que líderes assumam o papel de agentes de transformação, capazes de transformar incertezas em oportunidades, crises em inovações e divergências em consensos.
O futuro não será construído por lideranças que busquem apenas preservar o status quo, mas por aquelas que se atrevem a sonhar – e a agir – em direção a um mundo onde organizações e indivíduos prosperem juntos. É nesse equilíbrio entre coragem e compaixão, estratégia e propósito que reside a verdadeira força da liderança resiliente e altruísta.
O convite que a COP29 nos faz é claro: desafiar o que conhecemos, acreditar no potencial humano e trabalhar incansavelmente por um futuro onde todas as vozes sejam ouvidas e todos os esforços sejam direcionados ao bem comum. A pergunta que permanece não é se podemos fazer isso, mas quando assumiremos a responsabilidade coletiva de liderar com propósito. A resposta, sem dúvida, começa agora.