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Fundamentos 7 min de leitura

Tech-driven strategy: por que a tecnologia deixou de ser suporte e virou a própria estratégia

Rafael Martins
10 de abril de 2025
Tech-driven strategy: por que a tecnologia deixou de ser suporte e virou a própria estratégia
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De tempos em tempos, gosto de relembrar a clássica frase de Bill Gates, de 25 anos atrás, que dizia: “No futuro existirão dois tipos de empresas, as que estão na internet e as que estão fora dos negócios.”

Já faz um tempo que, inspirado nessa citação, digo que “no futuro existirão dois tipos de empresas: as que usam IA — e as que estão fora dos negócios”.

Frequento eventos internacionais há pelo menos seis anos. Vejo muitas palestras, circulo pelos estandes e fico sempre “caçando” o que é líquido e o que é só espuma no chope dos negócios, por assim dizer. Tive a oportunidade de ver grandes líderes apresentarem planos ambiciosos — novos produtos, modelos de negócio e serviços que prometem redesenhar setores inteiros. Mas com o tempo, aprendi que o mais revelador não é o que está no palco — e sim o que está sendo transformado, silenciosamente, nas estruturas das empresas.

Já participei de muitos projetos de tecnologia e a grande maioria só traz resultados importantes quando responde a um tripé: fazer a empresa trabalhar melhor, mais rápido e ganhar mais dinheiro. Se, de alguma forma, a tecnologia não contribui com isso, pode ser apenas tecnologia pela tecnologia. Ser tech-driven precisa ter esse propósito.

A ideia de que “toda empresa é uma empresa de tecnologia” já não choca mais. Ela virou consenso. Mas o que vem depois disso? Essa é a pergunta que, cada vez mais, precisa ser respondida pela liderança das organizações.

Segundo o estudo Accenture Technology Vision 2024, 92% dos executivos afirmam que a tecnologia molda as decisões estratégicas mais do que qualquer outro fator. Mas o dado só é potente quando o traduzimos: o que exatamente está sendo moldado? E, mais importante, o que ainda está resistente à mudança?

Essa virada de chave foi tema recorrente no Web Summit Lisboa 2024, onde líderes como Roland Busch (Siemens) e Meredith Whittaker (Signal Foundation) debateram a transição de empresas industriais e instituições tradicionais para modelos radicalmente baseados em software, dados e inteligência algorítmica. No SxSW 2025, em Austin, o tom se intensificou: painéis com executivos da OpenAI, Moderna e Nubank deixaram claro que a nova vantagem competitiva será definida não por quem adota tecnologia — mas por quem a integra na lógica de tomada de decisão estratégica.

Isso é default em empresas nativas digitais, mas vale conhecer também a experiência de outras organizações. A cooperativa agrícola RootWave, no Reino Unido, reinventou seu modelo ao usar pulsos elétricos guiados por IA para controle de pragas, substituindo agrotóxicos e abrindo caminho para novas receitas baseadas em dados ambientais. No Brasil, a Embraer passou a operar com gêmeos digitais e IA preditiva para monitorar performance de aeronaves em tempo real, reduzindo custos e antecipando falhas. Até mesmo bibliotecas públicas escandinavas estão testando algoritmos para curadoria dinâmica de acervos, alinhando cultura e tecnologia num mesmo ciclo de feedback.

A cooperativa agrícola RootWave, no Reino Unido, reinventou seu modelo ao usar pulsos elétricos guiados por IA para controle de pragas, substituindo agrotóxicos e abrindo caminho para novas receitas baseadas em dados ambientais



Mas nem todos acompanham. Há setores que resistem — e pagam por isso. O varejo de moda tradicional, por exemplo, ainda opera com calendários sazonais, estoques centralizados e campanhas de marketing que dependem de grandes apostas. Enquanto isso, players como Shein e Temu usam algoritmos para lançar centenas de novos produtos por dia, testando aceitação em tempo real, ajustando preços dinamicamente e produzindo apenas o que vende.

Essa assimetria não é apenas operacional — esbarra na esfera da estratégia. Marcas tradicionais, mesmo após adotarem e-commerce e canais digitais, muitas vezes mantêm lógicas internas analógicas, com pouca agilidade, pouca integração de dados e estruturas decisórias lentas. Elas implementam tecnologia, mas não adotam uma mentalidade tech-driven. E essa diferença, que já foi sutil, agora está escancarada nos números: share de mercado, margem e relevância cultural. A pergunta que fica para essas empresas não é se devem adotar tecnologia, mas se estão dispostas a redesenhar seus modelos de negócio com base nas novas regras do jogo.

Liderar, hoje, é também aprender a interpretar tecnologias emergentes antes que elas se tornem padrão. Isso exige desapego de modelos mentais antigos — como a crença de que inovação só vem de grandes investimentos, de que planejamento deve ser feito com base em previsibilidade ou de que mudanças profundas devem ocorrer apenas de cima para baixo. Esses modelos, que funcionaram por décadas, não dão mais conta da velocidade e da complexidade atuais. Persistir neles significa correr o risco de tomar decisões lentas demais, com base em premissas ultrapassadas.

A mudança, portanto, não é apenas de infraestrutura. É de mentalidade. Estratégia tech-driven não significa ter um novo CRM ou um chatbot no atendimento. Significa fazer perguntas diferentes. Significa reorganizar times, reavaliar métricas, colocar o CTO mais perto do CEO. Significa aceitar que ciclos de planejamento anual talvez já não sirvam para mercados que mudam a cada trimestre.

Exige também humildade digital: a disposição de aprender com especialistas mais jovens, com startups menores e com experimentos que não trazem respostas imediatas. E exige coragem para assumir que nem sempre o que funcionou nos últimos 20 anos vai funcionar nos próximos dois.

Não basta reconhecer que a tecnologia é essencial. É preciso garantir que ela esteja no cerne das decisões — inclusive nas que envolvem cultura, pessoas, ética e futuro. Essa não é apenas uma virada digital. É uma virada de lógica empresarial. As empresas que entenderem que sua estratégia agora é moldada por tecnologia — e não apenas viabilizada por ela — estarão mais preparadas para navegar a complexidade dos próximos anos.

Então, parafraseando, mais uma vez, a clássica fala de Bill Gates, atualizo minha interpretação: “No futuro existirão dois tipos de empresas: as que têm uma estratégia de tech-driven e as que estão fora dos negócios.”

Rafael Martins
Rafael é CEO e confundador do Share, professor convidado do MBA de Negócios do Mackenzie e da graduação em Comunicação e Letras da Universidade de Coimbra, em Portugal. Eleito por quatro anos consecutivos como um dos Top 100 profissionais digitais do Brasil pelo ranking Cloudez.

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