Conheça as propostas para adotar a ambidestria na organização e saiba quais são as diferenças entre elas
O agro é pop, tech e relevante: estima-se que a participação do agronegócio no PIB (Produto Interno Bruto) brasileiro fique perto de 21,5% em 2024. Em 2023, o setor foi responsável por 49% da nossa pauta exportadora.
Nos últimos anos, ao conviver com projetos de inovação em empresas do agronegócio brasileiro, conheci técnicas de manejo, culturas, tecnologias digitais e gente que enfrenta condições incertas de clima, câmbio e preço de commodities. Tudo isso para fazer mais com menos – hoje e no futuro.
Passei a admirar os produtores rurais brasileiros da mesma forma que admirava as empresas de tecnologia. Esses produtores são empreendedores que praticam continuamente a noção de ambidestria. Fazem a colheita enquanto plantam a próxima safra. Em determinados casos, plantar e colher são atividades sequenciais, enquanto em outros se entrelaçam em ciclos simultâneos de culturas e talhões.
Ainda existe uma compreensão superficial sobre como operacionalizar a ambidestria organizacional. É necessário saber quais são as alternativas para fazer acontecer.
A demanda por ambidestria não se restringe aos produtores rurais. Em tempos de profundas transformações, as organizações devem não só colher o presente, mas também plantar o futuro. No entanto, ainda existe uma compreensão superficial sobre como operacionalizar a ambidestria organizacional. É necessário saber quais são as alternativas para fazer acontecer.
Não existe uma forma única de organizar a empresa para exploitation e exploration – respectivamente extração e exploração, modelos de adaptação organizacional elaborados pelo professor de Stanford James March em 1991.
Em um artigo anterior, apresentei, a partir dos casos de Alphabet e Ambev, o modelo de ambidestria estrutural. Agora, neste artigo, quero apresentar outras duas formas de fazer a ambidestria funcionar, além de estabelecer uma comparação entre as três alternativas a partir de exemplos reais.
Os modelos para praticar a ambidestria evoluíram ao longo dos anos com as pesquisas científicas sobre o tema. São eles:
Em 1985, o estudo dos pesquisadores Michael Tushman e Elaine Romanelli apresentou uma abordagem que divide momentos de exploração e momentos de extração em função do ciclo de vida da organização e do setor em que atua.
A ambidestria sequencial permite compatibilizar o exploration e o exploitation por meio da separação temporal, ao definir um alinhamento e um arranjo organizacional para cada momento.
Assessorei uma empresa brasileira do setor de óleo e gás que alternou ao longo dos últimos dez anos entre o enfoque de “vamos criar novos negócios” para “back to basics” em função da mudança de cenário de mercado.
A ambidestria sequencial se baseia na noção de equilíbrio pontuado, em que, depois de períodos de mudança radical, as empresas devem iniciar mudanças incrementais para extrair o máximo do novo cenário.
O desafio da ambidestria sequencial consiste em fazer a organização continuamente mudar entre arranjos organizacionais tão distintos.
Em 1996, Tushman e Charles O’Reilly detalharam o conceito de organizações ambidestras, diferenciaram os requisitos para extrair e explorar e prescreveram a proposta dominante.
Os autores descobriram que, em função das diferentes estratégias, estruturas, processos e culturas necessárias para explorar e extrair, as empresas deveriam adotar um modelo de separação estrutural no qual, simultaneamente, extraem do hoje e exploram o amanhã por meio de duas estruturas totalmente separadas.
A Oxygea, fundo de investimento corporativo da Braskem, ilustra com clareza o modelo de ambidestria estrutural. A empresa-mãe constituiu um veículo próprio, com arranjo organizacional específico, para explorar novas oportunidades por meio de venture building e corporate venture capital (CVC).
O CEO da Oxygea, Artur Faria, disse em uma entrevista realizada em 2024: “temos uma grande independência da empresa-mãe, o que nos ajuda a entrar onde precisamos no ecossistema”.
Para evitar o isolamento – comum em estruturas dedicadas a novos negócios, como labs de inovação, aceleradoras corporativas e fundos de CVC –, a separação precisa de um conjunto de mecanismos de integração entre as estruturas em nível de alta gestão, que permita que o existente alavanque (porém não contamine) o novo.
Em 2004, Cristina Gibson e Julian Birkinshaw desenvolveram uma nova proposta, em que se pode explorar e extrair, simultaneamente, sem a separação de estruturas específicas. Esse método sugere que, com a criação de um contexto adequado, os funcionários podem, autonomamente, fazer escolhas e alocar seu tempo da melhor maneira entre iniciativas de exploit e explore, sem restrição de momento ou estrutura.
O Google estabeleceu uma prática de gestão em que os engenheiros têm 20% de tempo livre para projetos exploratórios alinhados com a estratégia da empresa, sem que tenham que receber aprovação prévia. O Gmail é um dos projetos que emergiram dessa abordagem.
Já a Ambev desenvolveu o Lahbs Box, programa que instrumentaliza os times internos para o desenvolvimento de novos negócios. E o iFood pratica o modelo de “jet skis” para incubar, matar ou escalar novos negócios.
A ambidestria contextual considera que um mesmo contexto organizacional consegue ter a flexibilidade para se ajustar a diferentes necessidades de exploration e exploitation.
Os três modelos apresentados têm lógica, tempo de ação, gestão de incompatibilidade, lócus de decisão, habilidades de funcionários e desafios específicos.
O quadro abaixo ilustra de modo bastante concreto as diferenças de cada alternativas.
Plantar e colher são atividades relacionadas ao nosso desenvolvimento desde que a humanidade desenvolveu a agricultura há 12 mil anos, durante o período neolítico.
A ambidestria organizacional é a capacidade das empresas de administrar, de maneira dinâmica, a ênfase em extrair eficiência do negócio atual a partir de competências existentes e explorar novos negócios por meio do desenvolvimento de novas capacidades.
Compreender as abordagens disponíveis, funcionamento e desafios é o primeiro passo para desenvolver essa capacidade. Essa é uma tarefa da liderança, que deve saber quando escolher o modelo mais adequado para sua realidade e criar o arranjo organizacional necessário para fazer acontecer.