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Como competir em plataformas

As empresas podem contar com quatro estratégias para ser mais bem-sucedidas nesses ecossistemas

Donato Cutolo, Andrew Hargadon e Martin Kenney
30 de julho de 2024
Como competir em plataformas
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Empresas baseadas em plataformas online estão hoje entre as mais valorizadas do mundo e, assim, vêm reescrevendo as regras de estratégia de negócios. Na última década, não só reorganizaram mercados e setores de atividade, como redefiniram a dinâmica da concorrência e da criação de valor. Criaram marketplaces que geraram muitas startups. E, à medida que cresceram e prosperaram, pressionaram outras empresas a aderir a essa economia para crescer e até para sobreviver. Isso é sabido.

Também se sabe que mais e mais empresas se dedicam a entender as vantagens das plataformas em relação às estruturas tradicionais dos respectivos setores e buscam replicar seu sucesso. A maioria das empresas não terá uma plataforma própria, mas, certamente, cada vez mais, competirá dentro de plataformas e dependerá de plataformas. Sendo assim, todas as empresas precisam estar cientes do poder, da dinâmica e dos riscos intrínsecos aos mercados dominados por plataformas. E devem desenvolver estratégias que lhes possibilitem tirar proveito dos recursos que as plataformas oferecem em vez de estabelecer uma relação de mera dependência. Por quê?

Uma história contém a resposta. Em janeiro de 2019, depois de fechar um acordo com a Apple para ampliar o portfólio de produtos da marca vendidos em sua plataforma, a Amazon enviou uma carta às pequenas empresas que comercializavam itens recondicionados Apple ali. Dizia o seguinte: “Você está recebendo esta mensagem porque vende produtos Apple ou Beats. Seus anúncios serão removidos em breve da loja da Amazon nos EUA”. De uma hora para outra, o acordo entre Amazon e Apple significou o fim dos negócios, e do sustento, de muitos revendedores.

Esse é apenas um exemplo de como uma plataforma todo-poderosa pode afetar pequenas empresas. E não só as pequenas. Pelo menos um CEO de grande empresa, a Expedia, discutiu abertamente com o Google sobre como ele favorece a própria plataforma de viagens nos resultados de busca [Google Travel, Google Flights, Google Hotels] em detrimento de outros players do setor. O líder da Expedia chegou a declarar que a internet estava “cheia de cadáveres de empresas fechadas pelo Google”.

Esse é um ambiente competitivo novo e difícil. E quase todas as empresas vão enfrentá-lo, mais dia, menos dia, conforme a economia de plataforma amadurece. Aí entram as novas estratégias competitivas.

Novas bases para o sucesso

Primeiramente, é preciso entender como uma plataforma obtém sucesso. Isso depende de ela oferecer uma vasta base de clientes potenciais a vendedores, e também de ter uma ampla gama de produtos facilmente encontráveis pelos usuários. Para vendedores e anunciantes, existe custo de entrada, mas é baixo. Para consumidores, não há custos. O objetivo é conquistar a maior participação no mercado em relação a outras plataformas – uma estratégia do tipo “o vencedor leva tudo”, que cria quase um monopólio.

Nesse contexto, o êxito de uma plataforma se dá quando efetivamente conquista um mercado e pode cobrar por todas as transações que passam por ela. Apple e Google, por exemplo, ficam com 30% das receitas obtidas nas lojas de seus aplicativos. A Etsy fica com 20 centavos de dólar por item oferecido, mais 5% do valor da transação (incluindo o frete) e uma taxa pelo uso de seu sistema de pagamento (os vendedores são obrigados a usá-lo). O YouTube toma 45% da receita de publicidade gerada pelos criadores de conteúdo. Como argumentou a fabricante de jogos Epic Systems numa recente petição inicial que fez contra Apple e Google, os custos são inegociáveis independentemente do fluxo de receita gerado. Aparentemente, grandes empresas como o Spotify e a Microsoft também fazem coro às críticas sobre as rigorosas regras impostas pelos proprietários de lojas de aplicativos.

E a controvérsia sobre as cobranças é só a ponta do iceberg. As plataformas têm poderes quase divinos. Elas criam as regras, são juiz e júri. Empenham-se em buscar contínua e unilateralmente crescer e experimentar novas formas de atuação que beneficiem só a elas mesmas. Sua motivação é igual à dos negócios tradicionais: aumentar as receitas e os lucros e ampliar seu poder de mercado.

Às empresas que fazem negócios por meio delas só resta aceitar as regras, adaptar-se ou sair. O poder de uma plataforma restringe a liberdade que as empresas têm de conceber e buscar estratégias.

Como a diferenciação é anulada

Desde a década de 1980, nosso entendimento de estratégia é dominado pela definição de Michael Porter sobre as fontes de vantagem competitiva. Para Porter, a boa estratégia competitiva cria um valor único para um determinado conjunto de clientes – a chamada “diferenciação”. Essa exclusividade é fruto da capacidade das empresas de controlar três principais fontes de vantagem competitiva: (1) uma proposta de valor diferenciada, que é criada para (2) um determinado perfil de clientes e entregue por meio de (3) uma configuração de atividades distinta e difícil de ser replicada pelos concorrentes. Quanto mais maneiras uma empresa tiver para diferenciar recursos, design, produção, distribuição, marketing, vendas e serviços, maior sua capacidade de conquistar e manter uma posição estratégica.

Os donos de plataformas não apenas limitam a liberdade das empresas em relação a cada uma dessas fontes de vantagem competitiva, como também defendem seus próprios interesses. O mesmo recurso que possibilita às empresas encontrar clientes na Amazon, por exemplo, permite que a plataforma identifique oportunidades de crescimento para ela própria e aja rapidamente nesse sentido. Segundo relatório da Coresight Research e DataWeave, a Amazon mais do que triplicou o número de produtos com marca própria entre 2018 e 2020, chegando a mais de 23 mil ofertas. Ou seja, a Amazon pode anular tradicionais ações de diferenciação estratégica simplesmente identificando e replicando características, preços, posicionamento de mercado ou qualquer outro recurso para tornar seus próprios itens mais atraentes e competitivos. (Ela e outras plataformas.) Além disso, os mesmos algoritmos que conectam compradores e vendedores online podem ser manipulados pelas donas das plataformas para que vendedores percam posições nos resultados de buscas e rankings de vendas.

Reduzindo a dependência

Dadas as crescentes evidências de que as plataformas tendem a usar seu enorme poder em benefício próprio, as empresas devem ter clara compreensão das implicações de operar em uma plataforma, a fim de evitar que se tornem meras subalternas. Para competir nesse tipo de mercado, elas precisam, antes de tudo, estar cientes de como as plataformas limitam seu controle sobre as três principais fontes de vantagem competitiva.

As plataformas limitam a criação de uma proposta de valor única. Desenvolver a proposta de valor de uma empresa e oferecê-la a um segmento de clientes-alvo é fundamental para a estratégia competitiva. Mas, para muitos negócios que dependem de plataformas, os atributos e a exposição diferenciada de seus produtos online (como termos de pesquisa, descrições, imagens e avaliações) são ditados pela plataforma, cujo objetivo é permitir aos clientes compará-los facilmente com os concorrentes. E isso só é possível se os produtos usarem os mesmos termos de pesquisa e forem anunciados de forma similar.

Além disso, as plataformas podem restringir a flexibilidade estratégica de preços. A Amazon, por exemplo, pune editores que vendem obras na plataforma Kindle por preço abaixo de US$ 2,99 ou acima de US$ 9,99, reduzindo pela metade a receita, que passa de 70% para 35% do preço de venda dos produtos. A Amazon criou essa regra visando vender mais e-books e também desencorajar outros livreiros a entrar no mercado online. A prática agrada os clientes, mas reduziu as margens dos editores.

A Amazon pode agrupar produtos de quantos fornecedores quiser. Quando isso acontece, e os consumidores veem concorrentes juntos em uma tela, os vendedores são forçados a competir em categorias e segmentos que eles não têm autonomia para escolher. A única opção é tentar diferenciar seus produtos por preço (se possível), descrições elaboradas e avaliações (em uma arquitetura determinada pela plataforma), em vez de fazer suas próprias escolhas estratégicas.

As plataformas controlam o relacionamento com o cliente. Como intermediária entre o cliente e o fornecedor, a plataforma controla o relacionamento entre eles: o vendedor sabe apenas o que a plataforma deseja que ele saiba. Na verdade, a maioria das plataformas evita o contato entre compradores e vendedores fora delas porque isso criaria um potencial para desintermediação. Em vez disso, a plataforma impõe uma fundamental assimetria de informações sobre o cliente em favor dela.

Quando alguém depende de uma plataforma, a incerteza é endêmica e se amplia diante da possibilidade constante de um bloqueio imediato, sem aviso prévio, por qualquer coisa que se faça. Se um participante desse mercado é identificado por uma suposta infração a uma regra – como a manipulação de avaliações e comentários – a punição pode ser a suspensão, a exclusão ou o veto. Mesmo quando essas decisões são revertidas, as empresas em geral já sofreram prejuízos significativos e não têm como recorrer, pois o processo de apelação é tão obscuro que um escritório de advocacia o chamou de “kafkiano”.

Empresas dependentes de plataformas não têm margem de manobra. Teóricos de estratégia afirmam que quando as empresas descobrem um ajuste estratégico lucrativo, elas mantêm sua posição por meio de uma configuração de ações que agrega valor para um perfil específico de clientes. Quanto mais liberdade uma empresa tem na concepção e na configuração de suas ações para melhorar a experiência do cliente, melhor se torna sua posição de mercado.

Competir em plataformas inclui o risco de que os concorrentes sejam capazes de imitar algumas dessas ações, incluindo descrição do produto, faixas de preço e termos de busca. Ao mesmo tempo, a plataforma pode favorecer alguns participantes em detrimento de outros, como fez a Amazon ao escolher a Apple em vez de seus revendedores.

Beneficiando-se de sua posição onipotente, a plataforma está bem-posicionada para reconhecer quando produtos ou serviços inovadores constituem uma oportunidade de negócio. A plataforma pode então aumentar a comissão cobrada do vendedor ou lançar ela mesma um produto concorrente. Nesse sentido, uma plataforma pode usar as empresas que dependem dela como cobaias para identificar segmentos promissores de que ela possa se apropriar.

Uma análise feita recentemente pelo The New York Times revelou que a loja de aplicativos da Apple promove sistematicamente suas próprias ofertas e as classifica melhor do que as dos membros do ecossistema responsáveis pelo sucesso do aplicativo. Em última análise, a competição direta com uma plataforma onisciente e toda-poderosa faz com que seja virtualmente impossível se manter na disputa ante um concorrente predatório.Abordagens tradicionais de estratégia competitiva não valem nos ecossistemas de plataforma. Então, acabam-se as estratégias para as empresas em geral?

Quatro estratégias para prosperar

Não. Para esse novo cenário competitivo, ainda existem estratégias; elas apenas mudaram. Identificamos quatro que permitem tirar proveito dos recursos que as plataformas oferecem e, ao mesmo tempo, mitigar a tendência de se tornar subserviente. As escolhas estratégicas devem variar conforme a situação e as necessidades:

1. Mudar os canais.

Multihoming – a prática de usar várias conexões para evitar a parada caso uma tenha problemas – é uma forma de alterar a dinâmica de poder, oferecendo produtos ou serviços em múltiplos canais de vendas. O objetivo é aumentar o acesso da empresa aos clientes enquanto melhora a capacidade de proteger sua proposta de valor e reduz a dependência de uma única plataforma.

Multihoming de plataformas. Oferecer bens ou serviços em várias plataformas é capaz de trazer benefícios, especialmente quando elas dão acesso a diferentes segmentos de clientes. O sucesso da Epic Games, empresa por trás do game Fortnite, mostra que o investimento inicial em múltiplas plataformas foi a chave para conquistar uma base maior de clientes. Embora tenha sido lançado em 2017 para o Xbox One e com suporte multiplataforma limitado, hoje está disponível para Android, iOS, macOS, Microsoft Windows, Nintendo e PlayStation.

Em alguns casos, operar em multihoming de plataformas é simples. Para empreendedores que vendem produtos básicos na Amazon, é fácil e barato oferecer os mesmos produtos no eBay, no Etsy ou no Walmart.com. Porém, a portabilidade de aplicativos do iOS para o Android, ou vice-versa, pode ser difícil e cara porque, nesse caso, os aplicativos precisam ser modificados.

Multihoming demanda dedicação e tempo, pois cada plataforma exige personalização. Isso também traz o risco de perder o foco durante o processo, o que talvez prejudique o desempenho.

Multihoming de canais. Até mesmo empresas dependentes de plataformas conseguem usar canais diferentes, como e-commerce próprio ou loja física. Se os canais alternativos forem bem-sucedidos, os gestores podem não apenas evitar taxas e limitações, como também aumentar sua proposta de valor com ofertas exclusivas e estabelecer relacionamentos mais fiéis com os clientes, oferecendo vantagens como melhor serviço, programas de milhagem e promoções.

As plataformas de viagens online, por exemplo, não permitem aos hotéis oferecer preços mais baixos em outros canais ou mesmo em seus próprios sites. Mas é possível os hotéis oferecerem, no próprio site ou na recepção, melhores políticas de cancelamento ou pacotes especiais que não estejam disponíveis na plataforma. Essa abordagem possibilita criar diferentes subgrupos de clientes, aumentar a fidelidade deles e enfraquecer os laços com as plataformas de viagens online.

Mas o multihoming de canais apresenta também um dilema: como extrair valor da plataforma sem canibalizar os outros canais ou minar o enorme tráfego e os negócios na plataforma?

Uma alternativa é se diferenciar clara e estrategicamente em cada canal. Por exemplo, os editores de guias de viagens colocam produtos com alta procura na plataforma de e-book Kindle, mas vendem seus livros mais lucrativos somente no canal de venda física, na esperança de atrair consumidores finais e obter maiores margens de lucro.

Outra estratégia é canalizar o multihoming para oferecer mais personalização aos clientes. A britânica Chilly’s Bottles vende garrafas de água reutilizáveis, tanto na Amazon quanto em seu site, mas apenas no site oferece aos clientes a possibilidade de ter seu nome gravado nas garrafas.

Multiplex de plataformas. Vendedores e provedores de conteúdo podem adotar as ferramentas disponíveis em diferentes plataformas para desenvolver novas propostas de valor, entrar em novos segmentos de clientes ou desenvolver novas capacidades organizacionais que não seriam possíveis numa única plataforma.

As empresas conseguem usar diferentes plataformas de publicidade para testar a relevância, a qualidade ou as palavras-chave associadas a suas ofertas. Outra possibilidade é oferecer lotes com quantidades limitadas de produtos em plataformas como Instagram ou Kickstarter para testar novos produtos no processo de busca de novos segmentos de clientes e, assim, aumentar a exposição da marca. Tanto startups quanto negócios já consolidados, como Coca-Cola, GE, Hasbro e Lego, aproveitaram o boom das plataformas de financiamento coletivo para, gastando pouco, obter feedback imediato para novos produtos ou serviços.

2. Usar a plataforma para seu marketing.

Assim como fazer transações em plataformas se tornou necessário para as empresas, também é fundamental anunciar nelas. Afinal, 47% dos consumidores começam suas pesquisas por produtos online na Amazon.

As plataformas garantem que a publicidade de uma empresa será vista pelos clientes quando eles estiverem dispostos a comprar, e fornecem informações sobre o comportamento e as preferências dos consumidores para orientar a publicidade e torná-la mais efetiva. No entanto, ainda que investir em publicidade na plataforma aumente a receita, a visão fornecida por elas não é granular. A empresa que compra a publicidade tem acesso apenas às informações que a plataforma escolhe compartilhar.

O desafio do negócio é desenvolver estratégias de marketing que tirem proveito da plataforma para fortalecer sua própria marca sem aumentar a dependência. Hootsuite, Marriot International e Patagônia, entre outros, são exemplos de empresas que estão usando o Instagram para promover sua cultura corporativa e seus valores tanto quanto suas ofertas (se não mais).

As plataformas servem para testar conceitos de marketing no lançamento de produtos e serviços com publicidade online, cujo custo é baixo, antes de investir quantias maiores para lançar aplicativos gratuitos em lojas de aplicativos ou fazer ações de pequeno volume. É possível usar as plataformas de forma criativa e, ao mesmo tempo, reduzir a limitação ou a dependência excessiva.

3. Entrar no jogo do algoritmo.

O objetivo pode ser aumentar a visibilidade, obter mais avaliações ou melhorar a classificação nas buscas: sempre é necessário jogar com o sistema de algoritmos da plataforma. Isso não significa desobedecer às regras, mas fazer com que funcionem em seu favor. Várias consultorias surgiram para ajudar empresas dependentes de plataformas a tirar proveito das regras e dos algoritmos para engajar clientes.

Na maioria das vezes, a linha entre o que as plataformas consideram legítimo ou ilegítimo não é clara. Na Amazon, algumas empresas contrataram pessoas para redigir resenhas elogiosas, prática proibida pelos termos e condições. Recentemente, a plataforma excluiu cerca de 20 mil comentários supostamente falsos de seu site no Reino Unido, após uma matéria do jornal Financial Times sobre o assunto. Mesmo assim, pessoas e empresas desafiam constantemente as regras e, às vezes, conseguem desenvolver táticas novas e eficazes.

Algumas agências especializadas planejam ações com distribuição de “brindes” para que empresas dependentes de plataformas aumentem seus seguidores no Instagram, seja patrocinando influenciadores famosos, seja oferecendo pagamento para novos seguidores. Em 2017, a Domino’s criou uma promoção no Instagram em que oferecia às pessoas a chance de ganhar US$ 10 mil ao seguir a página e postar um comentário no perfil da empresa. A postagem teve 25.564 visualizações e mais de 4,5 mil curtidas.

A reação das plataformas a esse tipo de ação varia, caso a atividade ameace seu poder ou prejudique a experiência do usuário. A startup Rap Genius tentou enganar os algoritmos do Google lançando um programa para promover postagens em blogs de usuários que mencionassem o site da marca. O Google rebaixou manualmente o Rap Genius – este foi parar na sexta página de resultados de busca.

4. Diversificar fontes de renda.

Conquistar exposição significativa numa plataforma é capaz de gerar um enorme volume de tráfego, passível de ser usado para diversificar as fontes de receita. Essa diversificação ocorre de várias formas. A primeira é a simples variedade de produtos na plataforma. A empresa chinesa de eletrônicos Anker começou vendendo baterias de reposição para notebooks, em 2011, e depois se tornou a marca mais popular de carregadores portáteis de bateria na Amazon. Em seguida, diversificou de novo, passando a vender carregadores para celular, e hoje vende uma grande variedade de acessórios eletrônicos. Seu sucesso na construção de uma marca forte permitiu atingir um nível de reconhecimento entre os clientes que mitigou a vantagem da plataforma.

Em outros casos, a oportunidade de diversificação se dá por canais alternativos. Muitos YouTubers, após criarem suas reputações na plataforma, passam a receber pagamento para endossar produtos e aparecer em eventos, publicam livros, vendem suas próprias marcas de roupas ou maquiagem ou se engajam em outras atividades.Isso mostra que é possível desenvolver fontes de receita fora do âmbito da plataforma que, se forem suficientemente lucrativas, têm potencial de reduzir a dependência da plataforma em que nasceram.

A união faz a força – e o equilíbrio

Os governos precisam avaliar se economias em que poucas empresas detêm uma parcela cada vez maior da riqueza global são saudáveis para os negócios ou se é desejável um equilíbrio maior. Nos Estados Unidos, por exemplo, a Câmara dos Deputados e o Departamento de Justiça já se posicionaram contra empresas de tecnologia, argumentando que inibem a concorrência e a inovação em benefício próprio.

As estratégias apresentadas aqui para mitigar o poder das plataformas podem ajudar nesse equilíbrio, mas, além disso, é possível que as empresas dependentes de plataformas se unam para se defender, aumentando seu poder. Por exemplo, em 2018, 582 revendedores de livros usados de 27 países tiraram 3,7 milhões de títulos da AbeBooks, subsidiária da Amazon, depois que a plataforma proibiu as vendas de livrarias de vários países por meio dela, alegando custos altos e a crescente complexidade na operação. Depois de dois dias de protesto, a AbeBooks se desculpou e voltou atrás.

Empresas que dependem de plataformas podem também recorrer aos respectivos governos para discutir regulamentações que mitiguem o poder delas. Em 2019, uma associação de pequenos e médios varejistas indianos registrou uma ação contra a Amazon.com e a plataforma Flipkart, do Walmart, por práticas anticompetitivas. Após uma investigação do órgão responsável, Amazon e Walmart foram proibidos de vender os próprios produtos lado a lado com os de fornecedores independentes. A comissão que analisou o caso também determinou que o governo indiano tivesse acesso ao código-fonte e aos algoritmos dessas plataformas. O conselho mais importante a empresas que lutam contra as políticas das plataformas: mantenha-se engajado.

A busca por estratégias para mitigar o poder das plataformas deve ser um esforço contínuo, pois esse tipo de empresa está sempre empenhado em anular as estratégias dos integrantes de seu ecossistema. Um bom exemplo desse empenho foi a aquisição do FameBit pelo YouTube. Como o FameBit permitia que os criadores de conteúdo se conectassem diretamente com as marcas para desenvolver vídeos, prescindindo do YouTube, este não gostou e acabou com a brincadeira.

Toda empresa que dependa de uma plataforma, hoje ou amanhã, deve conhecer os perigos que corre e suas opções. Do outro lado da tela, cientistas da computação e estrategistas da plataforma estão acessando e analisando uma quantidade de dados inalcançável para mortais e avaliando algoritmos ainda mais sofisticados para aumentar receita. Mas, como mostramos, participar de plataforma vale a pena, com os devidos cuidados, porque o valor gerado nesse mercado é mais que suficiente para todos.”

Donato Cutolo, Andrew Hargadon e Martin Kenney
Donato Cutolo é pesquisador de pós-doutorado na Universitá di Bologna, Itália. Andrew Hargadon é professor titular do curso de empreendedorismo da pós-graduação em administração da University of California em Davis. Martin Kenney é professor de desenvolvimento regional e comunitário na University of California em Davis.

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