Chief data officers precisam estar preparados com as ferramentas e suporte certos para que possam efetivar a visão da empresa sobre o uso de dados
Nos seus esforços para incorporar a cultura de uso de dados, as empresas listadas na Fortune 1000 enfrentam um desafio em comum, o de encontrar a liderança apropriada para superarem os obstáculos culturais e do negócio. Para a maioria dos segmentos, as questões culturais se manifestam de maneiras variadas – resistência à mudança, processos ultrapassados, falta de uma coordenação e comunicação claras de imperativos e valores do negócio, alinhamento organizacional insuficiente e uma liderança incerta e pouco comprometida com as iniciativas relacionadas a dados.
Essas questões todas apontam para as lacunas entre ambição e execução, especialmente quando as organizações se voltam para as transformações digitais. À medida que as empresas lutam para aprender a gerenciar os dados como um bem vital para seus negócios, precisam desenvolver as habilidades de liderança, conhecimento e estrutura organizacional para que isto efetivamente aconteça.
Hoje, mais do que nunca, é papel delas estabelecer uma sólida liderança para a área de dados que irá definir uma visão e entregar resultados a partir dela, e que dará sustentação à visão geral da empresa.
Na esteira da crise financeira de 2008-2009, o governo exigiu das empresas de serviços financeiros que corrigissem problemas sistêmicos resultantes de falhas na gestão e apresentação de dados, vistos como parte da causa do colapso. Em resposta, muitos bancos assumiram a dianteira na criação do chief data officer (CDO), com a missão de implantar padrões e proteções na gestão dos dados. A motivação estava em mitigar o risco e evitar falhas sistêmicas no futuro.
O crescimento do CDO como uma função ligada ao risco corporativo se deu na sequência, com a emergência do big data, a partir de 2010. Embora poucas (e ousadas) organizações tenham colocado executivos na posição de CDOs, antes disso uma nova combinação de demandas defensivas (normas, mitigação de risco) e de ataque (geração de retorno, crescimento do negócio), baseadas nas promessas do big data, resultou em um repentino e dramático aumento no número de CDOs. A porcentagem de grandes empresas com CDOs subiu de 12% em 2012 para um pico de 67,9% em 2019, de acordo com uma pesquisa anual sobre executivos da NewVantage Partners.
Hoje, o papel do CDO é padrão na maioria das empresas da Fortune 1000, mas com sérias demandas e desafios, uma vez que as empresas ainda tentam configurar a função para atingir melhores resultados. Enquanto a maior parte dos CDOs (54,6%) está voltada para iniciativas de geração de retorno (ataque), uma minoria significativa (45,4%) continua atuando na defensiva, em fatores de risco. Apenas 12,3% dos CDOs assumiram responsabilidade direta por ganhos até agora, o que sugere que a mudança para um papel menos defensivo, voltado para o retorno, ainda levará algum tempo.
Assustadoramente, menos de 30% dos executivos dizem que o papel do CDO já está estabelecido e é considerado bem-sucedido em suas organizações. Portanto, não deveria ser surpresa que essa posição tem uma das maiores taxas de turnover da C-suite, especialmente se comparado a posições mais estáveis, como CFO ou CIO. Vários bancos de grande porte estão no quarto ou quinto ocupante do cargo, outros deixaram para repensá-lo, demonstrando o problema que os CDOs enfrentam.
Os desafios relacionados ao uso de dados continuam presentes para a maior parte das empresas – apenas 37,8% declararam ter estabelecido uma organização orientada para dados e somente 26,8% disseram ter forjado uma cultura de dados.
Como não há uma tradição ou consenso sobre como se deve lidar com dados do ponto de vista de patrimônio, as organizações estão mapeando o território. As companhias estão ativamente buscando uma liderança que possa levar adiante seus planos em uma área em que continuam patinando e em que a maioria está longe da maturidade.
Entre os grupos que lidam e pensam em liderança para dados há mais tempo está o Chief Data Officer and Information Quality Program (CDOIQ), do MIT, dirigido por Richard Wang, que ocupou anteriormente o mesmo cargo no exército norte-americano. Ele foi essencial ao encabeçar o lançamento do Simpósio CDOIQ do MIT, que está em seu 15º ano.
Tive a sorte de ser o anfitrião e moderador de um painel sobre o papel do CDO nesse simpósio ao longo dos últimos anos. Em 2020, por causa da covid-19, o evento foi transmitido virtualmente para mais de mil participantes, sendo que cerca de 25% deles se identificaram como CDOs. Recebi CDOs da American Express, Bank of China, Bristol-Myers Squibb, CVS Health e Mastercard, que compartilharam suas perspectivas sobre liderança de dados e recomendações em etapas específicas que as organizações podem usar para garantir sucesso no tema:
A CDO da Mastercard, JoAnn Stonier, aconselhou que, para as empresas se tornarem orientadas para dados, a “estratégia da empresa deve acompanhar a do negócio”. Uma vez que as organizações são diferentes, elas devem se comprometer com uma estratégia que seja coerente com as situações de uso, cadeia de obtenção de dados e padrões de consumo que orientam os seus resultados específicos.
Já a CDO da Amex, Danielle Crop, colocou que “dados são como ar, estão em toda parte.” Só se extrai valor dos dados depois de estarem organizados, analisados, sintetizados e apresentados – só assim os dados se tornam relevantes no contexto da estratégia e metas da organização. O CDO do Bank of China, Richard Goldberg, concluiu que, para serem efetivos, os CDOs devem apoiar o negócio.
Dados trazem valor na medida que os benefícios estiverem claramente articulados e entendidos por toda a organização. Muitas iniciativas na área não prosperam pela complexidade na gestão do assunto e pelas falhas em comunicar esse valor de modo claro, que atravessem as divisões técnicas e de negócios. Para os líderes da área, a comunicação é fundamental: fale em termos empresariais e evite o jargão técnico.
Em nosso painel, Stonier, da Mastercard, explicou: “dados são uma representação intangível do mundo ao nosso redor. A maneira como são usados e os insights que produzem são a melhor parte.” Um CDO precisa ser multilíngue: quer dizer, capaz de falar a linguagem técnica e poder traduzi-la na linguagem comum da empresa para os demais membros da organização. “Há que se ensinar constantemente, demonstrando o valor de nosso trabalho, reforçar a mensagem e comunicar como dados são indispensáveis”, disse Goldberg.
Muitas iniciativas de dados falham porque as áreas de negócios perdem a confiança nessas informações. Fatores que podem levar a isso incluem insuficiência, imprecisão ou equívocos de interpretação ou a falta de um significado ou definições em comum. Crop, da Amex, observou que “o futuro do papel do CDO está em gerar confiança nos dados e orientar a inovação. Os CDOs precisam construir essa confiança nos dados”.
Clientes, executivos e o público precisam confiar na integridade, qualidade, precisão e transparência dos dados para tomar decisões a partir deles. Krishna Cherith, ex-CDO da Bristol-Myers Squibb, propôs uma forma desses profissionais buscarem referências ao perguntar “como criar uma cultura de cidadania digital que garanta que estamos usando os dados de forma responsável?”. Para ela, “a disciplina de dados deve ser parte do plano da empresa. É função do CDO construir e sustentar essa confiança em toda a estrutura e entre as áreas de negócios”.
Goldberg, do Bank of China, descreveu a “necessidade de criar uma carreira que permita ao negócio adotar os dados”. Isto implica na construção de habilidades para todas as funções relativas ao tema, incluindo estratégia, governança, arquitetura, análise e uso. Goldberg observou que, ao fazer isto consistentemente, uma organização passará a ver dados como ativos.
Bob Darin, CDO da CVS Health, disse que a coordenação entre todas as partes da empresa é uma das maiores demandas para o CDO e acrescentou que esse papel “implica fortemente em change management”. Organizações que trabalham em etapas para criar uma organização robusta de dados de cima para baixo levam vantagem na hora de estabelecer uma nova cultura.
As empresas não conseguem ter sucesso e sobreviver ao longo do tempo se não forem efetivas na gestão de riscos, atender aos seus clientes e encontrar novos modos de crescer e fazer seu negócio evoluir. Aquelas que aprenderam a colher dados, particularmente como parte da experiência digital, foram recompensadas com crescimento rápido, expansão da base de clientes, dominação de mercado e valor. O sucesso não é garantido. O horizonte de longo prazo da função de CDO ainda é incerto.
Em 2019, 17,5% dos respondentes de uma pesquisa sugeriram que essa posição era desnecessária e deixaria de existir com o tempo, quando as companhias olhassem para outras posições do C-level como capazes de liderar essa área. Ou ainda quando a necessidade diminuísse porque as empresas passariam a incorporar a cultura de dados. Observou-se que empresas assim, como Amazon ou Google, não definiram CDOs porque dados fazem parte de seu DNA.
O estabelecimento da função de chief data officer representa o reconhecimento de que dados são importantes para as organizações. Organizar, governar e entregar valor a partir de dados pode ser um dos fatores primários que diferenciam as entidades que aproveitam o momento das que deixam passar a oportunidade, especialmente na economia digital do presente e do futuro. Os negócios precisam garantir que o CDO tenha as ferramentas e apoio necessários para trabalhar em sua visão. Só então os negócios poderão dizer legitimamente que ganharam o direito de se intitularem data-driven.
O Fórum: Data Science é uma coprodução MIT Sloan Review Brasil e SAS.“